Priscila Cardoso, gerente de ESG da Certsys
Depois de muita exploração, separação familiar, trabalho forçado, chicotadas, procriação forçada, estupros, humilhações e mortes, finalmente, em 1888, acontece a abolição dos escravos no Brasil. Devido à grande pressão da Inglaterra e das muitas rebeliões dos pretos que não se conformavam com aquela realidade cruel e injusta. O Brasil foi o último país a abolir a escravidão, porém, antes e após 1888, foram feitas inúmeras ações para garantir o rebaixamento social e a marginalização dos negros.
De 1550 a 1888 os povos africanos foram cruelmente escravizados, tratados como animais de carga, impedidos de cultuar seus deuses e sem direitos mínimos a dignidade. Hoje, 134 anos depois de 1888, ainda é possível observar sem muito esforço a dívida histórica carregada de impostos emocionais a serem pagos por pessoas negras.
A luta antes desse marco foi longa. No ano de 1837 é criada a lei que proibia pessoas negras a frequentarem escolas: Lei nº 1, de 14 de janeiro de 1837: “São proibidos de frequentar as escolas públicas: Primeiro: pessoas que padecem de moléstias contagiosas. Segundo: os escravos e os pretos africanos, ainda que sejam livres ou libertos”. O ano de 1850 é marcado pela Lei de Terras, que impedia pessoas pretas e indígenas de comprarem terras. Em 1871, foi decretada a Lei do Ventre Livre, na qual as crianças negras nascidas no país a partir daquela data seriam livres quando completassem 8 anos de idade. Agora fica a pergunta: Uma criança de 8 anos pode se sustentar sozinha e viver de maneira independente? É claro que essa foi mais uma lei que não deu certo. Afinal, os senhores eram donos das crianças e poderiam vender para o Estado ou obrigavam elas a trabalharem em troca de comida até os 21 anos.
Outra Lei que explorou ao máximo a força de trabalho dos pretos escravizados foi a Lei dos Sexagenário de 1885, que libertava os escravos com mais de 60 anos de idade. É claro que ainda assim os “proprietários da carne preta” burlavam a lei alterando o registro de nascimento das pessoas escravizadas, fazendo com que pessoas pretas trabalhassem com idade acima de 60 anos. Mas e depois? Os pretos acima de 65 anos tinham direito à aposentadoria? Tinham um pedacinho de terra para cultivar sua alimentação e continuar a sobreviver?
E o que aconteceu com as pessoas escravizadas após a abolição da escravatura? Eles ficaram sem terra, sem educação e sem trabalho.
Como se não já bastasse todas as dores e privações passadas antes da abolição, a partir de 1890 o povo preto ainda teve que se deparar com leis como a Lei da Vadiagem, da qual muitos pretos que não conseguiam provar que estavam trabalhando eram presos; ou ainda como a Lei de Proibição da Capoeira, que impedia os pretos de manifestarem sua cultura na rua, para que não houvesse agrupamento de pessoas pretas nas ruas.
Hoje em dia, apesar das que conquistas ao longo dos anos, o mercado de trabalho do país ainda tem um extenso caminho a percorrer se tratando de equidade e diversidade racial. Apesar de ações afirmativas, cada vez mais frequentes, ainda não são suficientes em relação ao abismo de oportunidades para brancos e negros. O documento “Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil”, elaborado em 2019 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), trouxe dados nesse sentido, inclusive para a área de Educação, que é onde tudo começa. A taxa de analfabetismo entre pessoas de 15 anos ou mais é de 3,9% na população branca, contra 9,1% entre pretos e pardos.
O racismo estrutural e institucional impedem que pessoas negras tenham acesso a educação e oportunidades e trabalho. Pensando nisso, as empresas têm voltado sua atenção para esse assunto, tentando corrigir a desigualdade histórica existente, minimizar o impacto social causado pelo racismo e de promover um ambiente inclusivo e equitativo que estimule a criação de condições apropriadas de desenvolvimento levando em conta que nem todas as pessoas partem do mesmo lugar.
Na pandemia a situação piorou. De acordo com dados do IBGE em 2019, entre a população brasileira, 75,2% dos pobres do país são negros e apenas 11,9% das pessoas ocupadas em cargos gerenciais são pretas ou pardas. As pesquisas sugerem que os efeitos da crise sanitária foram imediatos, já que trabalhadores em situação de maior precariedade no mercado de trabalho foram os que não puderam realizar seu trabalho à distância e aqueles do setor informal.
Para tentar transformar a cultura de uma empresa, podemos começar priorizando a diversidade, equidade e inclusão, criando ações efetivas e advertindo atitudes que vão contra o posicionamento da marca. Algumas frentes são programas antirracismo, vagas afirmativas, desenvolvimento de talentos negros e a comunicação inclusiva.
A diversidade é um incentivo à inovação, tendo em vista que um ambiente de trabalho que se compromete com a diversidade racial tende a formar um time de pessoas mais envolvidas em suas funções somente por fazerem parte de uma empresa que apoia o que acreditam e isso gera maior produtividade de todos.
O Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010) visa garantir a igualdade de oportunidades por meio de ações afirmativas, estímulo a iniciativas de igualdade, entre outros. Por fim, o compromisso, além de eficiente para empresa, deixando-a mais suscetível a encontrar profissionais promissores e promovendo um clima organizacional com pessoas engajadas, também é um dever.