Toda profissão tem um objeto de trabalho. O contador dedica-se aos números, o engenheiro sabe a resistência de diversos tipos de materiais, o médico entende, como ninguém, o funcionamento do corpo humano. Quando o profissional é promovido a gestor seu “objeto de trabalho” se transforma. Por mais que a área de atuação permaneça a mesma, seu objetivo principal passa a ser as pessoas.
Por não ser uma escolha óbvia e (na maioria dos casos) não ter um treinamento para isso, o gestor não tem essa percepção de imediato. Sua função principal passa a ser lidar com o ser humano. Compreender e orientar cada um, de forma que desenvolvam o seu melhor e que juntos atinjam os objetivos traçados para a área.
O desafio passa a ser como influenciá-los e para isso dominar uma ferramenta específica é essencial: a comunicação significativa. Você pode influenciar alguém de diversas formas: pelo comportamento, pela forma de atuação, pela reação em determinadas situações, mas o ponto comum em todas elas é a comunicação. Aprimorar a competência de comunicação é a chave para o sucesso em sua nova posição.
Um dos problemas mais comuns que já observei em mais de 30 anos de experiência com gestores, dos mais diversos segmentos, é seguir no “piloto automático”, comunicando sempre o como, sem o porquê. Você já recebeu uma tarefa e não soube o porquê dela? Ficou se perguntando: “tenho tantas coisas para fazer e vou ter que parar tudo para fazer isso, qual o sentido?” Se não entendermos o trabalho por completo, a entrega fica comprometida e as chances de refazê-lo são grandes. Sem ter a dimensão sobre a importância daquilo, muitas vezes, o colaborador encara como um peso extra e até se questiona sobre as reais intenções do gestor.
O líder ajuda o profissional a encontrar significado em suas demandas. E como ele faz isso? Transmitindo uma informação completa, começando pela explicação da situação para envolver o colaborador. Com uma comunicação integral, as chances deste atender as expectativas são maiores, de ter um retrabalho são menores, além do aumento da possibilidade de inovar e fazer sugestões para melhorar o que foi solicitado.
O contexto faz a diferença na execução. Se ao invés de dizer “preciso do relatório até às 10h no meu e-mail”, o gestor disser “Nossa empresa está programando um alto investimento. Precisamos de um estudo detalhado do cenário de atuação para identificarmos as possibilidades e escolhermos em quais praças iremos investir. Se escolhermos errado, isso gerará prejuízos significativos! Por isso, preciso entregar um relatório com o que desenvolvemos até hoje e quais são as regiões importantes para nós.
Acho você a pessoa mais confiável para esta análise. Você pode preparar e me mandar até amanhã, às 10h? Vou apresentar a nossa visão às 15h na reunião de diretoria”. Conhecendo a situação, o colaborador valoriza sua tarefa, entende a importância de executá-la com precisão e se sente valorizado ao contribuir com um movimento tão importante para a empresa.
Temos o costume de culpar o tempo para “otimizar” as ações. A alegação de que “não tenho tempo para contextualizar o time sobre cada atividade” é bastante comum. Mas você já refletiu sobre o tempo que gasta explicando diversas vezes a mesma coisa? Ou corrigindo algo que não foi feito como deveria? É necessário mudar o mindset e incorporar o porquê no dia a dia. Você nunca perde tempo dando uma informação completa.
Para promover uma mudança efetiva na comunicação com a equipe sugiro seguir cinco passos:
O primeiro é sempre fazer uma Comunicação Significativa, ou seja, dar significado ao que precisa ser feito. Uma analogia que uso para exemplificar é a seguinte: três pedreiros estão trabalhando na mesma coisa e uma pessoa passa e pergunta a cada um o que está fazendo. O primeiro diz que está empilhando tijolos, o segundo que está erguendo uma parede e o terceiro que está edificando uma igreja.
Por isso, quando for pedir algo comece pelo porquê. Sensibilize o colaborador contextualizando o cenário macro, envolva-o emocionalmente na ação. Assim, ele ficará mais predisposto a fazer o que você solicitar a seguir e, o melhor, se dedicará com mais afinco na execução.
O segundo passo é dizer claramente o que você espera da pessoa. Sim, a ordem é fundamental. Sensibilizar primeiro e pedir depois. Se o pedido for feito antes de compartilhar o cenário a primeira resistência já foi criada. Um ponto importante é deixar claro o resultado esperado e não apenas a tarefa que precisa ser feita para chegar até ele. Seja claro, direto e compartilhe a responsabilidade sobre a entrega final.
O terceiro passo é esclarecer todos os pontos antes do início. Tem algum critério específico a ser seguido? Existem regras diferentes? Se tiver algum procedimento que precisa ser observado com atenção deixe claro desde o princípio. Esses são itens fundamentais para estabelecer a margem de autonomia do colaborador, definindo os parâmetros e incentivando que ele faça sua autogestão.
O quarto passo é o prazo. Quando ele deve começar e quando precisa entregar, assim o profissional pode programar a tarefa dentro da sua rotina.
O quinto e último passo deve ser realizado somente se necessário, pois depende do tipo de tarefa que foi solicitada e do nível de maturidade do colaborador. Normalmente, é necessário para demandas complexas, que nunca tenham sido realizadas ou se a pessoa é nova naquela atividade. É o como fazer, explicando em detalhes a execução.
Normalmente, os gestores falam sobre o como e o prazo, sem passar pelos demais. E, assim, inevitavelmente gastam mais tempo no durante e no depois, já que o profissional tem a informação incompleta. Por isso, sugiro uma reflexão sobre seus últimos pedidos, como você começou? Quais informações compartilhou? Qual foi o resultado?
Começar pelo porquê é uma questão de hábito. Não é uma coisa natural, mas pode vir a ser, é um exercício diário. Ao adotar a comunicação significativa envolva o seu time. Explique o que pretende e convide-os para participar. Peça para avisá-lo caso não tenham entendido o contexto, se faltar alguma informação e dê liberdade para questioná-lo.
É importante lembrar que a comunicação do porquê deve ter o mesmo significado para todos. Não adianta a diretoria da empresa discutir a estratégia macro e apenas os escalões mais altos a entenderem. Os demais níveis hierárquicos, inclusive os que estão na “base da pirâmide”, também devem ser sensibilizados e entender sua importância no resultado a ser alcançado.
Das cinco etapas listadas, quatro devem fazer parte da rotina de um gestor, mas apenas uma é da natureza do líder: o porquê. Faz parte da capacidade de envolver os colaboradores, de ser respeitoso e compartilhar o cenário completo. Precisamos conectar as ações para que façam sentido e que todos saibam a importância de suas atividades para atingir o objetivo do grupo. O gestor consegue que as pessoas façam o que precisa de feito. O líder faz com que as pessoas queiram fazer. O propósito não deve ser apenas uma frase no site da companhia, mas sim genuíno. Compartilhando o porquê todos sentem-se parte e trabalham com vontade para conquistarem juntos as metas estabelecidas.
Martinelli é consultor com mais de 30 anos de experiência no desenvolvimento de líderes em renomadas empresas. Gestor de pessoas desde os 23 anos, é reconhecido por ser “cirúrgico” em seus diagnósticos e pela sua fala assertiva e estratégica. Com diversas especializações na área da Psicologia Social, é coautor do livro Team & Leader Coaching, possui Certificado no Global Leadership for the 21st Century Program, pela Universidade de Saybrook (Seattle).