Rafael Souto, CEO da Produtive e especialista em carreira
O apelo ao aprendizado contínuo nunca foi tão urgente para a sustentabilidade das carreiras. Se a transformação digital passou a redefinir ou extinguir profissões, exigindo a revisão e o aprimoramento constantes de habilidades, a mudança ganhou velocidade com a incerteza escancarada da pandemia.
Mais de um terço das habilidades consideradas importantes na força de trabalho atual terão mudado até 2025, segundo relatório do Fórum Econômico Mundial. Por isso, aprendizado ativo e estratégias de aprendizagem perdem apenas para pensamento analítico e inovação no ranking das habilidades mais demandadas nos próximos três anos.
Cada vez mais negócios bem-sucedidos são conduzidos por pessoas capazes de aprender mais e mais rápido. A flexibilidade para rever conceitos, desaprender e assimilar novas metodologias e informações proporciona a rapidez necessária à alta performance empresarial.
Agilidade nas respostas aos novos desafios é vantagem competitiva em ambientes voláteis como os enfrentados pela maioria das organizações. Dentro desse contexto, o que vemos é a necessidade de um repertório de habilidades comportamentais e de uma cultura capaz de fomentar a capacidade de aprendizado contínuo nos indivíduos ou lifelong learning
A capacidade de estar sempre aprendendo depende de um estado de espírito aprendiz. Em artigo para a consultoria Mc Kinsey, Lisa Christensen, Jake Gittleson, and Matt Smith classificaram “aprendizado intencional” como a mais fundamental das habilidades. Essa meta-habilidade, uma competência de desenvolvimento de outras habilidades, é treinável. É como se as pessoas com essa habilidade estivessem sempre no “modo aprendiz”, tirando lições práticas e conceituais de situações formais de aprendizado e também de interações e atividades do cotidiano.
Segundo os pesquisadores, o aprendizado intencional é alimentado pela curiosidade e pelo chamado growth mindset. A mentalidade de crescimento, na tradução em português, é definida pela pesquisadora da Universidade de Stanford Carol Dweck, autora do livro “Mindset: a Nova Psicologia do Sucesso”. Pessoas que têm o growth mindset encaram desafios como aprendizados e acreditam em seu potencial de evolução e aprendizagem. É oposta à mentalidade fixa – fixed mindset, em inglês – presente em indivíduos que consideram suas habilidades inatas e fixas. Pessoas assim não acreditam na sua capacidade de aprender. Mas, para avançar na carreira, deveriam ter mais autoconfiança em seu potencial de aprendizagem.
As organizações podem ajudar seus colaboradores a desenvolverem o mindset de crescimento, a curiosidade e, consequentemente, aprendizado intencional e contínuo. Empresas com uma cultura de aprendizagem são terreno fértil para o florescimento destas habilidades.
O diálogo frequente entre líderes e liderados sobre desenvolvimento e carreira faz parte dessa cultura propícia a novos aprendizados e à inovação. Os líderes também devem se certificar de que o ambiente de trabalho ofereça segurança psicológica para as pessoas se sentirem confortáveis em se manifestar, errar, aprender e discordar. No livro “Fearless Organization” (Organização Sem Medo, na tradução para o português) Amy Edmondson, professora da Universidade de Harvard, aprofunda a questão da segurança psicológica como base da inovação, por exemplo.
A atitude do líder é sempre fundamental tanto para garantir a segurança psicológica como para estimular o aprendizado contínuo. Liderar pelo exemplo estimulando que seus liderados façam perguntas faz uma baita diferença. E é fato que líderes com flexibilidade, disposição para rever conceitos, abertura a novas ideias e que valorizam aprendizado e curiosidade costumam montar equipes com essas caraterísticas.
Dentro de uma cultura de aprendizagem, aqueles executivos que se consideram experts absolutos encastelados em seus feudos corporativos perdem espaço para quem investe tempo significativo em autodesenvolvimento. A aprendizagem formal e informal deve estar na agenda dos indivíduos da base ao topo.