Surfamos no mundo do trabalho que está frenético e em rápida evolução
Adriana Schneider, Especialista em Desenvolvimento Humano e Organizacional da Humanare
Há quase 15 anos, assumi o desafio de reestruturar uma área de serviços de uma renomada instituição.
Após o diagnóstico, alguns pontos chamaram atenção: a falta de clareza quanto ao propósito da área, de interdependência, de relevância das atividades, de contribuição para o negócio, de perspectivas de crescimento e de percepção de meritocracia.
Parecia um barco à deriva numa tempestade em alto-mar
Qual foi a minha saída? Além de um novo modelo para minha estrutura, co-construí seu propósito, a missão e a visão de cada área e, após o mapeamento de perfis comportamentais, conversei com cada funcionário para montar um descritivo de funções/atividades, de comportamentos esperados; de níveis de senioridade com faixas de remuneração e uma trilha bem simplificada de carreira (na época em “Y”).
Quando apresentei o programa à diretoria e aos meus colegas, antes de desdobrá-lo para os colaboradores, recebi muitos elogios pela iniciativa e, também, palavras de apoio à ação. Em seguida, informei que iria pedir ao time que analisasse seus desafios atuais, suas competências e seus desejos de carreira para que aplicassem a candidatura aos cargos e áreas da gerência. Tudo indicava que a vela estava prestes a conduzir o barco para ultrapassar ondas desafiadoras.
No entanto, fiquei surpresa ao saber que alguns colegas alertaram suas equipes para não participarem do projeto, pois poderiam ser considerados “traidores”. Eles viam seus colaboradores como “recursos”, propriedade privada, contratados para servir seus próprios interesses e prioridades e não a algo maior. Na época fiquei chocada, foi difícil sustentar a mudança, mas foi transformador para todos os envolvidos.
É inacreditável que, em 2022, esse tipo de atitude ainda esteja dentro das organizações. Os dados demonstram essa triste realidade.
De acordo com a consultoria global Gartner, 78% dos funcionários dizem não se sentirem incentivados pelo seu líder a dizer o que pensam sobre sua carreira e têm receio de serem punidos ou deixados de lado se não agradarem aos interesses de seus gestores. São resquícios da cultura de comando e controle que persistiu por décadas.
A bússola para as lideranças:
Surfamos no mundo do trabalho que está frenético e em rápida evolução. Será que nesse cenário há espaço para lideranças presas a ideias do passado e que usam o poder de decidir e delegar de maneira tão unilateral?
O contexto prova que a tendência hoje é o diálogo entre gestores e funcionários. É por meio dessa sensação de liberdade e de troca de ideias que emergem mais motivação e engajamento. Até porque a dinâmica das relações e dos processos, dentro e fora das empresas, está cada vez mais imprevisível. Isso requer flexibilidade, colaboração e transdisciplinaridade. E as carreiras estão mergulhadas nesse cenário.
Ancorando o plano de carreira:
Diante desse contexto, o plano de carreira ainda faz sentido? Será que ele se move como se fosse uma garrafa em alto-mar? Na verdade, o plano de carreira, atualmente, é uma âncora de boia de mergulhador, pois orienta os navegantes e oferece segurança para explorar as possibilidades do local, com liberdade, para acompanhar os ventos que sopram em diversas direções. Senão aquela sensação de mergulhar com profundidade, nadar e morrer na praia tem tudo para virar realidade.
O que está no cerne do debate hoje é a carreira em nuvem que é guiada por mais inovação, integração e agilidade. Nela a escolha passa ser da pessoa e não mais uma decisão da empresa.
Os líderes devem se preparar para conversas transformadoras, ou seja, diálogos com a escuta empática, abertura para ouvir sobre os anseios e temores de seus funcionários, para que, juntos, possam identificar caminhos de desenvolvimento e de construção de uma boa reputação.
Um bom líder responsabiliza-se por desenvolver seus possíveis sucessores, porém receios como o de perder seu colaborador para outra área ou para o mercado, ter seu cargo ocupado por outra pessoa e não ter tempo e energia para desenvolver novas pessoas se tornam crenças limitantes.
Não entre nessa de que quem vai ao mar perde o lugar. Não mesmo! É importante saber navegar nesse novo mindset. Mudanças fazem parte do jogo, seja ao assumir um cargo, na preparação de seus sucessores, criando oportunidades de visibilidade, de aprendizados e, até mesmo, de movimentação.
Lembre-se: líderes que proporcionam e recebem feedbacks com frequência dão abertura para que seus colaboradores exponham seus pensamentos sem medo de represálias, criando um ambiente de segurança psicológica, onde todos conseguem propor e implementar inovações, aprender com os erros e compartilhar o aprendizado. Isso proporciona uma tripulação altamente engajada e de alta performance. Todos crescem, inclusive o próprio capitão, ou seja, o líder. Mar calmo nunca fez bom marinheiro, já diz o ditado. Aventure-se e inspire as pessoas!