Talvez você ache essa afirmação exagerada, mas de acordo com levantamento da Accenture Strategy, realizado com 150 corporações globais, ficou demonstrado o papel decisivo das gerências de negócio na implantação de mudanças.
O levantamento mostrou que as diretorias têm um papel fundamental no planejamento e na visão estratégica, mas todos os outros pontos determinantes para a mudança, como mobilização e engajamento das equipes (accountability) e articulação para fazer acontecer vem, principalmente, das lideranças das unidades de negócios.
A pesquisa mostra ainda que os piores resultados em programas de mudança tinham lideranças fortes no “topo”, mas frágeis na base, enquanto que os melhores resultados apareceram em organizações que formavam lideranças fortes e consistentes em todos os níveis.
Em outras palavras, não há mais espaço para aquele líder “Branca de Neve”: ele é incrível, mas vive cercado por sete anões. Seu time tem que ser forte. Como disse Tom Peters: “Líderes não criam seguidores… criam líderes.” Segundo o levantamento, os investimentos na formação e desenvolvimento dos gestores de negócio são importantes para a agenda da mudança.
As empresas são como as pessoas: não mudam porque querem, mudam porque precisam. E se o contexto organizacional não se modifica, alterando a lógica de benefícios e consequências, as pessoas não vão mudar.
Considere uma palavra muito ouvida hoje nas palestras e treinamentos: inovação! Não conheço ninguém que diga que ela não é essencial hoje, mas também não conheço nenhuma organização que esteja levando a sério a inovação no seu modelo de gestão. Algumas “foram mudadas” com a chegada de novos líderes, mas isso não é mudança: eles chegam e tentam implementar o que deu certo na empresa anterior.
Ainda usamos o comando-controle, desenhado por Fayol e sacramentado por Weber e Taylor. Ainda aumentamos a pressão para conseguir mais resultados. Ainda ameaçamos quem não consegue atingir suas metas… e depois reclamamos da falta de transparência, da falta de comprometimento e dos desvios. Atenção diretores e gestores: aumento da pressão leva ao aumento do cinismo. O jogo mudou e temos que mudar a estratégia. Vivemos em uma sociedade digital que demanda mais congruência (entre o que falamos e fazemos), consistência (entre o que propomos e o que é possível realizar) e coerência (entre propósito, valores e prática).
Em nossa metodologia de Gestão de Mudança e Turnaround, usamos uma pesquisa profunda que abrange todos os níveis da organização, que chamamos de Pesquisa 3D, porque tem uma etapa quantitativa e duas etapas qualitativas. Ali vemos os efeitos reais da gestão sobre a operação e verificamos como são esses líderes intermediários ou de negócio que fazem a “empresa de verdade” e não a diretoria. Lamento informar que quanto mais alto sobe um líder, mas as pessoas falam o que ele quer ouvir e menos o que ele precisa ouvir. É o “photoshop da verdade”, os “indicadores melancia” (verdes por fora e vermelhos por dentro) entre outras surpresas que derrubam a alta gestão.
Em tempos em que a complexidade aumenta de forma exponencial como os que vivemos hoje, duas estratégias de contingenciamento têm se mostrado de grande valor. A primeira é aumentar o suporte entre pares (lateralidade) e isso se conquista com a construção de acordos consistentes que garantam um balanço de custo-benefício equilibrado entre as partes. A segunda estratégia é aproximar a alta liderança da liderança intermediária e esses, das equipes de ponta. Entretanto, fique atento ao que as pessoas expressam quando você chega… será que elas dizem “Graças a Deus!” ou “Ai, meu Deus!”. Essa é a moldura da confiança que muda tudo.
Recentemente eu estava conduzindo um treinamento e o diretor falou de forma incisiva para seus gerentes: eu quero mais biópsia e menos autópsia. Ele dizia isso se referindo que os problemas chegavam já no estágio final, no qual pouco poderia ser feito. Faz sentido? Caro diretor, na verdade isso não é um sintoma do grupo e, sim, da sua gestão. Quando o time não traz a biópsia, isso é um sinal de medo e de falta de acesso ao seu líder. Cada um tem o time que merece e vale lembrar o que as pesquisas sobre retenção de pessoas mostram: um funcionário não se demite de uma empresa, ele se demite de um chefe.
Por Roberto Aylmer – médico e professor internacional da Fundação Dom Cabral e consultor em gestão estratégica de pessoa.
Imagem: Katemangostar / Freepik