Nunca se falou tanto sobre engajamento no trabalho. Isso porque esse conceito, que tem no pesquisador Wilmar Schaufeli um dos grandes expoentes, está relacionado ao bem-estar do trabalhador e à performance da organização. Contudo, apesar da atenção recebida por parte da comunidade científica e das empresas, o engajamento experimenta declínio em várias partes do mundo. No Brasil, uma pesquisa realizada em 2020 pela ADP Research mostrou que apenas 18% dos trabalhadores estavam totalmente engajados.
Foi na busca por compreender melhor o que poderia incrementar de maneira efetiva o engajamento, que a pesquisadora e professora brasileira Carla Furtado, fundadora do Instituto Feliciência, iniciou, em 2018, uma investigação na Universidade Católica de Brasília (UCB). Sua hipótese apontava para uma relação positiva entre as condições de felicidade de uma pessoa, dentro e fora da organização, e seu engajamento no trabalho. “Sabíamos que a confirmação poderia apoiar as empresas no desenvolvimento de políticas de gestão de pessoas mais assertivas e benéficas aos trabalhadores, à sociedade e, consequentemente, ao próprio negócio”, destaca. Dois anos mais tarde e em plena pandemia, veio o resultado: hipótese foi confirmada.
Para avaliar as condições de felicidade de trabalhadores, a pesquisadora realizou a adaptação para o ambiente corporativo brasileiro e a validação científica da escala Felicidade Interna Bruta, desenvolvida no Butão com o apoio da ONU. A FIB verifica o acesso de uma população a condições que facilitem a experiência de felicidade e não a felicidade propriamente dita. A verificação proposta pela escala ultrapassa os muros da empresa para compreender os antecedentes de felicidade vivenciados pelo trabalhador em nove domínios: Bem-Estar Psicológico, Saúde, Uso do Tempo, Vitalidade Comunitária, Educação, Cultura, Meio Ambiente, Governança e Padrão de Vida. No Brasil, a escala recebeu o nome de Felicidade Interna Bruta do Trabalhador ou FIB-T.
Já para aferir o engajamento no trabalho foi utilizada a versão adaptada para o Brasil da Utrecht Work Engagement Scale – UWES. A escala, amplamente empregada no mundo, verifica o estado mental positivo do trabalhador, caracterizado pelo vigor, dedicação e absorção. Vigor compreende altos níveis de energia e resiliência mental, a dedicação refere-se a estar fortemente envolvido com o trabalho e experienciar senso de inspiração e desafio e a absorção é caracterizada por estar completamente concentrado. “É fácil compreender porque as empresas buscam conhecer e elevar seus níveis de engajamento: além das pessoas se sentirem conectadas com o trabalho, engajamento é reconhecido com o oposto de burn out”, explica Carla.
A pesquisa inédita analisou dados de duas empresas: uma nacional sediada no Distrito Federal e uma multinacional sediada em São Paulo. Ao correlacionar as duas escalas aplicadas, validou-se a hipótese inicial de que colaboradores com melhores condições pessoais de felicidade apresentam maior engajamento no trabalho. “Esse achado permite a constituição de um novo paradigma organizacional: o cuidado com o bem-estar de quem trabalha intra e extramuros da empresa e não mais apenas com o bem-estar ‘no trabalho’. Somos seres integrais, o que vivemos fora do trabalho afeta nosso desempenho laboral, ainda mais em uma pandemia”, ressalta Carla.
FIB no Brasil
No Brasil, empresas públicas e privadas já utilizam o modelo preconizado pela pesquisadora de estabelecer iniciativas amplas de cuidado com os trabalhadores, observando os diversos aspectos que têm potencial de impactar a felicidade para além do ambiente organizacional, com consequente impacto na performance laboral.
No Mato Grosso, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) utiliza o sistema FIB-Feliciência desde 2019, com excelentes resultados observados. Christine Ribeiro, Coordenadora de Saúde, Felicidade e Qualidade de Vida no TRT-MT, explica que aplicar a pesquisa FIB foi o primeiro passo para o levantamento de dados e constituição de um diagnóstico para implementar o programa de felicidade. “No início de 2019 a gente fez a primeira aplicação para nosso programa, o Florescer. Na segunda aplicação, em 2021, ficou muito claro que tivemos um ganho na dimensão bem-estar psicológico, mesmo em um período bastante desafiador”.
Outra organização que elegeu a pesquisa FIB-T como instrumento de diagnóstico prévio ao programa de felicidade é a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan). A Gerente Geral de Pessoas e Cultura Organizacional, Myriam Marques, destaca que houve grande aceitação por parte das lideranças. “Percebo que estão muito interessados nessa temática, principalmente por causa da pandemia, que tem causado medo e ansiedade”, conclui a executiva. A entidade está na fase de processamento dos dados coletados.
Felicidade Data-Driven
O Instituto Feliciência acaba de lançar uma spin off dedicada a pesquisas, o FeliciData. Com isso passa a atender organizações interessadas em implementar a FIB-T como instrumento de diagnóstico para definição dos investimentos em felicidade e bem-estar no trabalho. “Reunimos um time de ponta – com designers, desenvolvedores e especialistas em people analytics – para converter a pesquisa em uma solução de business intelligence. Estamos prontos para apoiar as companhias que, mesmo no campo da felicidade, possuem um mindset data-first”.