Por Rafael Souto, CEO da Produtive e especialista em carreira
O escritor norte-americano David J. Schwartz defendia que a prova de liderança residia na maneira de demitir um colaborador. Hoje em dia esse conceito se expandiu e uma das provas da esperada responsabilidade social de uma organização está na maneira como ela trata e conduz seus processos de demissão e de reestruturação.
Dentro da agenda de responsabilidade de uma organização, sintetizada pela letra S de Social na sigla ESG, deve estar a continuidade de carreira das pessoas. E a dor de ser demitido é massiva na trajetória profissional de um indivíduo. Uma pesquisa realizada pela Produtive indica que mais da metade dos demitidos (56%) relatam um grande impacto na demissão e dizem ainda que a forma como foram desligados foi o fator mais marcante da experiência.
Profissionais que se sentem desvalorizados em demissões mal conduzidas se tornam detratores de uma marca nas redes sociais e em seus círculos de amigos e familiares. Demitir é justamente uma das tarefas mais complexas para um líder muito por conta dos seus múltiplos impactos. Além do demitido, seus familiares, os colaboradores que permanecem na organização, o líder que demitiu e o ecossistema em que o negócio está inserido são afetados pelo desligamento.
Uma das formas de reduzir esse impacto é tratar a demissão como um processo e, não, como um evento isolado. Empresas que estruturam um ciclo de offboarding conseguem reduzir os efeitos negativos. Cuidar da saída das pessoas é uma tarefa contemporânea fundamental a todos os gestores preocupados com a reputação de uma empresa enquanto marca empregadora.
A organização de um processo de offboarding passa pela organização dos documentos, treinamento dos demissores para uma demissão e também pela definição de uma política de benefícios de apoio a recolocação. Os líderes de uma organização precisam ser treinados para demitir de forma empática. Um desligamento responsável é feito por etapas. Elenco as seis principais:
Preparação. A primeira etapa começa antes do dia da demissão e é a preparação da reunião. O líder incumbido da tarefa deve reunir todas as informações e dados sobre a demissão que serão transmitidas ao colaborador ao longo da reunião. Preparar a reunião exige método, tempo e dedicação. A demissão bem estruturada dá tranquilidade para quem demite e para quem está sendo demitido ao perceber que o líder dará apoio ao longo do processo.
Comunicar a demissão. O desligamento deve ser comunicado de forma objetiva e clara logo no início da reunião. Um erro comum é o líder se alongar na introdução do assunto, dar voltas, perguntar da família, falar sobre a situação da economia brasileira, dar feedbacks, entre outros subterfúgios. Discursos longos só aumentam a ansiedade das pessoas.
Dar o motivo. Vejo muitos líderes fugindo à responsabilidade da demissão e atribuindo a resolução às instâncias superiores da organização. Terceirizar a responsabilidade prejudica a imagem do líder pois retira a autoridade do gestor no processo. Ainda que seja uma reestruturação, o líder não deve deixar de enfatizar a sua tomada de decisão. Se for uma questão já discutida sobre a performance do profissional, é importante também retomar essa questão. Por fim, o motivo deve ser dado ainda que a demissão seja desconectada de um feedback anterior.
Ouvir. Para toda ação há uma reação. A escuta ativa é fator importante para qualquer líder com a tarefa de demitir. Não é momento de confrontar e sim de dar espaço às considerações do colaborador que está deixando a organização, com respeito e empatia. Caso ele manifeste discordância o líder pode dizer que entende o que ele quer dizer, mas a decisão já foi tomada e é hora de seguir para a próxima etapa.
Estruturar a sequência. Após ser informado da demissão e ouvido, o indivíduo precisa saber quais os próximos passos. Dar a clareza do que será feito a seguir diminui a ansiedade e o desconforto naturais em uma situação de desligamento. Essa sequência deve ser previamente combinada com a área de Recursos Humanos no momento da preparação. Nessa etapa, o líder também vai informar o demitido sobre os benefícios que ele vai receber.
Acompanhar o processo. A última etapa de um processo de demissão responsável é o monitoramento. É atribuição do líder se certificar de que a sequência estruturada da demissão está de fato ocorrendo. Entrega de documentos e dúvidas sobre o processo são exemplos do que deve ser monitorado. Essa atitude do líder mostra respeito e interesse e também um cuidado com a equipe que permanece na organização, já que o time todo é afetado pelo desligamento.
Estruturar esse caminho de saída é tão importante para a atração e retenção de talentos quando cuidar de quem chega na organização. As organizações e os líderes precisam demitir de forma empática e responsável.