Há flagrante omissão na lei e jurisprudência com relação à projeção do aviso prévio na modalidade de rescisão contratual por mútuo acordo
A Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017) já completou 1 ano e 3 meses e as dúvidas relativas ao dia a dia das empresas estão cada vez mais interessantes.
Há flagrante omissão na lei e jurisprudência com relação à projeção do aviso prévio na modalidade de rescisão contratual por mútuo acordo, ou seja, quando patrão e empregado resolvem rescindir o contrato de trabalho por acordo de vontade. O artigo 484-A da CLT se limita apenas a afirmar que o aviso prévio, se indenizado, deverá ser pago pela metade (assim como a multa do FGTS), mas determina que todas as demais verbas serão pagas na integralidade. Não esclarece, entretanto, como ficaria o período de projeção do aviso prévio, qual seja, quantos dias que a empresa deve projetar para proceder a baixa na Carteira de Trabalho e, consequentemente, até qual data deverá ser calculado o valor das férias e do 13º salário proporcional.
Como forma de tentar esclarecer essa questão, buscamos algum instituto que pudesse ser utilizado por analogia para verificarmos a melhor conduta a ser adotada. Para tanto, nos valemos da rescisão por culpa recíproca, para o qual o art. 484 da CLT determinou a redução da indenização rescisória pela metade:
“Art. 484, CLT – Havendo culpa recíproca no ato que determinou a rescisão do contrato de trabalho, o tribunal de trabalho reduzirá a indenização à que seria devida em caso de culpa exclusiva do empregador, por metade.
Com o intuito de esclarecer do que se trataria esta indenização, o TST definiu em sua Súmula nº 14 as verbas rescisórias que seriam devidas no percentual de 50%, dentre as quais se encontra o aviso prévio:
Súmula 14/TST – . Culpa recíproca. Rescisão do contrato de trabalho. Indenização. Aviso prévio. Décimo terceiro. Férias proporcionais. CLT, art. 129, CLT, art. 484 e CLT, art. 487.
Reconhecida a culpa recíproca na rescisão do contrato de trabalho (CLT, art. 484), o empregado tem direito a 50% (cinqüenta por cento) do valor do aviso prévio, do décimo terceiro salário e das férias proporcionais.”
A pesquisa jurisprudencial sobre os reflexos do aviso prévio nestas situações excepcionais demonstrou que o tema não é muito debatido nos Tribunais e a pouca jurisprudência existente é extremamente divergente, possuindo posicionamentos para ambos os lados.
Há quem sustente que a projeção do período seria integral, sendo que somente o pagamento do aviso prévio seria pela metade. Nesse caso, a projeção do período integral incluindo o aviso prévio proporcional seria utilizado como base para férias e 13º, e somente o pagamento do aviso prévio seria efetuado pela metade (posição mais conservadora).
Ousamos discordar desse posicionamento. Primeiro, porque a ideia do legislador (reformista) foi exatamente criar uma alternativa intermediária para os sujeitos da relação empregatícia (entenda-se patrão e empregado), que garantisse ao empregado a chance de levantar parte do FGTS (o que não seria possível em caso de pedido de demissão) e também receber metade do aviso prévio, possibilitando ao empregado que pudesse procurar outro trabalho já que ambas as partes reconhecem e concordam que o contrato de trabalho atual não está mais fazendo sentido. Sob a ótica da empresa, o legislador visou desonerar a rescisão contratual diminuindo o valor da multa do FGTS e a indenização do aviso prévio (ambos pela metade).
Nesse sentido, verificamos algumas decisões atuais nas quais os magistrados sustentaram a projeção de apenas a metade do aviso prévio no caso de rescisão por culpa recíproca, sendo a baixa da CTPS efetuada no último dia deste período reduzido, de modo que as férias e 13º salário proporcionais seriam calculados apenas até esta data. Vale citar como exemplo:
ü (TRT-SP – Processo nº 1002247-19.2017.5.02.0467, Juiz Sentenciante: Evandro Bezerra, Data de Julgamento: 18/02/2018, Data de Publicação DEJT: 20/02/2018)
ü (TST-RR-319-33.2015.5.09.0012, Relator: Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, Data de Julgamento: 29/03/2017, 3ª Turma, Data de Publicação DEJT: 31/03/2017)
ü (TST- AIRR – 11157-67.2016.5.18.0006, Relatora: Ministra Kátia Magalhães Arruda, Data de Julgamento: 20/03/2018, 6ª Turma, Data de Publicação DEJT: 21/03/2018).
Entendemos que a projeção do aviso prévio pela metade faça mais sentido no caso do mútuo acordo, visto que:
- O art. 484-A, I, “a”, da CLT, não menciona que a redução do aviso prévio indenizado será em relação ao seu valor pecuniário, mas afirma que o aviso prévio em si será pela metade;
- No caso da culpa recíproca (utilizado por analogia), tanto a legislação quanto o entendimento do TST se referem à redução da “indenização” e do “valor” das verbas rescisórias (indicando apenas reflexos pecuniários).
Portanto, se mesmo para a culpa recíproca alguns magistrados defendem que a projeção será exclusivamente do período efetivamente pago, com mais fundamentos seria possível sustentar a postura da empresa de projetar apenas a metade do aviso em rescisões por mútuo acordo.
Ainda levará alguns anos para que os tribunais superiores se manifestem sobre o tema. Até lá, como forma de se buscar maior segurança às práticas dos RHs, sugerimos que o instrumento de “Rescisão por Mútuo Acordo” conste expressamente que:
(i) O aviso prévio será integralmente indenizado, de modo que o seu pagamento corresponderá a 50% do valor total (já computado o aviso prévio proporcional também pela metade) – art. 484-A, I, “a”, da CLT;
(ii) A projeção deste aviso corresponderá igualmente ao período reduzido pela metade, conforme determina a lei;
(iii) O término do contrato e a baixa da CTPS serão feitos no último dia deste prazo pela metade;
(iv) Todas as demais verbas rescisórias serão pagas integralmente, mas calculadas apenas até o último dia deste aviso reduzido e projetado pela metade.
Não descartamos a possibilidade de questionamento da referida cláusula no judiciário, mas certamente seria um argumento a mais que visasse sustentar a validade da providência adotada – já que ajustado entre as partes.
Por Tatiana Barletta Canicoba e Luiz Eduardo Amaral de Mendonça, sócios do FAS Advogados