Aproximadamente um ano após o declarado início da pandemia da Covid-19, e apesar de ainda termos alguns meses à frente até que a maioria da população esteja vacinada, penso que já é possível exercitar alguns dos legados que essa tragédia irá nos deixar.
No âmbito da convivência social, entendo que algumas medidas de proteção sanitária vieram para ficar e farão parte dos hábitos das pessoas, especialmente em ambientes públicos. Nas relações pessoais, a proximidade e o contato com os amigos e parentes serão ainda mais valorizados. Enquanto cidadãos, seremos mais exigentes na cobrança dos governantes para antecipar e agir em situações semelhantes, com menos politicagem e mais eficácia. Mas, e no ambiente de trabalho empresarial, o que podemos esperar?
Pessoalmente discordo das posições extremistas de que “o home office será eterno”, “ter escritórios não faz mais sentido” e por aí vai. Claro que muitas atividades podem ser feitas remotamente sem nenhum prejuízo de qualidade em sua execução. Na AGR, não paramos nem um dia sequer e conduzimos, quando necessário, alguns projetos de modo 100% virtual, com consultores e clientes interagindo e produzindo muito bem. Certamente houve um período de adaptação e uma perda inicial de produtividade, como acontece com toda novidade. Na minha visão, o trabalho remoto forçado pela pandemia nos mostrou algumas coisas:
- Muitas reuniões e viagens de negócios podem e serão substituídas por videoconferências organizadas e produtivas com as ferramentas que já existem e que ainda devem melhorar. Menos tempo de deslocamento e menos custos. Essa mudança de comportamento será impactante para muitos segmentos;
- O excesso de reuniões continua a existir, seja fisicamente no escritório, seja no “home office”. E em alguns casos as jornadas de trabalho até se prolongaram. As agendas ficaram meio insanas e as empresas e as pessoas terão que repensar e se planejar para ter momentos de pausa, em prol da qualidade de vida e do próprio trabalho;
- As barreiras físicas vieram abaixo, definitivamente. Como exemplo, cito um caso na nossa própria empresa. Fizemos um projeto com um consultor que estava morando em outro país, com um fuso horário de 4h. Adaptamos horários de reuniões e tudo funcionou surpreendentemente bem. Dependendo do segmento, será comum contratar colaboradores que moram em outros países, algo impensável para muitos até o ano passado. Não sei como a nossa velha (literalmente) CLT vai ficar nesse contexto;
- Algumas experiências presenciais não são perfeitamente substituíveis pela webcam, tais como convenções de vendas, eventos e os valiosos momentos “network” nos intervalos, “happy-hours”, festas de fim de ano, integração de novos colaboradores, o momento de descontração e de troca de ideia no cafezinho etc. É possível reproduzir on–line? Sim. É a mesma experiência? Não.
- Alguns tipos de trabalho que exigem mais criatividade e interação em time também funcionam melhor presencialmente, tais como desenvolvimento de novos produtos e serviços, ajustes em processos e implementação de sistemas. Além disso, acredito que mesmo as áreas de backoffice requerem proximidade com as operações. O distanciamento dos escritórios corporativos de suas operações já era um ponto de atenção que não será beneficiado por modelos remotos.
Portanto, nesse contexto, a gestão de pessoas será ainda mais desafiadora do que já é, pois acredito que o modelo híbrido deverá prevalecer, a depender do setor, do segmento, da cultura da empresa, do tipo de clientes e de muitas outras variáveis. Os modelos de gestão terão que se reinventar para atender aos novos jeitos de trabalhar que surgiram e que ainda irão surgir. A flexibilidade não é uma opção, mas sim uma necessidade. Mas quais os limites? Será que existem? E quem os define? Muitas dúvidas e apenas uma certeza, Charles Darwin está cada vez mais “ON”.
Por Rodrigo Catani, head de eficiência operacional da AGR Consultores