É hora de refletir a respeito do espaço que cedemos às inovações tecnológicas e o seu impacto em nossas vidas
No 20.º Congresso Mega Brasil de Comunicação, ocorrido em maio, em São Paulo, um dos conferencistas falava sobre os benefícios de ele possuir um chip em seu punho esquerdo. Citou como exemplo a possibilidade de, no futuro, ser capaz de saber sobre sua saúde, de momento em momento, evitar e curar doenças precocemente. Mencionava também que uma mulher grávida poderia, com o auxílio desse dispositivo, acompanhar a gestação e prevenir problemas.
No decorrer do dia falou-se muito sobre inovação, sempre com esse tom otimista. O que chamou minha atenção, entretanto, foi a ausência dos problemas e da análise das implicações dessa modernidade em um contexto mais profundo. Afinal, a mesma modernidade que nos trouxe o smartphone, a rede social e o medicamento com singularidade genética também estendeu o poder de governantes ao infinito, o culto exagerado ao corpo em detrimento do espírito e a visão de que o ser humano pode ser visto somente como uma máquina, sendo a consciência algo na prática inobservável e, portanto, não merecedora de uma atenção por assim dizer mais científica.
No entanto, onde está a solução tecnológica do grave problema moral que afeta os líderes políticos e empresariais neste momento? O povo saúda as escutas telefônicas que revelam ilicitudes, mas não parece muito preocupado se isso for feito de maneira descontrolada e por um governante autoritário. Se nós tivermos um chip seremos ainda mais rastreáveis? Para quê? Para quem?
Um homem da idade média provavelmente nos consideraria loucos com a vigilância que há sobre nossos atos e pensamentos. De satélites a espiões. De redes sociais a escutas telefônicas, o homem moderno parece ser visto como uma ameaça a governantes, uma máquina para cientistas e como um objeto de análise e crítica por parte de intelectuais – e fofoqueiros também. Nisso tudo, quem está cuidando da ética, do espirito e da moralidade? Onde estão os limites que, quando desrespeitados, de fato fazem o ser humano parecer uma máquina e, como tal, precisar de chip, de controle, de rastreamento e de análise crítica ao infinito?
É evidente que o Uber é excelente para reduzir custos para o transporte de pessoas e como uma renda de emergência em um país destruído por décadas de ideias esquerdistas. Entretanto, regularmente, prefiro estar em um carro com privacidade. Quem é que deseja que suas conversas particulares sejam ouvidas? Outro aspecto ausente de análises é o fato de a dívida do Uber não parar de crescer. Até quando acionistas sustentarão a empresa?
Um chip no organismo, de maneira permanente ou temporária, pode ser um fator de prevenção e detecção de doenças, tanto quanto de controle e rastreabilidade das pessoas. Penso que norte-coreanos, venezuelanos e cubanos já têm problemas suficientes com seus governos sem essa tecnologia. Com ela, o inferno em que seus países se transformaram deverá descer a níveis mais profundos.
Considero extremamente louvável que sejamos interessados e conhecedores das tecnologias que se avizinham e de sua incorporação ao nosso cotidiano. Contudo, sua adoção requer um pensamento mais abrangente e profundo das consequências, e não apenas uma aceitação mecânica de que, “se é moderno, é bom”!
Silvio Celestino é autor do livro “O Líder Transformador, como transformar pessoas em líderes”, e sócio fundador da Alliance Coaching.