Há pesquisas que mostram que, sem gastar tempo e energia no deslocamento para o trabalho, pessoas tendem a gerar mais produtividade para as companhias.
Por Rodrigo Vianna, CEO da Mappit e co-fundador do Talenses Group
Como headhunter, tenho acompanhado de perto os desencontros entre expectativas e realidades de candidatos e empregadores quando o assunto é modelo de trabalho presencial, híbrido ou 100% remoto. Essa ampla visão fez com que eu, realmente, tenha me colocado no lugar de alguém que entende que existem razões plausíveis por trás de cada decisão dos envolvidos no tema.
O que fazer então? Minha recomendação é que, antes de tomar decisões, candidatos e empregadores se disponham a fazer uma avaliação do cenário com a mente aberta, buscando entender a perspectiva do outro, sem esquecer que paradigmas seguem sendo quebrados e reconstruídos no mercado de trabalho. Na sequência, é fundamental fazer escolhas com base em valores.
Para auxiliar nessa reflexão, compartilho algumas considerações que costumam vir à minha mente sempre que me debruço sobre o tema modelos de trabalho:
1. Muitas empresas estão interessadas em voltar para o modelo presencial
Pelo menos entre os clientes do Talenses Group, poucos são os que estão operando de maneira 100% remota. De janeiro a outubro, das demandas de recrutamento e seleção que chegaram ao grupo, 21% eram para vagas presenciais, 72% para posições híbridas e apenas 7% para oportunidades totalmente remotas.
2. Algumas organizações devem continuar trabalhando de forma híbrida ou remota
Na pandemia, muitas empresas reduziram seus escritórios em busca de economia de custos e, agora, simplesmente, não dispõem de estrutura física para acomodar toda a equipe em um mesmo dia. Outras, por uma questão de cultura da companhia e/ou da liderança, nem querem fazer esse movimento. Há aquelas que investiram em ambientes de trabalho mais atrativos, com mais conforto e espaço de convivência, para estimular os profissionais a estarem fisicamente presentes na empresa.
3. Exigência por trabalho presencial vai além do microgerenciamento
Há pesquisas que mostram que, sem gastar tempo e energia no deslocamento para o trabalho, pessoas tendem a gerar mais produtividade para as companhias. Mas, também, há dados que indicam que o trabalho à distância dificulta o envolvimento dos colaboradores com a empresa e a construção de equipes mais alinhadas. A solidificação da cultura corporativa também tem sido um fator de preocupação da alta liderança, já que é algo que sempre foi construído de dentro para fora.
4. Não há ausência de candidatos para posições 100% presenciais
Não dá para negar que existem muitos candidatos resistindo a oportunidades de trabalho 100% presenciais, mas em uma porcentagem bem menor, se comparado ao período de término da pandemia. No meu trabalho como headhunter, essa realidade faz com que eu tenha menos candidatos para apresentar e processos seletivos um pouco mais demorados, mas, até o momento, aqui no Talenses Group, todas as vagas das nossas demandas, que exigiam trabalho presencial, foram preenchidas.
5. Aceitar um trabalho 100% presencial é (também) questão de vivência e experiência
É preciso considerar que temos no mercado uma geração que fez ou faz faculdade no modelo remoto ou híbrido e ingressou no primeiro emprego durante a pandemia, trabalhando à distância. Ou seja, são pessoas que não veem sentido no modelo 100% presencial porque nunca vivenciaram essa experiência. Para muitas, a última experiência diária desse tipo foi durante o ensino médio.
6. A recusa ao presencial não é (necessariamente) falta de comprometimento
Para profissionais de diferentes gerações, a questão não é, necessariamente, estar no escritório ou não. O desejo é trabalhar remotamente para não perder tempo e energia no deslocamento. Aquelas que utilizam o transporte público não querem sofrer com a baixa qualidade da experiência no trajeto. Nesse sentido, uma pesquisa da Caju, em parceria com a Consumoteca, mapeou que 56% dos jovens da Geração Z entrevistados preferem pedir demissão se o trabalho interferir na vida pessoal, algo que é bastante relevante quando se pensa em retenção de profissionais.
7. As novas gerações são vitais para evitar o apagão de talentos no futuro
Em vez de culpabilizar as novas gerações por todas as contestações que elas lançam sobre o mercado de trabalho, creio que seja mais produtivo ouvir e avaliar o que esses profissionais têm a dizer. Nesse exercício, pode ser que a gente precise investir um tempo explicando porque algo funciona de tal forma. Mas pode ser, também, uma oportunidade de descobrir como melhorar realidades. Isso tende a fortalecer relações profissionais e estimular os jovens a continuar aprendendo e se desenvolvendo, o que vai ser ótimo para evitar apagões de talento no futuro.
8. Apesar de tudo, a história mostra que somos seres adaptáveis
Dentro de uma empresa, muitas vezes, os líderes tomam decisões polêmicas que vão desagradar alguns, mas que fazem sentido para a estratégia do negócio. Em momentos como esse, alguns colaboradores vão decidir que é hora de se abrir para oportunidades do mercado. Outros, porém, vão se adaptar ao combinado assim que entenderem que a nova regra faz sentido, porque somos seres adaptáveis. Comparo isso ao uso do cinto de segurança. No passado, não usávamos. Hoje, colocá-lo é uma ação automática porque entendemos que, além de lei, o uso faz sentido para a nossa própria segurança.
No mercado de trabalho, um profissional não é obrigado a aceitar uma oferta, assim como uma organização não tem obrigação de contratar todas as pessoas que se apresentam ao processo seletivo. O estabelecimento dessa relação é uma opção. Então, esteja ciente das suas crenças, dos seus valores, das suas estratégias, dos seus objetivos e do cenário ao redor para fazer as melhores escolhas.