Na semana da consciência negra, infelizmente, voltamos a discutir os mesmos pontos do debate dos anos anteriores (e não nos cansaremos nem desistiremos, enquanto não houver igualdade), em busca de um sociedade mais justa e menos desigual diversos atores sociais se movimentam para tornar efetiva a igualdade/isonomia já garantida em lei, haja vista que há previsão legal constitucional e infraconstitucional, além dos tratados ratificados pelo Brasil, que visam garantir igualdade entre pretos e brancos e entre homens mulheres. Porém, estamos longe da igualdade material, ou seja, da igualdade que deveria se materializar no dia a dia de homens e mulheres, independentemente de sua raça ou etnia.
A situação se agrava vertiginosamente quando tratamos da situação de mulheres negras no mercado de trabalho no Brasil, pois o racismo e sexismo juntos mantêm a maior parte das mulheres negras em condição de miserabilidade, exclusão e/ou ocupando vagas precárias de trabalho, na informalidade ou nos empregos com carteira assinada, nos quais elas recebem os menores salários, menos benéficos e dificilmente ascendem a cargos de liderança, sendo preteridas, ainda que estejam tecnicamente preparadas.
Logo, o cotidiano de grande parte das mulheres negras se constitui muito longe da igualdade formal, posta nos institutos normativos. A vida é repleta de desafios e limitações impostas, em razão da cor de sua pele, da textura e formato de seus cabelos e corpos. Impondo-se a condição de exclusão que impacta no acesso delas a atividades remuneradas, a saúde, educação de qualidade, a previdência social e a saneamento básico, entre outros não acessos, ou seja, há privação acentuada dos direitos sociais elementares à manutenção de uma vida digna.
Discriminar pessoas em razão sua raça e/gênero é garantir privilégios para poucos e, ao mesmo tempo, desperdiçar talentos que poderiam gerar recursos econômicos e sociais e um país mais sustentável. Nesse sentido, os dados da nova publicação conjunta CEPAL-OIT indicam que o acesso das mulheres a atividades remuneradas é essencial para o atingimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030.
Estamos caminhando em passos muito lentos na conquista de igualdade, enquanto isso, desperdiçamos vidas, talentos e dinheiro. A necessidade de superação da condição de desigualdade da mulher negra no mercado de trabalho é emergencial, fato que trará como consequências alterações positivas em todos os âmbitos da vida dessas mulheres e, por conseguinte, na estrutura socioeconômica e cultural do país, que dará um passo significativo rumo ao tão sonhado desenvolvimento sustentável e à efetivação da cidadania.
Na atualidade, um caminho possível para efetivação do processo que visa estabelecer igualdade de oportunidade para as mulheres negras no mercado de trabalho são as ações afirmativas desenvolvidas pela inciativa privada (por meio programas de desenvolvimento e inclusão para mulheres e negros no mercado de trabalho). No entanto, elas devem ser concretizadas por todos os atores sociais — do Estado, por meio do investimento significativo em políticas públicas; às organizações não-governamentais, os movimentos negros e sociais, às associações de classe, os coletivos de meninas/mulheres, os núcleos de acolhimentos a mulheres idosas e gestantes, entre outros grupos.
Neste sentido, iniciativas com as da Rede Nossa São Paulo (RNSP), ao produzir o relatório da Desigualdade Racial 2019, bem como todo o trabalho que vem sendo desenvolvido pela ONU mulheres, pelo pacto Global e pelo Núcleo Mulheres do Brasil, entre outras iniciativas, são de vital importância para conscientizar, formar e informar toda população a respeito da necessidade de mudança e enfrentamento ao racismo, pois as estruturas do racismo individual, institucional e estrutural impedem a transformação e mudança de vida de famílias inteiras.
Caso haja necessidade, que se faça a revisão dos marcos normativos, visando a coerência entre eles e o princípio da igualdade ou da não discriminação, porém a luta antirracista é responsabilidade de todos, pelas vidas e para que possamos mudar de assunto, precisamos urgentemente tocar no assunto, tratar do assunto.
Por Alessandra Benedito – Doutora e Mestre em Direito Político e Econômico, Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.