A geração Z desafia o mercado de trabalho, buscando conciliar boa remuneração, propósito e impacto social, e impulsiona transformações nas empresas em todo o mundo.
A geração Z está mudando as regras do mercado de trabalho. Diferente das gerações anteriores, que muitas vezes se viam forçadas a escolher entre uma carreira bem remunerada, satisfação pessoal ou impacto social, os jovens de hoje querem tudo ao mesmo tempo. O conceito do “e”, em vez do “ou”, está no centro das expectativas profissionais dessa geração, e as empresas estão sendo forçadas a se adaptar para atrair e reter esses novos talentos.
A Associação Brasileira de Recursos Humanos de São Paulo (ABRH-SP) destaca que os jovens profissionais, em especial aqueles da geração Z, buscam uma combinação entre boa remuneração, realização pessoal e um impacto positivo na sociedade. Segundo Luiz Eduardo Drouet, presidente da ABRH-SP, essa nova abordagem tem provocado uma transformação profunda no ambiente corporativo. “Quero ter uma boa remuneração, e fazer o que gosto, e gerar um impacto positivo”, afirma Drouet, reforçando que essa demanda é uma das principais mudanças trazidas por essa geração.
A Era do “E”: carreira, propósito e impacto
As novas gerações estão afastando a antiga ideia de que era necessário escolher entre um bom salário, fazer o que se ama ou gerar impacto social. Segundo uma pesquisa realizada pela Deloitte Global 2023 Gen Z and Millennial Survey, mais de 46% dos jovens da geração Z colocam o propósito no centro de suas decisões profissionais, e 60% afirmam que preferem trabalhar em empresas que compartilham seus valores. A pesquisa também mostra que 57% dos jovens consideram deixar seus empregos em busca de algo que esteja mais alinhado com seus propósitos de vida.
Esse desejo de “tudo ao mesmo tempo” está moldando a forma como as empresas recrutam e gerenciam seus funcionários. O modelo de trabalho tradicional, baseado em benefícios limitados e estruturas rígidas, já não atende às expectativas dessa geração. O movimento conhecido como “CLT Premium”, em que as empresas oferecem pacotes de benefícios diferenciados, como horários flexíveis, programas de bem-estar e oportunidades de desenvolvimento, é um reflexo dessa nova demanda.
A flexibilidade como pilar fundamental
A busca pela flexibilidade no trabalho é outro ponto-chave para a geração Z. Segundo um estudo da McKinsey & Company, 80% dos jovens entrevistados afirmam que a flexibilidade no local e nos horários de trabalho é um fator essencial na escolha de um emprego. O estudo aponta que as empresas que não oferecem flexibilidade correm o risco de perder seus melhores talentos para organizações mais inovadoras e adaptáveis.
A pandemia de COVID-19 acelerou essa transformação, com o trabalho remoto e híbrido tornando-se não apenas possíveis, mas desejáveis. A geração Z vê no modelo híbrido uma forma de equilibrar sua vida profissional com a pessoal, o que, para muitos, é uma condição essencial para alcançar a satisfação no trabalho. Empresas como Google e Meta, por exemplo, têm ajustado suas políticas para oferecer opções de trabalho flexíveis, refletindo essa mudança nas expectativas dos colaboradores.
O papel do propósito nas decisões profissionais
A ideia de “fazer o que ama” tem se tornado central para a geração Z, mas com uma visão mais ampla e realista. Para muitos jovens, não se trata apenas de encontrar a “carreira dos sonhos”, mas sim de criar significado em suas atividades diárias. Drouet enfatiza que esse processo de amadurecimento envolve um esforço contínuo para gerar sentido naquilo que se faz. “Nem sempre vamos fazer apenas o que amamos; é preciso criar significado ao longo do tempo e entender que a realização plena é uma construção”, ressalta o presidente da ABRH-SP.
Nesse sentido, a geração Z tem mostrado uma preocupação cada vez maior com questões como sustentabilidade, diversidade e inclusão. De acordo com um estudo da LinkedIn Workplace Culture Trends 2023, 76% dos jovens afirmam que consideram a cultura da empresa, incluindo seus valores éticos e práticas sustentáveis, como um fator decisivo na escolha de onde trabalhar. Esses dados indicam que as empresas que se posicionam de maneira clara em relação a esses temas têm uma vantagem competitiva na atração de talentos.
“Juventudes Potentes” e a inclusão no mercado de trabalho
Outro desafio enfrentado pela geração Z é o ingresso no mercado de trabalho, especialmente para aqueles que se encontram em situações de vulnerabilidade social. A ABRH-SP chama atenção para a importância de iniciativas como o movimento “Juventudes Potentes”, que busca criar oportunidades para jovens sem acesso a educação ou empregos de qualidade.
Drouet destaca que muitos jovens, antes classificados como “nem-nems” — aqueles que nem estudam, nem trabalham —, agora estão sendo reconhecidos como “sem-sems”, sem estudo e sem oportunidade. Esse cenário desafia as empresas a adotarem posturas mais inclusivas e a criarem programas de desenvolvimento voltados para esse público, oferecendo chances reais de crescimento e aprendizado.
Empresas que investem em programas de inclusão e desenvolvimento têm visto resultados positivos. A Microsoft, por exemplo, implementou um programa global de inclusão de jovens em situação de vulnerabilidade, que oferece capacitação em tecnologia e coloca esses jovens no caminho de uma carreira promissora. No Brasil, a Ambev e o Itaú Unibanco também são exemplos de empresas que desenvolveram programas focados em jovens talentos de comunidades carentes, resultando em uma força de trabalho mais diversa e engajada.
Desconstruindo mitos: Geração Z não é “mimada”
Há uma percepção equivocada de que a geração Z é “mimada” por buscar propósito, flexibilidade e boa remuneração ao mesmo tempo. No entanto, especialistas e pesquisas sugerem que essa geração está mais consciente de suas escolhas e de seus valores. Segundo o relatório Millennial Survey 2023 da Deloitte, a geração Z está mais disposta a sacrificar salários altos em troca de empregos que ofereçam qualidade de vida e uma cultura organizacional saudável.
O desafio para as empresas, portanto, é entender essa nova mentalidade e adaptar suas estruturas para atender a essas expectativas, sem perder de vista a eficiência e a lucratividade. Com a crescente demanda por equilíbrio entre trabalho e vida pessoal, propósito e impacto, o mercado de trabalho se vê diante de uma transformação inevitável, e as empresas que não se adaptarem correm o risco de ficarem para trás.
O futuro do trabalho: flexibilidade e propósito não são opcionais
O movimento da geração Z em busca do “e” — de conciliar boa remuneração, satisfação pessoal e impacto social — está forçando uma reconfiguração das estruturas corporativas. Empresas que adotam modelos de trabalho flexíveis, oferecem propósito em suas missões e criam uma cultura inclusiva e sustentável estão na vanguarda da atração de talentos.
Segundo uma pesquisa do World Economic Forum, 65% dos empregos da próxima década ainda não foram criados, e essa realidade será moldada pelas expectativas e demandas das novas gerações. Para que as empresas permaneçam competitivas, será necessário não apenas oferecer pacotes atrativos, mas também garantir que seus valores estejam alinhados às necessidades desses novos profissionais.
O caminho para o futuro do trabalho está claro: flexibilidade, propósito e impacto não são mais condições opcionais, mas fundamentais para atrair, reter e desenvolver talentos em um mercado de trabalho cada vez mais dinâmico e exigente.
A geração Z está reescrevendo as regras do mercado de trabalho. Com uma visão clara do que esperam de suas carreiras, esses jovens exigem mais do que boas condições financeiras: querem flexibilidade, propósito e a oportunidade de gerar impacto positivo no mundo. As empresas que conseguirem entender essa nova mentalidade e se adaptarem a ela estarão bem posicionadas para liderar a próxima era do trabalho.