A parentalidade é o conjunto de funções que um progenitor ou cuidador exerce para o desenvolvimento pleno e saudável de uma criança que esteja sob sua responsabilidade
O setor de Recursos Humanos e as lideranças empresariais estão atentos à saúde mental de seus funcionários e às necessidades pessoais. Essa tendência faz com que desperte uma atenção especial aos profissionais que são pais, mães ou adultos de referência para uma criança, e são considerados responsáveis pela sua educação e formação pessoal.
A parentalidade é o conjunto de funções que um progenitor ou cuidador exerce para o desenvolvimento pleno e saudável de uma criança que esteja sob sua responsabilidade. Em outras palavras, é o estado ou condição de mãe e pai, que também pode ser realizada por outros adultos, por exemplo, avós, tios, madrasta ou padrasto. Desta forma, essa pessoa está responsável pelos cuidados físicos, emocionais, sociais, educacionais, além de disciplina e amadurecimento daquele ser.
De acordo com uma pesquisa da ONG Primeira Infância, a sociedade brasileira ainda acredita que o desenvolvimento pleno da criança cabe à família. Para 57% dos brasileiros, o melhor lugar para o infante de até 3 anos se desenvolver é em casa. 65% deles afirmam que os pais são responsáveis por atender a todas as necessidades até o terceiro ano de vida.
Todos os tipos de estruturas familiares podem promover um desenvolvimento saudável para aquela criança. Sejam monoparentais, homoafetivas, adotivas ou divorciadas, o fator determinante é o tipo de interação entre os membros da família. O desenvolvimento saudável na primeira infância está mais atrelado ao relacionamento entre as pessoas daquele grupo do que a configuração familiar.
Mas o que as organizações têm a ver com isso? Empresas comprometidas em promover saúde, segurança psicológica e bem-estar de seus colaboradores se tornam responsáveis pelo desenvolvimento de crianças que estão sob os cuidados daquelas famílias.
E como uma empresa pode colaborar para a criação de um ambiente familiar estável e saudável?
Historicamente, as tarefas domésticas e a educação dos filhos ficavam a cargo das mães. Com a emancipação da mulher e o aumento de sua participação no mercado de trabalho, iniciou-se um movimento de redistribuição do serviço de casa. Porém, em muitos casos, essa responsabilidade ainda recai sobre a presença feminina. Por isso, é necessário um olhar diferenciado por parta das organizações, pensar em como acomodar da melhor forma a rotina dessa mãe e do seu filho.
Conforme levantamento da FGV, 50% das mulheres deixam o emprego após o puerpério. São múltiplas variáveis envolvidas nessa estatística e, dentre elas, podemos destacar a falta de rede de apoio, agravada ainda mais no caso das mães solo. Para ter ideia da importância de levar em conta esses elementos, os Cartórios de Registros Civis do Brasil registraram no início de 2022 o maior número de mães solo desde 2018. Foram mais de 56.931 crianças registradas somente com o nome da progenitora entre janeiro e abril.
Pautas sobre licença-maternidade estendida, sala para amamentação e auxílio-creche não deveriam ainda estar sendo discutidas, pois são elementos mínimos requeridos. Mais que isso, ao voltar ao trabalho aquela mulher, mãe e profissional precisa de um olhar individualizado para ajudar a desenvolver o potencial desta nova colaboradora que se apresenta. Agora com mais intuição, sensibilidade e certamente com nova responsabilidade, deve ser recebida como uma profissional ainda mais completa, mas que necessita também contar com a flexibilidade da organização, sem prejudicar sua carreira e sem distanciá-la da necessária equidade de gênero.
Para que cada vez mais essa responsabilidade deixe de ser vista como uma obrigação da mulher presente naquela estrutura familiar, é preciso que as organizações também olhem para os homens, como responsáveis por pelo menos 50% do desenvolvimento daquela criança.
A licença-paternidade de cinco dias está prevista na lei trabalhista brasileira e é um direito de todo trabalhador. A importância da presença da figura paterna na vida do recém-nascido é tamanha, que não faz muito tempo o período de licença foi ampliado para 20 dias, mas disponível apenas aos funcionários de empresas que estejam vinculadas ao Programa Empresa Cidadã, do qual a John Deere faz parte.
O pai ou segundo cuidador inicia com a mãe o processo de se adaptar à nova rotina, além de cuidar e gerar vínculo com o bebê. Ainda é bastante comum os pais não conseguirem acompanhar todos os exames, seja pela visão distorcida de que a mãe é capaz de ir sozinha ou por restrições no ambiente de trabalho pouco equitativo. Mas, mesmo para aqueles que acompanham a gestação em todos os seus momentos, o distanciamento, no geral, aumenta à medida que os primeiros meses vão passando.
O tema – que para muitas organizações ainda é um grande tabu – repete a desigualdade de gênero permeando nos rumos da parentalidade. Não proporcionar essa flexibilização à figura masculina sugere indiretamente que esse pai coloque a família em segunda ordem, em algumas situações. Não estimular que essa figura paterna se torne responsável pela criação da criança da mesma forma que a mãe, pode contribuir para que esse profissional se torne menos produtivo e engajado no seu próprio dia a dia.
Olhar para os aspectos da parentalidade em todas as suas dimensões, mães, pais e figuras de referência, possibilita que essas partes cresçam de forma igual nos quesitos do amadurecimento, motivação e engajamento, pois a mulher ao ter seu parceiro mais próximo e com liberdade em participação, cresce, porque observa maior e melhor rede de apoio. O homem ao se dedicar de modo genuíno ganha em aprendizado e sensibilidade nas relações. A pessoa de referência para uma criança ao se perceber com a flexibilidade necessária para exercer sua parentalidade sem a fronteira do temor do juízo alheio ganha em humanização e na reciprocidade.
Temos aprendido muito com os novos modelos de trabalho e organizações que vem se formando, entendendo que é possível conciliar a vida profissional, pessoal e familiar de forma mais harmoniosa. O ambiente híbrido nos permitiu se voltar para dentro das nossas casas e notar a importância da troca afetiva. Mas, acredito que ainda é necessário o debate sobre o tema nas organizações.
Wellington Silvério é diretor de Recursos Humanos da John Deere para a América Latina