Empresas dos Estados Unidos e da Europa já estão oferecendo benefícios para mulheres que desejam ter filhos com a ajuda de especialistas de fertilidade ou que queiram congelar seus óvulos
Por Katia Ortiz, country manager da ServiceNow para o Brasil
A existência de uma cultura de desigualdade de gênero no meio corporativo, seja ela velada ou não, não é algo novo. Desde sua entrada no mercado de trabalho, a mulher se depara com questões de disparidade – de salários, de tratamento e de oportunidades. E isso, infelizmente, ainda é uma realidade no mundo em que vivemos.
Além desses problemas já históricos, se faz urgente que tenhamos mais atenção aos desafios enfrentados pela mulher contemporânea, como o burnout, a busca por tratamentos de fertilidade e a recolocação no mercado após a pandemia de Covid-19, entre outros. Os benefícios oferecidos para essa fatia da população, nesse sentido, precisam acompanhar as discussões mais recentes sobre o assunto.
Mas é preciso, inicialmente, desmistificar a visão de que benefícios como esses são vantagens. Eles existem para atender às necessidades das pessoas que compõem os quadros de colaboradores, que são (ou ao menos deveriam ser) diversas e, portanto, possuem necessidades também diversas. Estamos tratando aqui de equidade, onde não simplesmente aplicamos as mesmas regras de forma generalizada, mas as adaptamos com o objetivo de que haja igualdades de oportunidade, e de forma concreta.
Empresas dos Estados Unidos e da Europa já estão oferecendo benefícios para mulheres que desejam ter filhos com a ajuda de especialistas de fertilidade ou que queiram congelar seus óvulos. Pode-se dizer que esse é um olhar alinhado com os tempos atuais, já que atualmente cada vez mais mulheres preferem ser mães mais velhas, muitas vezes para poderem dar prioridade a suas carreiras profissionais. Para dar uma dimensão desse cenário, segundo o IBGE, entre 2000 e 2019 houve um aumento de 36% no número de nascimentos de crianças com mães entre os 30 e os 44 anos.
A divisão de tarefas e o cuidado com os filhos são outros pontos a serem considerados. O estudo “Estatísticas de gênero: indicadores sociais das mulheres no Brasil”, também do IBGE, aponta que as mulheres gastam quase o dobro do tempo que os homens nas tarefas do lar, sendo que estas muitas vezes envolvem cuidar de um parente doente ou com alguma limitação. Durante a pandemia, vale destacar, 92% dos responsáveis pelos cuidados com os idosos – remunerado e familiar – eram mulheres.
Um bom exemplo de como as empresas podem oferecer apoio aos parentes adoecidos é por meio da disponibilização de especialistas que forneçam suporte personalizado e holístico para lidar com necessidades como planejamento financeiro e jurídico, assistência médica, moradia, assistência domiciliar ou instalações e bem-estar pessoal do familiar. Isso, de forma prática, alivia um peso que hoje está majoritariamente sob a responsabilidade de uma mulher, que, em muitos casos, está sobrecarregada.
Embora seja inegável que contribuam para um ambiente profissional mais acolhedor, esses programas voltados exclusivamente para as colaboradoras não devem ser a única frente de atuação se quisermos falar de transformações sensíveis no mercado de trabalho, especialmente com relação à desigualdade de gênero. É preciso pensar também na recolocação de mulheres desempregadas, atitude que firma a posição das empresas como aliadas no compromisso de atenuar essa desigualdade, principalmente em tempos de pós-pandemia. No Brasil, as mulheres foram as principais afetadas profissionalmente em 2020, quando a Covid-19 chegou por aqui. E até hoje são elas que têm mais dificuldade de se realocar no mercado de trabalho em comparação com os homens.
Para falar sobre o bem-estar da mulher no mercado de trabalho hoje, em 2023, não basta que as corporações invistam apenas em um pacote básico de benefícios para as mulheres, se eles não acompanharem os novos empecilhos existentes na atualidade. Para além de políticas e auditorias de garantia de um salário equitativo e um ambiente de trabalho sem assédio, é necessário que o RH esteja atento às novas preocupações, como a sobrecarga de trabalho, pausas na carreira e planejamento familiar.