A necessidade de atender a metas rigorosas em um ambiente de mudanças constantes pode ter aumentado a pressão sobre os colaboradores, levando a níveis mais elevados de ansiedade
Por Ivan Cruz , cofundador da Mereo, HR Tech
Você sabia que a população brasileira é a mais ansiosa do mundo? Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) apontam que 9,3% das pessoas possuem esse sentimento, caracterizado pela preocupação, pelo nervosismo e pelo medo intenso. Há, também, o alerta que um em cada quatro indivíduos no país sofrerá com algum transtorno mental ao longo da vida. Números como estes acendem um alerta vermelho nas famílias e também nas empresas, já que o trabalho amplifica questões amplas que afetam a saúde mental.
No ano passado, uma pesquisa realizada pela Mereo junto a 42 companhias mostrou que, mesmo após o fim da epidemia da Covid-19, o nível de ansiedade seguiu em patamares pandêmicos nas organizações – os dados foram coletados até agosto de 2023. Denominada Pulse Saúde Mental, o levantamento analisou mais de 2,8 mil comentários de colaboradores, entre 2020 e 2023. O levantamento foi construído com base no questionário DASS-21 (em tradução livre, escala de depressão, ansiedade e estresse), porém foram selecionadas apenas questões relacionadas ao estresse e à ansiedade, e teve como objetivo monitorar e acompanhar o nível delas em caráter informativo, e não diagnóstico médico. Os participantes respondiam à uma escala de frequência dos sentimentos, que ia de ansiedade normal a extremamente severa.
Os períodos de maior ansiedade nas empresas ocorreram em 1º) maio de 2020, 2º) outubro de 2021 e 3º) nos meses de fevereiro, julho e agosto de 2023. As variações nas taxas entre os colaboradores podem ser influenciadas por uma série de fatores, entre elas 1) o impacto da pandemia e o isolamento social, 2) a retomada da normalidade, porém envolta em incertezas, e 3) a pressão por desempenho e produtividade, em razão da instabilidade econômico e financeira dos últimos anos. A necessidade de atender a metas rigorosas em um ambiente de mudanças constantes pode ter aumentado a pressão sobre os colaboradores, levando a níveis mais elevados de ansiedade. “Nos últimos 7 dias, senti medo sem motivo” e “Nos últimos 7 dias, senti minha boca seca” foram as afirmações que obtiveram as médias mais altas de respostas.
Média do nível de ansiedade
A ansiedade nos colaboradores pode ser influenciada por uma série de fatores, e os anos de 2020 e 2023, provavelmente, apresentaram maiores taxas de ansiedade moderada devido a uma combinação de eventos e circunstâncias. Em 2020, foi o início da pandemia, que resultou em mudanças significativas nas rotinas de trabalho, preocupações com a saúde, incertezas econômicas e isolamento social. As medidas de quarentena, as restrições de viagens e a adaptação ao trabalho remoto podem ter levado a um aumento generalizado dos níveis de ansiedade. Já no decorrer de 2023, ocorreram movimentações significativas no mercado de trabalho, impulsionadas por desafios relacionados às novas tecnologias e permeadas por uma sensação de apreensão devido à volatilidade que o cenário profissional estava apresentando.
Diretrizes globais da OMS sobre saúde mental no trabalho recomendam ações para enfrentar rotinas insalubres, como cargas de trabalho pesadas, comportamentos negativos e outros fatores que criam angústia no trabalho. Elas são fundamentais, já que estima-se que 12 bilhões de dias de trabalho são perdidos anualmente devido à depressão e à ansiedade, o que custa à economia global quase um trilhão de dólares. O relatório da OMS, de 2022, pela primeira vez recomendou o treinamento de gerentes, para capacitá-los a responder aos trabalhadores e às trabalhadoras em perigo e evitar a construção de ambientes de trabalho estressantes.
Diretrizes assim são fundamentais, pois ajudam a dar um norte para as organizações em uma questão tão ampla e complexa. É essencial que o setor de Gente e Gestão esteja preparado para acolher colaboradores com questões ligadas à saúde mental. E isso se faz como? Não há fórmula fácil nem pronta, mas entre os caminhos possíveis está a reserva de orçamento para ações de qualidade de vida e bem-estar dos colaboradores; a realização de mapeamentos regulares, com pesquisas de clima, por exemplo; a construção de ações de promoção de saúde; o investimento em ambientes saudáveis; e a capacitação de lideranças para uma abordagem mais humanizada. O caminho é longo, mas uma coisa é certa: um trabalhador com saúde física e mental, além de poder trazer bons resultados, também pode contribuir para o bom clima organizacional. Todo mundo ganha.