A necessidade de um equilíbrio dinâmico entre vida profissional e pessoal.
Colunista Mundo RH, Lilian Giorgi, sócia-diretora de recursos humanos na A&M
O equilíbrio entre vida profissional e pessoal (work-life balance) é um tema recorrente no mundo corporativo e, ao longo dos anos, tem sido tratado como uma meta a ser alcançada de forma estática e idealizada. Contudo, ao olharmos mais de perto, percebemos que essa “equação” é muito mais fluida e dinâmica, refletindo as mudanças constantes nas relações entre o trabalho, o lazer e o bem-estar pessoal. E a principal questão não está em um equilíbrio fixo, mas em como calibrar as trocas e os estímulos entre essas esferas.
Tradicionalmente, a discussão sobre o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal recai sobre os custos do ajuste, em que as empresas tendem a exigir mais produtividade e, em contrapartida, oferecem espaços de descanso que muitas vezes não são suficientes para uma recuperação real e eficaz. Contudo, o que muitas vezes se ignora é que esse modelo de equilíbrio, baseado em tempos e espaços fixos, já não atende mais às exigências de uma economia que se transformou.
O problema, portanto, não está em encontrar o “equilíbrio ideal”, mas em entender o movimento constante entre as duas esferas da vida, considerando o momento específico que cada pessoa atravessa. A experiência individual de cada um pode variar e, portanto, exige repactuações e ajustes frequentes, especialmente à medida que as necessidades mudam com o tempo.
Quando iniciamos nossas carreiras, a busca pelo equilíbrio pode ser confundida com a busca por refúgio. Muitos de nós nos sentimos atraídos pelo trabalho não apenas como uma fonte de sustento, mas também como um espaço de proteção contra as angústias e dissabores da vida pessoal. É um misto de prazer, sentido de utilidade e pertencimento, mas também de fuga de problemas pessoais que, em muitos momentos, parecem difíceis de enfrentar.
No meu caso, a “conta” do equilíbrio nunca foi feita inicialmente. O trabalho, para mim, oferecia uma sensação de segurança e um propósito claro, distantes dos desafios da esfera particular. Mas, com o tempo, os medos mudaram. As angústias, que antes pediam fuga, agora clamam por reflexão. E essa transição demanda um novo tipo de equilíbrio — não mais entre esferas fixas, mas entre o fazer econômico e o pensamento livre sobre os sentidos e significados da existência.
O ponto central dessa reflexão é entender que a equação do trabalho e da vida pessoal não pode ser vista apenas sob a ótica do “ajuste ideal”. Ela precisa ser recalibrada constantemente, à medida que as circunstâncias e as exigências da vida mudam. A troca de estímulos entre essas duas dimensões deve ser mais frequente, mais dinâmica, e as pausas precisam refletir um novo tipo de tempo.
A analogia com os modelos de gestão de projetos — os tradicionais e os ágeis — é pertinente aqui. Os modelos tradicionais de descanso, como as férias anuais ou os finais de semana prolongados, já não são mais suficientes para oferecer uma recuperação real e eficaz. A economia atual exige que repensemos a forma como gerenciamos nosso tempo, levando em conta a aceleração das demandas e a rapidez das transformações no mercado.
Estamos em um momento em que a corrida não é mais apenas sobre “distância” ou “tempo”, mas sobre a velocidade e a constante adaptação. No entanto, as empresas e os profissionais ainda operam com modelos antiquados, com “técnicas e táticas” que não são compatíveis com as exigências atuais. Nesse contexto, não há recuperação genuína, mas apenas sistemas obsoletos que desgastam os recursos humanos, tanto físicos quanto emocionais.
O modelo de equilíbrio idealizado precisa ser abandonado em favor de uma abordagem mais ágil e fluida, que permita uma troca constante de estímulos entre trabalho e vida pessoal. Esse equilíbrio não deve ser alcançado por meio de um “modelo único”, mas sim por meio de ajustes contínuos que levem em consideração o bem-estar das pessoas, a flexibilidade das organizações e a necessidade de reflexão constante.
Revisitar a questão do equilíbrio entre vida profissional e pessoal não significa mais tentar encontrar uma fórmula estática e fechada. Ao contrário, é necessário aceitar que, com a evolução das condições de trabalho e as necessidades individuais, o equilíbrio se torna um processo contínuo de adaptação e de ajustes. A forma como gerenciamos nossas carreiras, nossos momentos de lazer e as nossas pausas, precisa refletir a velocidade e a complexidade da vida moderna.
A verdadeira questão, portanto, não é encontrar um equilíbrio estático, mas sim cultivar um espaço onde seja possível refletir sobre o que importa e recalibrar constantemente as trocas entre os diversos aspectos da nossa vida. Isso exige mais do que uma mudança de mentalidade — exige uma reconfiguração do tempo, das pausas e dos próprios ritmos de trabalho. Um fluxo dinâmico que reflete as necessidades e demandas atuais.