O papel do trabalho presencial no aprendizado e na progressão de carreiras
Washington Botelho é Presidente da JLL Work Dynamics para a América Latina.
A expressão “ir para o trabalho” tem ganhado novos contornos desde a adoção massiva da modalidade remota. Há 35 anos quando eu iniciava minha carreira na Xerox, parte da minha função era estar presente e ser visto. Ou seja, quando meu chefe chegava, era de bom tom que meus colegas e eu já estivéssemos no escritório, preferencialmente, trabalhando (e longe do bate-papo no cafezinho). É provável que, se tem mais de 35 anos, isso também tenha acontecido com você. O ambiente corporativo expressava máximas como “quem não é visto não é lembrado”, por exemplo, que tem conexão direta com a ideia de progressão na carreira.
Essa lógica foi diretamente impactada, especialmente, no período pós-pandemia. Os escritórios híbridos, que têm crescido em todo o mundo, envolvem uma combinação de trabalho presencial e remoto, permitindo flexibilidade aos funcionários. Para muitos de nós, “ir ao trabalho” tornou-se virar à esquerda no quarto ao lado e ocupar a mesa do home office. No entanto, de acordo com Kevin Ellis, da PwC, a implementação da inteligência artificial generativa está afetando as tarefas tradicionalmente realizadas pelos funcionários mais jovens. Essa tecnologia tem substituído o ser humano em atividades mais simples e básicas que são aquelas, justamente, executadas por “quem está começando”. Isso significa que, para ter progressão de carreira mais rapidamente, essas pessoas devem passar mais tempo no escritório, onde podem se envolver em interações presenciais, obtendo oportunidades de execuções mais complexas e em busca de um desenvolvimento mais significativo.
Ellis ressalta a importância do tempo cara a cara e da colaboração entre as pessoas no escritório, enfatizando que as interações ao vivo são cruciais para o desenvolvimento e crescimento profissional. Isso implica que os funcionários mais jovens precisem evitar a tentação de trabalhar predominantemente em casa e, em vez disso, passar quatro a cinco dias no escritório para maximizar suas oportunidades de sucesso na carreira. Embora a tecnologia esteja desempenhando um papel cada vez mais importante em diversas tarefas empresariais, ainda é valorizada a importância do trabalho em equipe, aprendizado colaborativo e crescimento pessoal que são mais facilmente alcançados por meio de interações no escritório.
Para tanto, empresas precisam encontrar maneiras de motivar e envolver a geração Z no escritório, oferecendo-lhes oportunidades e desafios significativos, mesmo com a automação de tarefas mais rotineiras e repetitivas pela IA. Isso pode ser alcançado por meio de programas de mentorship, treinamentos especializados e projetos estimulantes que impulsionem a progressão de carreira daqueles que ainda têm longo caminho a trilhar.
Há ainda evidências de que uma maior interação cara a cara no ambiente de trabalho pode ajudar a mitigar problemas como burnout, isolamento e doenças mentais. Embora seja importante notar que cada indivíduo é único e as respostas podem variar, existem benefícios potenciais associados à interação social nos escritórios. Aqui estão algumas maneiras pelas quais a interação cara a cara pode desempenhar um papel positivo na saúde mental e no bem-estar dos funcionários:
- Conexão humana: permite que as pessoas se conectem em um nível mais profundo, criando relacionamentos de trabalho significativos. O sentimento de pertencimento, comunidade e apoio social resultante da interação cara a cara no escritório pode ajudar a reduzir o isolamento e a solidão, que são fatores de risco para problemas de saúde mental.
- Colaboração e feedback imediatos: facilita a colaboração e a comunicação em tempo real. Ser capaz de colaborar em equipe, compartilhar ideias e receber feedback imediato pode proporcionar um senso de realização e motivação, o que pode ajudar a reduzir o estresse e o risco de burnout.
- Compartilhamento de conhecimento: permite a troca direta de conhecimento e experiências entre colegas. Isso pode facilitar o aprendizado, o desenvolvimento profissional e o crescimento contínuo, promovendo um ambiente de trabalho estimulante e enriquecedor que pode contribuir para uma boa saúde mental.
No entanto, é importante também reconhecer que o equilíbrio entre trabalho presencial e remoto pode variar para cada um de nós. Algumas pessoas podem preferir uma combinação específica de quantidade de dias em trabalho remoto e presencial, dependendo de suas necessidades individuais e preferências de trabalho. Portanto, é crucial que as empresas sejam flexíveis em sua abordagem e trabalhem com os funcionários para encontrar o arranjo que melhor atenda às suas demandas profissionais e bem-estar pessoal.
Cabe aqui uma provocação final: em um mundo cada vez mais orientado pela tecnologia, além da interação presencial, será que existem outras abordagens inovadoras capazes de equilibrar o poder da inteligência artificial com as necessidades humanas? A discussão sobre o futuro do trabalho é complexa e desafiadora e merece ser explorada em busca de soluções que promovam tanto a eficiência quanto o bem-estar das pessoas.