Especialista destaca a urgência de políticas inclusivas nas empresas brasileiras diante dos dados do Censo do TEA, que revelou 2,4 milhões de pessoas autistas no país.
Silvia Kelly Bosi – cientista, neuropsicopedagoga e especialista em desenvolvimento infantil e autismo.
O Censo do Transtorno do Espectro Autista (TEA) de 2022, divulgado recentemente, revelou um dado inédito e urgente: o Brasil possui 2,4 milhões de pessoas com autismo, sendo a maioria do sexo masculino. Trata-se de uma estatística que não pode ser ignorada — especialmente pelo setor corporativo, que ainda dá passos tímidos quando o assunto é diversidade e inclusão de pessoas neurodivergentes no mercado de trabalho.
O aumento do número de diagnósticos, reflexo direto da maior especialização dos profissionais de saúde e do avanço das ferramentas de identificação do TEA, impõe um novo desafio à sociedade: garantir que essas pessoas não sejam apenas reconhecidas nos números, mas também acolhidas em políticas públicas e práticas empresariais efetivas.
Pessoas com autismo possuem potenciais e talentos singulares. Muitas apresentam habilidades excepcionais em áreas como lógica, atenção a detalhes, programação, design e análise de dados. No entanto, por falta de informação, preparo ou estrutura, diversas empresas ainda encaram a neurodiversidade como um obstáculo — e não como uma oportunidade.
Mais do que promover contratações pontuais, o setor corporativo precisa repensar seus processos seletivos, ambientes de trabalho, rotinas e formas de comunicação. Incluir pessoas com TEA exige escuta ativa, adaptações sensoriais e uma liderança comprometida com o respeito às diferenças. A construção de ambientes acessíveis não deve ser vista como um favor, mas como uma responsabilidade ética e estratégica. Diversidade gera inovação, engajamento e fortalece a cultura organizacional.
O Censo do TEA deve servir como um divisor de águas, estimulando empresas a desenvolverem políticas inclusivas baseadas em dados concretos. Estamos diante de uma população numerosa, frequentemente invisibilizada, que pode contribuir de forma significativa para o crescimento econômico e social do país.
É essencial que as empresas invistam na formação de seus líderes e equipes, criem ambientes sensoriais mais amigáveis e estabeleçam programas de mentoria e acompanhamento individualizado. A inclusão de pessoas autistas não se resume à contratação: ela se sustenta no pertencimento.
Como cientista e especialista em desenvolvimento infantil e autismo, reforço que a inclusão se aprende, se constrói e se pratica todos os dias. Que os dados do Censo de 2022 não fiquem apenas nas manchetes, mas inspirem ações concretas, políticas consistentes e uma cultura corporativa mais empática e plural.