Tédio foi o motivo de ação judicial na França
No Brasil, a Consolidação das Leis do Trabalho, a CLT, sancionada por Decreto-Lei em 1943, velha e que não corresponde mais à realidade, só serve mesmo para os brasileiros (os que estão empregados, é claro), pedirem seus direitos! Aqui, a Justiça do Trabalho é a tábua de salvação de empregados que adoram os tais direitos adquiridos e eternos! Antes que comece a apanhar dos sindicatos, não vou defender (ainda) mudanças na CLT.
Por que escrevo esta introdução? Parece que a diferença entre a França e o Brasil é gritante no que diz respeito aos processos trabalhistas. A rede de jornalismo BBC publicou no início de agosto, e toda a mídia nacional reproduziu uma notícia insólita: “Francês pede mais de R$ 1 milhão em indenização por ‘tédio’ no trabalho”. Aqui, se o trabalhador fizer uma hora a mais do que está em seu contrato de trabalho, quando é demitido, vai à justiça pedir as horas extras. Na França, pode parecer maluquice, mas um trabalhador daquele país, Frédéric Desnard-, resolveu pedir na justiça 360 mil euros (cerca de R$ 1,3 milhão) em compensações por ter sido “assassinado profissionalmente” pelo que qualificou de “chatice extrema” em seu trabalho na Interparfum, companhia de fabricação e distribuição de perfumes em Paris.
O pedido é hilário, se comparado à realidade brasileira. Digo isso sem medo de sofrer patrulha, pois já conheci muito colega indolente, que não gostava de trabalhar e, se pudesse, recorreria à justiça para trabalhar pouco. Já Fréderic, que trabalhava em um cargo de gerência, disse que ficava tão exausto e entediado, que passou a sofrer um esgotamento físico e mental – conhecido como Síndrome de Burnout. Parece brincadeira, mas essa síndrome costuma ser relatada especialmente quando o trabalhador sofre assédio moral e sobrecarga excessiva de trabalho. Já o francês, argumenta no processo que entre 2010 e 2014 foi “colocado na geladeira” e recebia apenas tarefas mais simples do que suas responsabilidades originais. Segundo ele, esse comportamento de sua chefia deixou-o “destruído” e “deprimido”. Os advogados da Interparfum argumentaram que Frédéric nunca disse nada sobre estar entediado durante seu período de trabalho na empresa. No ano passado, um tribunal ‘jogou duro’ com Frédéric, condenando-o a pagar à empresa mil euros (cerca de R$ 3.600) por difamação.
O tribunal entendeu que ele havia sido “inspirado por um senso de hostilidade que nutria contra a empresa”. Mas Frédéric recorreu, e o caso continua – uma nova audiência dever ser marcada para o início de 2017.
Agora faço minha análise do caso: “colocá-lo na geladeira” não deixa de ser uma discriminação contra o empregado e, isso pode, sim, desencadear o Burnout. Ora, quanto ao mérito do pedido dele, acho que faz sentido. Sentir-se ativo, com autoridade e no comando das atribuições profissionais é sempre bom. Ao retirar dele o contexto de produtividade e desafios, o francês deve ter sofrido pela falta de sentido na empresa. Além do mais, também penso como a psicóloga Sandi Mann, que disse que tédio no ambiente de trabalho é uma “crescente fonte de estresse” para muitas pessoas. Aos que gostam de ócio no trabalho, sugiro que vão para a França tentar um emprego na Interparfum, para “coçar o saco de manhã e colocar creme à tarde”.
Por Emily Sobral – www.segurancaocupacionales.com.br
Foto Capa: Pixabay