A importância de uma cláusula de não concorrência personalizada
Após anos de trabalho na fictícia empresa Indústrias S/A, o contrato com o Fulano de Tal é rescindido, não importando aqui a razão (rescisão indireta, pedido de demissão, dispensa motivada ou não). Mas, ao cumprir as formalidades da rescisão, surge uma questão peculiar, cada vez mais comum: a Indústrias S/A não quer que o Fulano de Tal divulgue para a concorrência algumas das informações adquiridas ao longo do contrato de emprego, por serem confidenciais e estratégicas.
Sem uma cláusula contratual de não concorrência, ou com um pacto elaborado de forma genérica, sem os cuidados que o tema exige, esse tema costuma gerar acaloradas discussões judiciais. Para evitar isso, é fundamental produzir uma cláusula bem negociada, pois na era da tecnologia é cada vez mais usual o empregado ter acesso a informações absolutamente estratégicas da empresa onde trabalha.
Enquanto a relação de emprego está ativa, o compartilhamento desse conhecimento não preocupa o empregador e tampouco é visto pelo empregado como uma vantagem competitiva, pois é sabido que concorrer com a empresa em que trabalha é falta grave passível de dispensa por justa causa (art. 482, “c”, CLT). Porém, quando o contrato de trabalho é encerrado, o agora ex-empregado passa a ser cobiçado pela concorrência pelo conhecimento que adquiriu e o empregador começa a temer pelo uso das informações.
Para ajustar essa situação, a empresa pode celebrar com o (ex-)empregado um pacto de não concorrência, que terá efeitos mesmo após a extinção do contrato de trabalho. Este pacto pode ser fixado de comum acordo pelas partes em uma cláusula de não concorrência inserida (i) no contrato de trabalho original, (ii) em um aditivo ao contrato de trabalho ou (iii) no próprio termo de rescisão contratual.
Seja qual for o momento de celebração da cláusula de não concorrência, o fato é que seus efeitos apenas ocorrerão após a rescisão do contrato, pois, como já dito, no curso do contrato de trabalho a não concorrência é expressamente proibida pela consolidação das leis do trabalho.
Se os efeitos de uma cláusula de não concorrência têm início com a rescisão do contrato de trabalho, estamos diante de uma obrigação de não fazer pós-contratual, que desencadeia distintos posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais.
Para uns, o pacto de não concorrência representa uma legítima proteção ao negócio do empregador com base no princípio da livre contratação (art. 444, CLT). Para outros, trata-se de uma afronta ao princípio constitucional do livre exercício do trabalho (art. 5º, XIII, CF).
Nossa legislação trabalhista vigente não resolve a questão, por ausência de regulamentação, mas a doutrina e a jurisprudência majoritária têm reconhecido a validade da cláusula de não concorrência. Esse aspecto, no entanto, exige atenção, uma vez que a jurisprudência, do Tribunal Superior do Trabalho inclusive, é pacífica no sentido de que a cláusula de não concorrência não pode ser genérica e nem superficial. Para que tenha validade jurídica, ela deve conter expressamente:
l – A vigência, ou seja, o prazo determinado que o ex-empregado deverá se abster de trabalhar para a concorrência. Vemos acordos em geral de 1 ou 2 anos (por analogia, art. 445, caput, CLT), e alguns de até 5 anos (por analogia, art. 1.147, CC).
ll-A limitação territorial, ou seja, a área geográfica que o ex-empregado não poderá trabalhar pelo prazo ajustado.
lll-A limitação material, ou seja, a descrição das atividades que o ex-empregado exercia e que não poderá exercer pelo prazo ajustado.
lV-A vantagem pecuniária, ou seja, a contrapartida que será dada ao ex-empregado para se afastar de determinado segmento do mercado pelo prazo ajustado. O TST sinaliza uma compensação mensal entre 50% e 100% da última remuneração.
V- A penalidade para o caso de descumprimento.
Mostra-se acertado o caminho que a doutrina e a jurisprudência vêm traçando em vista da regulamentação do pacto de não concorrência. Afinal, ao contrário do que parece para alguns, uma cláusula de não concorrência pós-contratual é positiva para ambas as partes: para o empregador, por ter seus segredos comerciais e industriais protegidos. Para o empregado, pela contraprestação pecuniária e pela própria chancela de que sua atuação na empresa em que trabalhava foi diferenciada.
Leonardo Francisco Ruivo e Renata Rechden Gomide são, respectivamente, sócio fundador e advogada do BGR Advogados.