Lições podem nortear estratégias em 2025, diz Isadora Gabriel, CHRO da Flash.
Por Isadora Gabriel, Chief Executive Officer na Flash
Em outubro, tive o privilégio de fazer parte da delegação de 25 executivos brasileiros que viajaram a Phoenix, nos Estados Unidos, a convite do LinkedIn, para comparecer ao Talent Connect Summit, experiência imersiva que reúne anualmente um grupo seleto de RHs com o objetivo de refletir e buscar soluções para os desafios corporativos da atualidade.
Essa é a terceira edição que participo da conferência do LinkedIn, conectando-me com lideranças globais de organizações que admiro, como Amazon, Netflix, Spotify, Accenture e BCG Consulting. Neste ano, o tema foi “Onde as possibilidades do trabalho acontecem” (numa tradução livre para o português). E o pano de fundo para quase todas as sessões, seja sobre atração de talentos, educação corporativa, cultura ou diversidade e inclusão, foi a inteligência artificial. Sim, a tecnologia protagonizou praticamente todas as discussões.
Listo, a seguir, alguns dos principais ensinamentos que tive durante uma semana intensa e cheia de aprendizados na capital do deserto dos Estados Unidos — e que acredito que podem ser bastante úteis no desenho das nossas estratégias em 2025.
Uso de assistentes virtuais nos processos de recrutamento
Logo na abertura da conferência, Ryan Roslansky, CEO do LinkedIn, mostrou a nova ferramenta de recrutamento da plataforma, Hiring Assistant, ainda em fase de testes com clientes globais. Segundo ele, a nova ferramenta deixará o recrutador investir mais energia no que ele sabe fazer de melhor: conectar pessoas às oportunidades e vê-las prosperarem em seus desafios. Para isso, o time de produto ouviu e acompanhou a jornada completa de recrutamento de diversos recrutadores, do próprio LinkedIn e de clientes parceiros, para mapear todas as tarefas indesejadas que hoje fazem parte da rotina do recrutador na plataforma. A tecnologia promete gerar eficiência em boa parte delas, por meio de uma solução robusta de AI da Microsoft em parceria com a OpenAI.
Outro destaque sobre IA foi a participação de Allie Miller. Top Voice do LinkedIn e uma das 50 mulheres mais influentes da tecnologia, segundo a The Awards Magazine, Allie atuou como head de machine learning (aprendizado de máquina) na Amazon. Em sua fala, ela chamou atenção para a velocidade com que a inteligência artificial está se expandindo e destacou a importância de uma mentalidade “AI first“, que vai além da construção de modelos tecnológicos para englobar novas formas de fazer negócios.
Entre várias provocações, ela questionou se nós, profissionais de RH, estamos alinhados com as equipes de tecnologia e produto para habilitar nossas organizações a navegar e tirar proveito da transformação digital que está em curso.
Apesar do entusiasmo pelo tema, Allie apresentou dados alarmantes que mostram que 24% dos profissionais de RH são detratores da IA e apenas 38% deles estão implementando ações, mesmo que pequenas, no sentido de promover sua adoção.
Para finalizar sua apresentação, dividiu os casos de uso da IA em três pilares fundamentais: pessoas, processos e produto, reforçando que executivos de RH precisam começar a testar possibilidades para obter resultados concretos em cada uma dessas esferas (veja imagem).
Cultura pode (e deve) ser construída em parceria com colaboradores
Saindo um pouco do hype da IA, fui ouvir uma conversa com Liz Wamai, head de talent acquisition, e Marcella Nurse, head de Learning & Development, ambas da Netflix.
Na palestra, a dupla compartilhou como a cultura da empresa está intimamente conectada à agenda de desenvolvimento de carreira. Meus três principais achados foram:
- Desde o início do processo seletivo a cultura deve ser protagonista. Todos os entrevistadores passam com os candidatos por perguntas que norteiam os quatro valores da companhia, para além da parte técnica. Isso quer dizer que todos os líderes são “entrevistadores culturais” e isso torna as avaliações mais consistentes.
- Marcella fez uma metáfora de “cultura como água”, para trazer uma ideia de que ela flui de várias formas, adaptando-se. Portanto, sua construção é contínua e colaborativa. A exemplo disso, mencionou que o memorando de cultura publicado em junho deste ano teve a participação ativa dos colaboradores na construção, o que faz com que as pessoas se apropriem da cultura e a pratiquem no dia a dia.
- Com base nos valores, a empresa criou também uma cultura de feedback constante, chamada internamente de “Pílulas de Desenvolvimento”. Segundo elas, essa prática simples virou o jogo e tem sido fundamental para manter os colaboradores mais engajados e comprometidos com alta performance e os resultados da companhia.
A mobilidade interna na Amazon
Outro painel muito interessante foi o de Jennifer Shappley, vice-presidente de talentos do LinkedIn, e Jay Shankar, vice-presidente global de atração de talentos da Amazon, que discutiram estratégias de desenvolvimento profissional e crescimento de carreira.
O case da Amazon é um exemplo de como a mobilidade interna pode ser um potente impulsionador de talentos. Por lá, eles adotam dois pilares na estratégia de desenvolvimento: um institucional, comum a todos os colaboradores e focado em soft skills e liderança, e outro totalmente descentralizado, guiado pelos dados do negócio e dos perfis dos colaboradores.
Este modelo permite que a mobilidade interna represente hoje 40% dos preenchimentos de vagas, promovendo talentos de dentro da organização para novas oportunidades. Além disso, a Amazon incentiva a capacitação contínua, oferecendo cursos especializados e até mesmo formando programadores internos em machine learning.
Futuro do aprendizado precisa focar em habilidades humanas essenciais
Josh Bersin, da Bersin Consulting, trouxe um olhar profundo sobre a revolução da inteligência artificial no campo do Learning & Development (treinamento e desenvolvimento). Ele enfatizou a necessidade de mudar a arquitetura das soluções de desenvolvimento, passando de modelos tradicionais baseados em descrições de cargos para um foco nas habilidades humanas essenciais. Isso permitirá alocar as pessoas nas funções que melhor aproveitem suas competências, impulsionando o desempenho organizacional.
Bersin também apresentou um framework inovador para a organização dos times de Learning & Development, sugerindo uma segmentação mais moderna entre equipes de arquitetura, comunidade de práticas e agile consulting.
O Talent Connect 2024 foi um marco importante para refletirmos sobre como as transformações tecnológicas estão moldando o futuro do trabalho.
Como líderes de recursos humanos, temos o desafio de garantir que as pessoas estejam preparadas para navegar nesse futuro, adaptando-se às novas ferramentas, desenvolvendo habilidades e se mantendo engajadas no propósito de transformar o ambiente de trabalho para todos. Como disse Jennifer Shappley em sua palestra: “Change itself is changing” (“Até a mudança está mudando”). Isso nunca foi tão verdadeiro. A mudança é constante, e nossa responsabilidade é liderá-la com inteligência, empatia e visão estratégica.