Vi pessoas rezando, meditando, trabalhando, e acima de tudo, ajudando e servindo
Por Renata Rivetti, especialista em felicidade corporativa e liderança positiva
Em todas as minhas viagens busco respostas nas diferentes culturas para as minhas principais reflexões pessoais: Qual é o sentido da vida e como podemos ser mais felizes?
E claro, na viagem para o Butão não seria diferente. Ao chegar no país, pousando no meio do Himalaia você já sente algo, confirmei ali que estes dias seriam especiais.
Apesar de muito comentado, o Butão não é o país mais feliz do mundo, segundo o World Happiness Report. Mas, com certeza, é o país mais inspirador na sua atuação nos temas de felicidade e bem-estar. Na década de 70, o Rei Jigme Singye Wangchuck questionou o PIB como a melhor forma de medir o progresso do país sem levar em consideração indicadores de felicidade e bem-estar da população. Afinal, o que é o desenvolvimento econômico da sociedade sem desenvolvimento da nossa saúde emocional, bem-estar e felicidade? Talvez, mais do que nunca, essa questão seja realmente a chave para uma transformação da nossa sociedade.
Em 2008 inicia-se a democracia no Butão e a “Felicidade” entra como dever na Constituição do país. O governo precisa cuidar das pessoas, de seu bem-estar e felicidade.
E, além desta garantia constitucional, parece que o país é protegido de diversas formas. A primeira e mais óbvia, são os Himalaias protegendo as cidades, como se fossem pequenos reinos intocados em meio a tantas montanhas. Um país com menos de 800 mil habitantes espalhados por tanta terra preservada. Mas além disso, há também um cuidado em proteger a cultura, a história, a essência e talvez até uma certa ingenuidade. Parece que estamos em outro tempo e época, diferente do nosso caos tão conhecido. O ritmo é mais lento, as pessoas mais respeitosas e muito espiritualizadas. Como se ainda fosse possível preservar um mundo sem tantas influências negativas no estilo de vida das pessoas. Estão próximos da natureza, de todas as formas.
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E essa proteção e cuidado com sua cultura, história e pessoas, nos traz, aos poucos, o que talvez seja uma das forças do Butão: a crença de que de alguma forma está tudo bem, mesmo diante os desafios inevitáveis da vida. E fui ao longo da semana entendendo que para um mundo instável e disruptivo que vivemos, talvez essa seja a única forma de se viver a vida com saúde mental nos dias de hoje: aceitar a vida como ela é.
Tivemos uma aula com o Dr. Karma Phuntsho, um dos principais intelectuais do Butão e pesquisador associado do Departamento de Antropologia Social da Universidade de Cambridge. Dr. Karma nos contou que o butanês, em geral, não tem uma vida completamente estruturada e economicamente estável. E por mais que haja a priorização da felicidade da população, ainda há desafios para atender as necessidades básicas de toda a população.
Mas mesmo assim há sorrisos por todos os lados e muita beleza. Vi pessoas rezando, meditando, trabalhando, e acima de tudo, ajudando, servindo. Eles acreditam que podemos construir um mundo melhor, mas é preciso que todos tenham a responsabilidade de cuidar de todos os seres vivos e não somente de si. Como se eles soubessem que fazendo o bem para os outros, de alguma forma, receberão o bem também.
Pensei em quantas vezes nós agimos pensando somente em nós mesmos. E em quanta falta de consciência há em nós como sociedade. Me lembrei também que felicidade é simples. Tem a ver principalmente com uma vida com sentido, equilibrando essa vida com propósito com prazeres e alegria (que os butaneses encontram no seu esporte nacional: arco e flecha).
No final entendi que as respostas, como sempre, são simples. E refleti que essa felicidade do povo butanês pode vir de alguns fatores:
- Ter um Rei que garanta e priorize a felicidade da população traz a eles uma sensação de segurança. Mesmo que o Rei não consiga prover a necessidade básica de todos, há um sentimento de cuidado e proteção. E no Covid-19 isso ficou muito claro. Conseguiram conter a pandemia e tiveram pouquíssimas mortes (21 no total).
- Praticar uma religião em todo o país, como eles tem com o budismo, que é uma filosofia de vida, traz mais consciência para escolhas e hábitos diários. As pessoas acreditam que seus atos trazem consequências para sua vida. E por isso, eles se preocupam em como agem. Há raríssimos casos de violência e insegurança.
- Tradição, ritos, história e cultura traz união. Há respeito entre as pessoas. Há costumes que os unem, como danças, arco e flecha, espiritualidade, roupas. Parece uma vida mais simples, mas menos ansiogênica. Pelo menos por enquanto. Claro, que com a democracia, a internet e a globalização tudo isso não segue da mesma forma e provavelmente não seguirá. Mas esse é um futuro incerto, o momento atual ainda não apagou a preservação dos costumes tradicionais butaneses.
- Gentileza gera gentileza. Durante o Covid-19 alguns voluntários saiam na rua para alimentar os tantos cachorros que não tem lar ou abrigo. Eles cuidam, eles servem. E claro, isso gera um ciclo virtuoso.
Ainda não sei se já consegui refletir sobre tudo o que aprendi e vivenciei, mas sinto que foi transformador. Saí com minha fé no ser humano renovada e esperançosa de que podemos construir um mundo mais saudável e mais positivo para vivermos. Não será do dia para a noite, não será individualmente, mas de forma coletiva, consciente e transformadora. E se olharmos ao redor, por mais que falem que o mundo está piorando, eu acredito que está melhorando em vários aspectos. Os temas de bem-estar, felicidade e saúde mental, que antes eram simplesmente ignorados, vêm sendo ampliados e têm ganhado força mundialmente. Torcendo para que o Butão seja mesmo uma inspiração para todos nós!