As instituições de ensino vivem um dilema com a inteligência artificial
Reinaldo Polito é Mestre em Ciências da Comunicação e ensina profissionais liberais, executivos e estudantes a arte da oratória há mais de 40 anos
As instituições de ensino nos Estados Unidos levaram um susto e ficaram atordoadas. De uma hora para outra, alguns alunos começaram a apresentar trabalhos de qualidade muito acima do normal. Afinal, o que estava acontecendo? Que fenômeno era esse que transformava estudantes razoáveis em escritores notáveis?
Rapidamente, o segredo foi desvendado. Os “espertalhões” estavam recorrendo à ajuda de um programa recém-lançado pela OpenAI, o ChatGPT. A maioria das escolas tomou medidas drásticas, bloqueando o uso do aplicativo em sala de aula.
Algumas exigiram que os alunos escrevessem pelo menos um rascunho enquanto estavam na escola, para finalizá-lo em casa. Alertaram que, se houvesse uma grande discrepância entre o rascunho e a versão final, o trabalho seria recusado.
Poucas, entretanto, perceberam inicialmente que não havia volta; o recurso tinha vindo para ficar. Assim, em vez de combater o “inimigo”, decidiram abraçá-lo, desenvolvendo métodos de ensino que incorporavam o uso do ChatGPT.
O cenário remete ao início dos anos 1970 com o advento das calculadoras eletrônicas. Com receio de que os alunos perdessem a capacidade de raciocinar, muitos professores barraram esses dispositivos nas salas. As contas, alegavam, precisavam ser feitas manualmente.
Com o passar do tempo, essa resistência foi vista como infundada. Concluíram que, profissionalmente, todos utilizariam calculadoras. Assim, gradualmente, elas foram incorporadas ao processo de aprendizagem. Hoje, poucos fazem cálculos mentalmente.
A introdução do ChatGPT também encontrou resistências iniciais. Muitos sentiam até vergonha de admitir que recorriam a esse recurso. Os que tinham habilidade para escrever eram críticos: “Delegar a escrita a um programa é pura preguiça, ou até falta de integridade”.
Porém, as atitudes começaram a mudar. Com mais profissionais admitindo usar regularmente o chatbot, a aceitação cresceu. Quem escreve bem usa o programa para complementar pesquisas. Aqueles menos aptos a redigir solicitam um texto completo e depois fazem ajustes conforme seu estilo e pensamento.
Assim, as escolas passaram a flexibilizar a utilização do ChatGPT, pedindo aos docentes que sugerissem abordagens didáticas integrando a inteligência artificial.
Meus alunos políticos, que têm ideias mas enfrentam dificuldades para colocá-las no papel, encontraram nessa ferramenta um recurso inestimável. Um candidato confessou que tinha problemas para elaborar discursos convincentes.
Quando perguntei sobre o tema de interesse, ele mencionou a privatização dos portos como um tópico central em sua campanha. Perguntei se era a favor ou contra, e ele quis argumentos para ambos os lados.
Utilizei o OpenAI para pesquisar o tema, e a resposta veio em segundos, deixando-o maravilhado. Ele nunca imaginou uma solução tão prática.
Recomendei que acrescentasse suas opiniões, exemplos pessoais e que checasse as informações em outras fontes. Enfatizei a necessidade dessa verificação, uma vez que os textos gerados podem conter inconsistências ou interpretações equivocadas.
Há aqueles que resistem e nem querem ouvir falar em inteligência artificial. Estamos em um momento de transição e reflexão. Em breve, quem não se adaptar estará à margem de um novo mundo. Siga pelo Instagram: @polito.