Empatia, escuta ativa e rotina de conversas estruturadas são pilares essenciais para transformar laços de sangue em sociedades sustentáveis.
Por Gabriel Bueno, empreendedor e sócio-fundador da Benini Massas
Quando conto que trabalho com meu irmão e minha mãe em um negócio familiar, quase sempre escuto duas reações: ou um “que legal, deve ser muito bom trabalhar com quem a gente confia” ou um “nossa, eu não daria conta, ia brigar todo dia”. A verdade é que os dois lados têm razão.
Empreender em família traz vantagens difíceis de encontrar em outros modelos de negócio. Há cumplicidade, agilidade e uma confiança que, em muitos momentos, permite tomar decisões com base em um simples olhar. Mas também exige um esforço consciente e diário para transformar laços afetivos em estruturas profissionais sólidas. E o centro de tudo isso — descobri na prática — é a comunicação.
Não adianta ter afinidade se a gente não se escuta. Não adianta se amar se não conseguimos nos entender. Parece óbvio, mas não é: muitas empresas familiares tropeçam justamente por acreditarem que os laços de sangue garantem um alinhamento automático. Só que afinidade não substitui processo.
Crescer exige mais que afeto: exige organização
Começamos de forma bem informal: eu, minha mãe e meu irmão, vendendo massas artesanais feitas na cozinha de casa. Crescemos rápido, abrimos loja, conquistamos bons clientes. Mas, em pouco tempo, o crescimento passou a pressionar nossa dinâmica interna. Tarefas se confundiam, a fronteira entre vida pessoal e profissional sumiu, e pequenas falhas de comunicação geravam ruídos cada vez maiores. Viramos sócios antes de aprendermos a ser parceiros.
Foi então que entendemos que precisávamos estabelecer uma rotina de conversa — e não só sobre boletos ou produção. Implementamos reuniões semanais com pauta clara e tempo de fala para cada um. Começamos a usar ferramentas para organizar tarefas, definir responsabilidades e, acima de tudo, respeitar o espaço de cada um. Estabelecemos uma regra de ouro: problema de trabalho se resolve no trabalho, não no almoço de domingo.
Comunicação transforma mais do que a empresa
Esse processo não transformou apenas o nosso negócio — mudou a forma como nos relacionamos. Aprendi a ouvir mais e reagir menos. Entendi que minha mãe, além de ser uma pessoa incrível, é uma gestora com visões diferentes das minhas — e que isso é valioso. Percebi que meu irmão, além de parceiro de infância, é um profissional que precisa de espaço para crescer. E que eu, como jovem empreendedor, ainda tenho muito a aprender — inclusive sobre dosar entusiasmo com realismo.
Trabalhar com a família me deu um tipo de aprendizado que não se ensina na faculdade. Uma espécie de MBA em afeto, escuta e tomada de decisão com empatia. E, se tem algo que levo como a maior lição dessa jornada, é que nenhuma empresa, familiar ou não, cresce de verdade sem um canal de comunicação honesto, transparente e contínuo.
Porque, no fim das contas, não é o amor que segura uma sociedade familiar. É o diálogo.