Os dados evidenciam que ainda estamos distantes do ideal em termos de equidade no ambiente de trabalho, e há muito a ser realizado nos anos vindouros.
Raphael Vicente – fundador e CEO da Iniciativa Empresarial pela Igualdade Racial
Diversidade cultural e étnica são características marcantes da sociedade brasileira e ajudam a formar a personalidade de uma nação tão miscigenada como a nossa. Mas a pluralidade de pessoas que encontramos nas ruas não está presente no ambiente profissional. Ainda que avanços tenham ocorrido nos últimos anos, é raro encontrar profissionais negros ocupando cargos estratégicos dentro de organizações públicas e empresas privadas.
A Lei de Cotas aprovada em 2014 reduziu a disparidade nas organizações públicas e está novamente em discussão no Congresso Nacional. O texto atualizado foi aprovado na Comissão de Constituição de Justiça do Senado (CCJ) e prevê aumento significativo na reserva de vagas em concursos públicos, saindo dos atuais 20% e chegando a 30% para pretos, pardos, indígenas e quilombolas. A nova redação também determina revisão da lei a cada dez anos.
Para se ter ideia, o total de servidores federais negros saltou de 17%, em 2000, para 43%, em 2020, aumento de mais de 150%. Pesquisa feita pelo LinkedIn aponta que 93% dos profissionais negros entrevistados no Brasil disseram que enfrentam obstáculos para chegar aos cargos mais altos e 91% acreditam que iniciativas de diversidade e inclusão são necessárias para ajudá-los a alcançar posições de liderança. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 55% dos cidadãos são negros.
Quando olhamos para as empresas privadas, a disparidade é ainda maior e mais preocupante. Segundo dados da B3, que analisou informações das 343 empresas listadas, o total de pessoas pretas ou pardas que ocupam posições no conselho de administração ou diretoria não ultrapassa 11%. Se considerarmos as pessoas brancas, os índices são contrários: 74% das empresas possuem três ou mais colaboradores em cargos de liderança e 11,9% afirmam ter duas pessoas brancas em cadeiras de alta gestão.
Os números comprovam que estamos longe do ideal quando nos referimos à equidade no ambiente de trabalho e muito ainda deve ser feito nos próximos anos. A Lei de Cotas é focada em concursos públicos, mas acaba promovendo um efeito cascata nas organizações privadas. Iniciativas ESG elevaram a presença de grupos minorizados em cargos estratégicos, entretanto, é extremamente urgente que todas as instituições adotem ações que promovam a equidade e criem ambientes onde a diversidade seja valorizada e incentivada.
As empresas, que sumariamente são orientadas pelo lucro, devem compreender os benefícios da diversidade não apenas como uma questão de responsabilidade social, mas também como uma vantagem competitiva. Segundo a consultoria McKinsey, companhias que possuem maior diversidade étnica e cultural lucram, em média, 33% acima do esperado.
Ainda que as mudanças estejam ocorrendo e os resultados das ações afirmativas fiquem mais visíveis, o caminho ainda é desafiador e exige esforço de toda a sociedade. A desigualdade que ainda persiste precisa ser abordada de maneira contínua e multifacetada. O engajamento no combate ao racismo estrutural deve incluir, desde cedo, letramento sobre diversidade racial e a eliminação de estereótipos prejudiciais que estigmatizam os profissionais negros.