Por que o excesso de positividade pode nos afastar do autoconhecimento e prejudicar nosso bem-estar emocional.
Por Graziele Piva e Rodolfo Olivo
Vivemos em um mundo onde o “pense positivo” se tornou quase um mantra universal. Frases como “tudo acontece por uma razão” ou “seja sempre grato” estão por toda parte – das redes sociais às conversas diárias. Mas essa insistência na positividade pode ser cansativa, e, pior, prejudicial. Embora o otimismo seja importante para o bem-estar, há uma linha tênue entre encorajar pensamentos positivos e sufocar emoções legítimas. É aí que entra o conceito de positividade tóxica.
Martin Seligman, criador da psicologia positiva, ensina que a gratidão e o otimismo são pilares de uma vida significativa. No entanto, ele também reconhece que não se pode ignorar a dor e a tristeza. Em Flourish, Seligman defende que uma vida plena não é a ausência de sofrimento, mas a capacidade de enfrentá-lo e crescer com ele.
A armadilha do “Feliz Sempre”
Forçar-se a estar positivo o tempo todo cria um abismo entre o que sentimos e o que achamos que deveríamos sentir. Como sugere Brené Brown em A Coragem de Ser Imperfeito, a vulnerabilidade é essencial para a nossa humanidade. Rejeitar sentimentos considerados “negativos” enfraquece a capacidade de lidar com eles e nos afasta de um verdadeiro autoconhecimento.
A filosofia também alerta sobre os riscos da busca incessante por felicidade. Desde Sócrates, sabemos que “conhece-te a ti mesmo” é o primeiro passo para uma vida consciente. Friedrich Nietzsche, por sua vez, apresenta o conceito do Übermensch (ou “além-homem”), um ideal que transcende a busca pela felicidade confortável e fácil. Para Nietzsche, aceitar as imperfeições e os desafios da vida é parte essencial do crescimento humano.
Quando a positividade faz mal
A psicóloga Susan David, em Agilidade Emocional, explica que reprimir emoções pode levar a estresse crônico, ansiedade e até problemas físicos. Segundo ela, todas as emoções têm um propósito e ignorá-las impede o aprendizado que os desafios podem trazer.
Por exemplo, ao enfrentar um fracasso no trabalho, não é necessário buscar imediatamente uma “lição positiva” ou forçar um sorriso. Permitir-se sentir tristeza ou frustração, refletir sobre a experiência e, só então, seguir em frente, é um processo natural e necessário para o amadurecimento.
A força de encarar as dificuldades
Falhar faz parte da evolução. O pensador Nassim Taleb introduziu o conceito de antifragilidade, que descreve a capacidade de se tornar mais forte após passar por estresse ou adversidade. Isso não significa glorificar o sofrimento, mas reconhecê-lo como uma parte inevitável da jornada humana – e que, muitas vezes, pode trazer benefícios futuros.
Kristin Neff, referência em autocompaixão, reforça que tratar-se com gentileza ajuda a enfrentar desafios sem se consumir pela autocrítica ou pela busca irreal da perfeição. Reconhecer nossas limitações e aceitar a vulnerabilidade são passos essenciais para o crescimento pessoal.
O caminho do autoconhecimento
A melhor forma de combater a positividade tóxica é investir no autoconhecimento. Aceitar quem somos – com nossas luzes e sombras – e permitir que cada emoção cumpra seu papel é o que realmente nos faz evoluir.
Nem sempre estaremos bem, e isso está tudo bem. Somos humanos, não máquinas programadas para funcionar sempre no “positivo”. Sentir, errar e recomeçar são atos de coragem. Às vezes, admitir que precisamos de tempo para processar as coisas já é um grande passo.
Que possamos seguir pela vida com mais autenticidade, aceitando nossas falhas e celebrando nossas conquistas, enquanto aprendemos a sermos fiéis ao que realmente somos.