Da pipa à direção: a jornada de resiliência, fé e coragem no universo corporativo
Colunista Mundo RH, Márcio Alencar, Diretor de Estratégia Digital, Marketing e Negócios da Alelo
Embora hoje eu seja diretor de uma grande empresa, nada caiu do céu. Venho de uma família de origem simples, com cinco irmãos, e isso impôs desde cedo a necessidade de batalhar para ter o básico.
Trabalho desde os 13 anos, quando fazia pipa em casa, com meus irmãos, e as vendia nas ruas do Rio de Janeiro. Também fui vendedor de picolé na feira, trabalhei numa loja de tintas e servi à Marinha. O primeiro emprego com carteira assinada foi aos 19, como porteiro de um edifício de luxo na Barra da Tijuca.
Esse primeiro ciclo foi marcado por muitas dificuldades, mas foi também o período em que desenvolvi (nem sempre conscientemente) uma tríade de valores importantíssimos: fé, resiliência e coragem. Eles foram fundamentais tanto para o meu desenvolvimento pessoal quanto profissional.
A tríade aplicada
Meu ingresso no mundo executivo aconteceu há 25 anos, em março de 1999, no Bradesco Previdência. Com 21 para 22 anos e baixíssima maturidade no ambiente corporativo, precisei dar duro, aprender rápido, bater e apanhar. Em suma, fui resiliente (quem vendeu pipa, picolé e foi porteiro aprende a ser resiliente na marra!). Menos de dois anos depois descobri que tinha habilidade para me comunicar e liderar pessoas e virei gerente de uma equipe.
Meu passo seguinte, em 2003, foi migrar para o Unibanco. Porém, com quase 26 anos, eu ainda não tinha um diploma universitário. Fazer uma faculdade tornou-se, então, primordial. Me matriculei no curso de Administração com ênfase em Marketing e por quatro anos trabalhava durante o dia, liderando uma grande equipe de vendas, e estudava à noite. Me formei e emendei o primeiro MBA, em finanças.
Os estudos abriram minha cabeça e me deram condição de alçar voos mais altos. Em 2008 vim para São Paulo assumir uma superintendência do Unibanco AIG, a seguradora do Unibanco. Logo depois da mudança, houve a fusão do Unibanco com o Itaú, algo que não estava nos planos. Nessa reviravolta o Itaú desenvolveu em mim um olhar mais analítico, capaz de entender os fundamentos lógicos dos processos.
Em 2012, dei uma guinada na carreira e iniciei minha jornada como empreendedor na Zolkin. Foram dois anos de experiências que valeram por uma década. Empreendi na raça, montando do zero equipes de todas as áreas, sob a gestão de um grupo familiar (algo inédito para mim).
Foi só em 2014 que voltei ao mundo corporativo e cheguei à Alelo. Tive a chance de colocar em prática todo o aprendizado dos 15 anos anteriores com autonomia, confiança e liberdade de acertar e, eventualmente, errar e corrigir rápido.
A tríade fé, resiliência e coragem foi importante em todos esses movimentos. A fé pautou minhas decisões de aceitar novas oportunidades, mudar de cidade, sair de CLT para PJ e voltar a ser CLT; a resiliência me permitiu resistir à pressão de estudar e trabalhar, de ver os planos mudando inesperadamente e de tocar um negócio, e a transformou em impulsionadora em vez de obstáculo; e a coragem me manteve firme e confiante nos diferentes contextos.
A partir disso, como busco ajudar os jovens profissionais?
Uma pesquisa da ResumeBuilder.com feita no início do ano com mais de 700 líderes norte americanos apontou que 3 em cada 10 evitam contratar GenZs para suas vagas. Isso se deve, basicamente, a problemas de comportamento como arrogância (60%), não responder bem a feedbacks (58%), comunicação ruim (39%), falta de interesse ou engajamento (33%) e dificuldade de gerenciamento (26%).
Por outro lado, também no começo de 2024, um estudo da Workplace Intelligence mostrou que 47% dos profissionais da Geração Z afirmam receber melhores conselhos do Chat-GPT do que dos seus chefes, pois esses não colaboram com seu desenvolvimento de carreira.
É evidente que os zoomers têm tido dificuldades para se adaptar às exigências do mundo corporativo e precisam evoluir em uma série de aspectos, mas o que nós, das gerações anteriores, estamos fazendo para diminuir esse descompasso entre as expectativas deles e as das organizações?
Entendo que é meu papel, como profissional maduro, orientar os mais jovens. Nos bate-papos que tenho a cada 45 dias na Alelo com os profissionais abaixo de 30 anos, é comum vê-los preocupados e ansiosos com os rumos da vida e da carreira. Por isso, falo sobre como a fé, a resiliência e a coragem permearam a minha história e, mais do que isso, como podem guiá-los rumo ao crescimento pessoal e profissional.
Me refiro à fé não apenas do ponto de vista religioso, mas ao sentido literal da palavra: acreditar em um futuro que ainda não existe, mas cuja materialização depende de esperança e, principalmente, ações concretas. A fé nos faz confiar no caminho.
Aliada à fé está a resiliência. Afinal, o processo de imaginar, querer e ter resultados demanda muita disciplina, dedicação e estudo – especialmente para os que, como eu, são egressos da escola pública. A resiliência também nos auxilia a lidar com as dificuldades e as frustrações pelas coisas que não acontecem como imaginamos.
Por fim, a coragem é necessária para enfrentar os problemas, as barreiras e tudo aquilo que se coloca entre você e seu objetivo. Precisamos dela ao longo de toda a vida, mas especialmente no começo da jornada profissional, quando ainda somos inexperientes.
Dividir aprendizados, erros, conquistas e decepções é uma ótima maneira de ajudar esses colegas a encontrar seu caminho. Isso é benéfico não só para as empresas, mas para o Brasil e para sociedade. 23 milhões de zoomers já integram a força de trabalho do País, segundo o IBGE. Globalmente, a expectativa é de que essa geração represente 25% dos trabalhadores até 2025.
Ou seja, reclamar da “molecada” não vai mudar o fato de que, em breve, a Geração Z será maioria nas empresas. Se esse é um acontecimento inevitável, por que não apoiar seu desenvolvimento, preparando-os para liderar as mudanças que nós não conseguimos promover?
Essa não é uma missão qualquer, mas tenho tentado contribuir com os aprendizados que minhas vivências deixaram. Seja por meio de mentoria, reuniões periódicas, ou uma simples conversa durante o café, te convido a fazer o mesmo. Mais do que nunca, os jovens querem e precisam disso.