Valdeci Verdelho, fundador da Verdelho Comunicação, é jornalista, especialista em comunicação corporativa e professor em gestão de crise
Uma mulher grávida foi ao médico preocupada porque temia que algo estivesse errado com seu bebê. Após o exame, o comentário do médico foi marcante. “Uau! Este útero está dobrado para trás!” E completou: “Uma vez, assisti a um parto em que o útero da mulher em trabalho de parto estava dobrado. Não havia como a criança sair, então tivemos de cortar o bebê em pedaços para tirar”.
Relatado por Lisbeth Holter Brudal no seu livro “Empathic Communication – The Missing Link”, o caso que parece piada de mau gosto, mas é real, serve de exemplo para a autora mostrar a importância de um preparo específico para que médicos, enfermeiros e cuidadores sejam capazes de se comunicar com empatia no relacionamento com pacientes.
A comunicação empática foi gerada em centros de tratamento médico sob a inspiração de profissionais de saúde, tendo como base teórica a sistemática dos neurônios-espelhos que sustentam a empatia. Assim comunicação empática, por meio do um processo caracterizado por espelhamento, significa conectar-se, estar presente para a outra pessoa totalmente consciente dos seus sentimentos e necessidades.
Indispensável na relação entre profissionais de saúde e pacientes, comunicação empática pode ser utilizada em várias situações. Tornou-se essencial nos processos de gestão de crise, é o modelo recomendado para ocasiões de más notícias e é praticamente necessário no momento em que a prolongada pandemia disseminou ansiedade e fragilidade.
Passado mais de um ano desde o anúncio da primeira morte por Covid 19 no Brasil, o coronavírus continua fazendo vítimas. Diariamente, empresas perdem colaboradores, que perdem colegas de trabalho, que perdem
parentes, que perdem amigos, que perdem pessoas do relacionamento social ou profissional. Mortes, lutos e perdas tornaram-se dolorosa realidade que se espalha rapidamente disseminando transtornos por toda parte.
Acompanhando a espiral de tantas perdas acumuladas crescem, também, o medo, as incertezas, a angústia, o estresse e a depressão. Segundo pesquisa do Conselho Federal de Farmácias, as vendas de medicamentos controlados, em 2020, aumentaram 17% em relação ao ano anterior. Dramas pessoais, traumas e transtornos mentais contaminam o ambiente de trabalho, afetam o rendimento individual, derrubam a produtividade e podem abalar o clima organizacional, impondo um desgaste, psicológico, social, emocional que impacta também as lideranças.
Em cenários de vulnerabilidades e insegurança como este gerado pela pandemia, a comunicação empática pode fazer toda a diferença. Uma das consequências do medo e ansiedade, aos quais grande parte das pessoas está submetida, é o estresse que ativa a amigdala cerebral, uma parte do sistema límbico responsável por reações emocionais e comportamentos. Diante de situações de risco e ameaça à sobrevivência a amigdala responde de tal forma que o emocional se sobrepõe totalmente ao racional. Como isto torna o diálogo e o relacionamento mais difíceis, a comunicação empática é a melhor opção.
Diferente do modelo convencional da comunicação, em geral, associada a grandes oradores, inspirada por líderes eloquentes com falas empolgantes ou discurso contagiante, a comunicação empática está mais para Mahatma Gandhi do que para Martin Luther King Jr. Sua base são os atributos da empatia: ser capaz de ver o mundo sob a perspectiva do outro, ouvir o outro sem qualquer julgamento, entender os sentimentos do outro e comunicar com compreensão do sentimento do outro.
A essência da comunicação empática é o escutar verdadeiramente a outra pessoa, prestando atenção nas necessidades, reconhecendo os sentimentos, respeitando esses sentimentos, conectando-se mentalmente. Para isso é preciso dedicar-se por inteiro, sem se preocupar em dar opinião, concordar ou discordar e, principalmente, sem preconceitos, estigmas ou suposições.
Na hora de falar, é importante escolher cuidadosamente os termos e o tom. Uma única frase, com as mesmas palavras e na mesma sequência pode ter diferentes interpretações dependendo apenas da entonação, e podem comprometer a conversa. Comunicação empática combina com linguagem amena que expressa acolhimento e compaixão.
Palavras importam, mas estudos já demonstraram que representam apenas 7% no processo de comunicação. O restante é determinado por tom, inflexão de voz e, principalmente, gestos, posturas e expressão facial. Seja presencial ou virtual, a comunicação empática requer cuidado especial com tudo o que corpo fala além – ou apesar – do que se diz verbalmente.
Se no passado a comunicação empática contribuiu para preparar profissionais de saúde e evitar que pacientes continuassem a ouvir crueldades como a grávida de útero virado para trás, hoje neste cenário de tantos conflitos e turbulência, pode ser de grande valia para humanizar diálogos e relacionamentos nas empresas, nos lares e nos ambientes de convívio social, proporcionando acolhimento, contribuindo para promover harmonia.