Ainda há líderes que gritam, humilham ou ridicularizam o funcionário?
Tem o líder que fala demais. Sou um deles. Como um adicto, sei que sou, mas estou em recuperação, tentando “não fazer, só por hoje”. É muito tentador, para o líder que se acha genial, fazer com que as pessoas ouçam suas palavras tão sábias por horas. É muito difícil, para o líder que pretende ser servidor, resumir orientações, pois eles podem não ter entendido! É muito prazeroso, para o líder vaidoso, ouvir a própria voz. Queria dizer que sou o segundo, mas a verdade é que sou um pouco dos três, infelizmente.
Daniel Kahneman, aquele psicólogo que ganhou um Nobel de Economia, diz que normalmente somos mais seguros de nossas verdades do que deveríamos ser, pois cristalizamos nossas opiniões rápido demais. E é justamente quando nos mostramos tão experientes e cheios de verdade, que ninguém nos ouve. Ainda pior quando estamos irados e resolvemos falar sem filtro. Sim, ainda há líderes (líderes?) que gritam, humilham ou ridicularizam o funcionário; que são bélicos com todos e por tudo, em um exercício egóico que só termina quando são demitidos (sempre injustamente, segundo eles, pois são tão geniais) ou ficam doentes por conta do maio vilão, o stress – ficam doentes muitas vezes por não encararem a vida com mais leveza. Graças a Deus, esse eu não sou.
Sêneca já dizia que o melhor remédio para a fúria é o adiamento, o tempo.
Mas entre os líderes fracos silenciosos que ficam em cima do muro e os gênios agressivos, deve haver o caminho do meio – que é meu caminho preferido, apesar de nem sempre encontrá-lo, por ele ser o mais escondido e íngreme.
Os monges budistas ensinam a praticar a escuta compassiva. Aquele exercício de realmente só ouvir com atenção, sem ter necessariamente de dizer nada sábio. Quando não nos sentimos obrigados a dizer algo genial, quem sabe escutamos o que o outro tem a dizer. Santa Teresa D´Ávila também pedia a Deus para não envelhecer ocupando os ouvidos das pessoas com relatos detalhados sobre tudo, especialmente com reclamações.
Que ousadia misturar aprendizados de um monge budista e uma santa católica, para aprender a hora de ouvir e de falar, de silenciar e de se posicionar. Talvez a sabedoria esteja em algum lugar desta mistura, na diversidade.
O bom líder pode dizer mais vezes: “não sei decidir sozinho e por isso quero ouvir a todos para decidirmos juntos ao final da conversa, já que o assunto é complicado”. Isso é digno, é honesto, é humano. Bem difícil para quem se sente pressionado a dar a “melhor resposta” e não entende que o oposto do conhecimento não é a ignorância, é a busca. Quando o líder se mostra como aquele que também busca, todos se conectam, se juntam pela causa. E a “melhor resposta” é a mistura do que todos falaram, do que foi ouvido, e dos silêncios.
Como disse o dramaturgo francês Victor Hugo: as palavras têm a leveza do vento e a força da tempestade. Nós, líderes, não podemos mais ajudar a criar as tempestades só para depois nos sentirmos heróis ao juntar os escombros.
Precisamos compreender e nos apaixonar pela causa, identificando novas causas – sem ficarmos eternamente mergulhados nas tarefinhas do dia a dia, que nos fazem sentir tão úteis – mas nos tornam tão irrelevantes para a empresa e para as pessoas.
Precisamos compreender e nos apaixonar por gente, sem ficarmos eternamente mergulhados nos julgamentos do dia a dia, que nos fazem sentir melhores que os imperfeitos – e muito mais irrelevantes para a empresa e para as pessoas.
Devíamos errar, acertar, desaprender e reaprender – tudo na frente, tudo junto deles, do time. Só assim conseguimos um time de gente e não de super heróis que têm um enorme trabalho diário pra esconder de nós as suas falhas. Devíamos trabalhar para conquistar o mais difícil dos oxímoros: o silêncio que possibilita a eloquência, e a eloquência que possibilita a reflexão silenciosa.
Rosangela Souza é fundadora e sócia-diretora da Companhia de Idiomas e ProfCerto