Com o aumento dos afastamentos do trabalho por doenças mentais e o reconhecimento da síndrome de burnout como patologia ocupacional, pela OMS, a tendência é de valorização de programas corporativos que incluam apoio na questão
A ocorrência de atestados médicos por doenças mentais vem aumentando nas empresas brasileiras, principalmente após a pandemia. É o que mostram pesquisas como a da Closecare – plataforma digital voltada para a gestão de atestados médicos e da saúde corporativa – que avaliou 480 mil atestados médicos de 16 companhias que utilizaram seu serviço, entre janeiro de 2020 e abril de 2022, apontando um crescimento de 30% no afastamento de profissionais do trabalho por transtornos mentais e comportamentais (categoria F da Classificação Internacional de Doenças/CID-10).
De acordo com esse levantamento, as ocorrências são mais comuns nos setores de serviços, varejo, advocacia, tecnologia e em multinacionais, que pagam melhores salários, com atividades que exigem fisicamente menos, porém com situações de pressão que impactam o emocional e o mental, gerando mais estresse.
Há dois anos, o Informe da Previdência Social (12/2020 – Vol. 32 – nº 12) também já reforçava essa realidade, mostrando que os transtornos mentais e comportamentais foram a terceira maior causa de afastamento do trabalho, entre 2007 e 2020, período em foram registradas 2,717 milhões de licenças médicas. O mesmo levantamento apontou um recorde na concessão de auxílio-doença em 2020 – mais de 285 mil no ano, um crescimento de 33,8% em relação a 2019. As previsões são de que esta seja a principal causa de afastamentos do trabalho até 2030.
Solução passa pela gestão da saúde nas empresas
Para a head de Benefícios da corretora Finlândia, Fernanda Nehlaoui Machado – especialista em planos de saúde, odontológicos e seguros de vida, com mais de 20 anos de atuação no segmento de saúde suplementar – a questão mental tem sido cada vez mais priorizada pelas empresas e, acompanhando essas transformações, as operadoras têm adequado e disponibilizado planos empresariais que abrangem a prevenção e o tratamento dessas doenças, atendendo melhor as demandas do mercado e dos trabalhadores. “A gestão dos benefícios nas empresas é uma atividade continua aqui na Finlândia e nas operadoras e incluem ações que visam o equilíbrio psicológico. Isso porque esses distúrbios afetam a saúde física e dificultam o tratamento de outras comorbidades”, diz.
Ela detalha que, além de oferecerem planos com serviços que visam a prevenção e o tratamento de doenças mentais, os gestores de pessoas e de RH são orientados sobre a importância de possuírem programas próprios que cuidem da infraestrutura física e recursos para execução das tarefas profissionais – principalmente nos casos de trabalho híbrido (home office e presencial) – além de iniciativas como incentivo à atividade física (por ser muito importante para o equilíbrio psicológico), pesquisas internas, convênios, planos de saúde e ações de relacionamento que permitam o monitoramento e manutenção do bem-estar dos empregados.
“Os planos de saúde empresariais oferecem uma ampla cobertura para a prevenção e o tratamento desses tipos de enfermidades – entre as quais destacam-se depressão, ansiedade, síndrome de burnout, crise de pânico e compulsão alimentar”, detalha Fernanda. Ela cita que os programas de saúde mental incluem conteúdos e palestras sobre o tema, “escuta ativa” para identificação e acolhimento, orientação sobre o uso correto dos benefícios, atendimentos presenciais e on-line com psicólogos, psiquiatras, nutricionistas, entre outras especialidades que complementam esses tratamentos. “São serviços cada vez demandados nos ambientes corporativos, que resguardam as empresas, suas equipes e a produtividade”, enfatiza a especialista.
É o que mostrou a Pesquisa Quantitativa da Saúde Suplementar na indústria brasileira (novembro/2020), da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e do Serviço Social da Indústria (Sesi). O levantamento mapeou os principais impactos da pandemia nos planos de saúde do setor industrial, por meio de uma amostra de 200 organizações (110 pequenas, 50 médias e 40 grandes). Entre os principais resultados está o reconhecimento, por 65% desse contingente analisado, de que o cuidado com a saúde mental dos trabalhadores é uma necessidade e deve ser intensificada.
O estudo também aponta que a ampliação e a melhoria contínua dos programas de apoio e prevenção à saúde são uma tendência para os próximos anos, embora 54% das indústrias ainda não possuam iniciativas do tipo, hoje mais comuns nas companhias de grande porte. Por outro lado, 54% das organizações pesquisadas possuem programas do tipo, sendo 30% próprios, 18% prestados em conjunto com as operadoras de saúde e, 6%, oferecidos exclusivamente por meio de planos de saúde empresariais. Entre as linhas de cuidado adotadas estão a saúde mental/depressão (em 69% dessas empresas), o estímulo à atividade física (em 78%) e o gerenciamento de estresse (em 63%). Além disso, 24% disponibiliza teleatendimento psicológico para empregados.
Trabalhadores brasileiros querem mais qualidade de vida
É também notório que as pessoas buscam, cada vez mais, trabalhar em empresas que cuidam da saúde mental e do bem-estar de seus profissionais. “Não é raro ver trabalhadores trocando de empregos, com salários menores, para ter mais qualidade de vida. E não foi por acaso que a síndrome de burnout passou a ser considerada doença ocupacional pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em janeiro”, pontua Fernanda.
Uma outra pesquisa, a Global Learner Survey, da Pearson (um dos maiores grupos de comunicação do mundo), reforça a percepção da head de Benefícios da Finlândia. Ela mostra que os brasileiros estão mais preocupados com as questões de saúde mental e bem-estar e cobram por iniciativas das empresas neste âmbito. O levantamento entrevistou 1001 brasileiros, de 16 a 74 anos, em abril, e também foi promovida em países como EUA, Inglaterra, China e Índia, ouvindo mais de 8.000 pessoas no mundo.
O estudo aponta que, para 71% dos entrevistados brasileiros, as empresas devem disponibilizar serviços gratuitos para garantir a saúde mental de seus empregados. Já para 65% dessas pessoas, a cobertura dos planos empresariais deve incluir serviços e atendimentos psicológicos, sendo que 92% afirma priorizar, na busca por novos empregos, companhias que ofereçam iniciativas que visam o cuidado com a saúde mental e bem-estar dos colaboradores. “Essa visão é uma tendência. Os trabalhadores vêm consolidando o entendimento de que as empresas têm responsabilidades sobre sua saúde mental”, afirma Fernanda.
NÚMEROS
Depressão em Beneficiários de Planos de Saúde em 2019
A prevalência de depressão saltou de 8,6% (2013) para 12,7% (2019)
Esse percentual representa mais de 5,5 milhões de beneficiários
15,4% atua no setor público
8,9% trabalha no setor privado
Fonte: Instituto de Estudos de Saúde Complementar (TD84 – Depressão em Beneficiários de Planos de Saúde/setembro 2021) – Pesquisa Nacional de Saúde 2019 (divulgada em 2020)
O custo das doenças mentais nas empresas brasileiras
R$ 1.293 é o custo médio estimado para cada atestado
R$ 5 bilhões é a previsão dos gastos globais até o fim de 2022
6 dias é o tempo médio das licenças médicas por doenças mentais
Ele é 128% maior do que nas licenças por outras enfermidades
Fonte: Closecare (2022)