Com a pandemia em ascensão um dos problemas mais urgentes diz respeito ao mercado de trabalho. Como sempre, os olhos se voltam para as grandes empresas. Micro e pequenas, entretanto, são as que maiores dificuldades enfrentarão para sobreviver. Para micro e pequenos empregadores a solução consiste no encerramento das atividades, com o desligamento dos poucos empregados. Arcar com custos do exame demissional, do aviso prévio, das férias, do décimo terceiro, da indenização de 40%, é impossível. A legislação trabalhista ignora situações de crise. Foi redigida para economia em expansão e presume que todo empregador dispõe de recursos ilimitados.
Médias empresas se encontram em situação semelhante. Refletem a pobreza da economia. O capitalismo tupiniquim é subdesenvolvido. Breves períodos de crescimento são anulados por longos períodos de estagnação e recessão. Quando o governo tentava fazer crer que estávamos a caminho da recuperação econômica, a pandemia nos acerta em cheio e reduz a zero previsão do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). Para consternação geral, mais uma década perdida.
Em lojas, bares, restaurantes, as demissões poderão atingir a cinco milhões. Montadoras de veículos colocam 100 mil empregados em férias coletivas ou em regime de banco de horas. Na indústria automotiva, cada emprego direto gera mais de dez ou doze indiretos. Os prognósticos são aterrorizadores porque já tínhamos cerca de 12 milhões de desempregados.
Não existe solução financeira para o problema. Imaginar a possibilidade de preservar empregos com a proibição de demitir, ou condicionada ao pagamento de verbas indenizatórias, ultrapassa os limites da racionalidade. Se houvesse como garantir que o surto de coronavírus seria detido em dois ou três meses, talvez fosse viável o recurso às férias coletivas ou banco de horas.
Duas perguntas, porém, o Ministério da Saúde e infectologistas não conseguem responder: 1º) quando a vacina ou medicamentos de comprovada eficiência estarão á disposição dos infectados; 2) dentro de quantas semanas a pandemia conhecerá o ápice e começará a declinar. Uma das hipóteses é de que entre em queda a partir de junho ou julho. Ninguém, todavia, se arrisca a afirmá-lo. Em síntese, o País talvez inicie a volta à normalidade no final do segundo semestre ou em 2021, com investimentos na reconstrução.
O problema trabalhista é antigo e gravíssimo. A solução, contudo, não depende da vontade exclusiva dos empregadores, e do desejo de evitar o desligamento de empregados. De um lado porque demitir é injusto, arriscado e caro; de outra parte porque que dia virá, e não se sabe quando, sentirão necessidade de recontratar mão de obra experiente.
Enquanto perdurar a crise o governo federal deve examinar algumas ideias, como isentar temporariamente as empresas do recolhimento das contribuições ao FGTS; suspender a arrecadação das contribuições previdenciárias; anistiar multas aplicadas com fundamento em Normas Regulamentadoras; suspender os prazos processuais na Justiça do Trabalho; adiar audiências e julgamentos; decretar moratória para acordos celebrados com o objetivo de encerrar reclamações e execuções trabalhistas; reduzir a 10% o valor da indenização nas demissões sem justa causa; dilatar o prazo do seguro desemprego; reconhecer como tendo natureza de força maior o estado de calamidade pública, para os efeitos dos artigos 501/503 da CLT.
Países como Alemanha, Inglaterra, Japão, devastados na segunda guerra mundial, consumiram anos para se recuperar, embora recebessem ajuda do Plano Marshall e sobrevivesse parcela importante do parque industrial. O Brasil era e permanece pobre. Não devemos nos deixar iludir com ilhas de desenvolvimento, onde se encontram milhões de desocupados e favelados. As atividades industriais entraram em declínio nos últimos anos. È impossível saber quanto tempo levaremos para voltar a crescer. Talvez em 2021. Para recuperar milhões de empregos serão necessários recursos que tornem as indústrias competitivas, o que estão distante de ser exceto no setor agroindustrial.
As palavras finais são de agradecimento a infectologistas, médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem, motoristas de ambulâncias, empregados de laboratórios farmacêuticos e de farmácias e a todos que, desafiando os riscos da contaminação e colocando a vida em perigo, executam serviços essenciais e inadiáveis. Sem eles não haveriam esperanças de salvação.
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Por Almir Pazzianotto Pinto, advogado, ex- Ministro do Trabalho e presidiu o Tribunal Superior do Trabalho.