Por Anna Maria Buccino, Administradora de empresas, consultora, especialista em Psicologia Positiva, atua como responsável pelas áreas de prestação de serviços e varejo na Vetor Editora
Que o mundo vinha avançando freneticamente, a maioria das pessoas e organizações não tinham dúvidas. Há muito falava-se sobre mentalidade ágil, mudança, transformação digital, inovações tecnológicas, transformação da realidade, inteligência artificial. Além disso, mundo volátil, incerto, complexo, ambíguo, também estavam em evidência e, quem não acompanhasse esse ritmo estaria fora da realidade e ficaria para trás. Muito era dito, mas a prática ainda ficava a desejar. Mas, de repente, lembrando um momento do filme “Matrix” ¹, fomos obrigados a tomar a pílula vermelha e encarar a realidade de nós mesmos, de nossos relacionamentos, de nosso propósito na sociedade. Tudo ficou escancarado!
Tivemos que entrar com tudo na realidade do mundo frágil, ansioso, não linear e incompreensível, o chamado mundo BANI (terminologia criada pelo antropólogo Jamais Cascio, para designar o momento atual da sociedade, após o início da pandemia – acrônimo inglês Brittle, Anxious, Non-linear, Incompreensible), encarando nossas vulnerabilidades, enfrentando desafios não imaginados ou previstos com clareza.
Num piscar de olhos, quem vivia sozinho e tinha no trabalho, nos passeios, nas compras, uma maneira de fugir de si mesmo, se viu às voltas de lidar consigo. Ouvir suas vozes interiores, aprender a se enxergar. O mundo passou a ser você com você mesmo. Sem ter a quem culpar, a quem reclamar. Era o momento de viver e existir de verdade.
Os seres humanos, em grande parte, se deram conta de que essa nova realidade é agora, e iniciaram uma quebra de preconceitos e paradigmas em assuntos de extrema importância como autoconhecimento, saúde mental, terapia, despertar de consciência. Se abriram para um processo de entendimento sobre qual seu papel na sociedade, de como viver nessa nova realidade, de lidar com as angústias da existência, de encarar o medo desse novo mundo. As pessoas se abriram para a psicologia, eliminando preconceitos e permitindo um conhecimento mais profundo de si mesmas.
E, da mesma maneira que as pessoas tiveram que se analisar, as organizações também passaram a viver essa realidade, a ter que lidar com esse conflito a também procurarem responder perguntas como: “quem somos nós como organização?”, “por que existimos?”, “qual é o propósito de nossa organização?”, “que diferença queremos fazer no mundo?”. Serviços como diagnóstico organizacional, mapeamento de atenção, monitoramento de saúde mental, projetos de clima organizacional, mapeamento de estresse, employee experience, stakeholders experience, team building, avaliação psicológica, mapeamento de perfil motivacional, tornaram-se recorrentes para as empresas que entenderam estar em uma nova realidade.
Chegou o momento de as empresas olharem para dentro, de realizarem um trabalho de autoconhecimento organizacional, de reverem estratégias, entenderem a importância de um propósito verdadeiro, de se alinharem à pauta ESG, se inspirarem pelos ODS (Objetivos globais para o desenvolvimento sustentável). O momento de entenderem a importância de um ambiente diverso, de criarem espaço de clareza e conexão com todos os seus stakeholders. Chegou o momento de reverem seus conceitos, sua maneira de atuação ao preço de correrem o risco de extinção.
Sair do olhar concreto para o subjetivo se faz necessário. Temas como felicidade, psicologia positiva, saúde mental, empatia, comunicação não violenta, qualidade de vida, cultura organizacional, propósito, avaliação psicossocial, segurança psicológica, visão sistêmica, mindfulness, criatividade, se tornaram recorrentes e passaram a ter uma atenção maior.
Tornou-se necessário romper o ciclo. O medo do desconhecido se tornou menos intenso do que viver uma situação perigosa que poderia levar ao risco de deixar de existir. Pessoas e organizações precisaram trabalhar o desapego a velhas ideias que não levam mais a nenhum lugar e aceitar a necessidade de transformação. Por isso, o chamado lifelong learning, onde o aprendizado é uma constante dentro das organizações se tornou tão importante, levando a organização a aprender e ensinar seus colaboradores, que aprendem e ensinam seus pares e clientes, que também aprendem e ensinam, criando um ciclo de aprendizagem e melhoria em toda a cadeia da qual a empresa faz parte. Um ciclo de melhoria e evolução contínua, transformando as relações, agindo como uma sociedade colaborativa que procura construir algo significativo para o todo.
Mais do que nunca, o pensamento e a atitude criativa são demandados deixando de serem reservados a meia dúzia de pessoas e passando a serem debatidos, desenvolvidos e explorados por todos. Chegou a hora de falar sobre inovação abertamente. Não somente a inovação no sentido tecnológico, mas a inovação de nós mesmos como pessoas, como organização e como sociedade.
Agora é a hora de nos conscientizarmos de quem realmente somos como pessoas, como organizações, como sociedade; de tocarmos em nossas feridas, assumirmos nossa responsabilidade, identificarmos e potencializarmos nossos talentos, abraçarmos nossas sombras. É a hora de aprendermos, desaprendermos e reaprendermos. Agora é a hora de nos reinventarmos!