Qual é o limite da atuação das empresas quando o colaborador trabalha de casa, um ambiente fora do controle direto do empregador?
Um recente caso envolvendo um trabalhador em home office reacendeu o debate sobre as responsabilidades trabalhistas nesse modelo de trabalho. O colaborador entrou com uma ação judicial alegando que sofreu uma torção no joelho — que resultou na necessidade de cirurgia — após um movimento brusco de seu animal de estimação, que estava deitado sobre suas pernas durante o expediente. O episódio trouxe à tona a seguinte questão: até onde vai a responsabilidade do empregador quando o trabalho é realizado em um ambiente doméstico?
Para a advogada Glauce Fonçatti, sócia do Escritório Batistute e especialista em Direito do Trabalho, esse tipo de situação ainda exige interpretações complexas, mas deve prevalecer o bom senso e a boa-fé entre as partes. “De qualquer forma, há medidas importantes a serem tomadas para evitar imprevistos que possam levar a ações judiciais”, pontua a especialista.
Um dos pontos cruciais é a segurança no trabalho. A empresa é responsável por garantir que o colaborador tenha acesso a equipamentos adequados e condições ergonômicas mínimas. “Cabe à organização fornecer os itens necessários e orientar o colaborador sobre o uso correto, promovendo boas práticas de saúde ocupacional”, reforça Glauce.
Entretanto, a advogada pondera que o empregador pode não ser responsabilizado por ocorrências que estejam fora do seu controle, como a presença de animais domésticos, por exemplo, ou situações que não fariam parte do ambiente corporativo. “Se na sede da empresa o colaborador não tem a função de lavar janelas, e em casa ele realiza essa atividade e se acidenta, isso não configura responsabilidade da empresa, pois não está diretamente relacionado à função exercida”, explica.
Alguns pontos, no entanto, já são pacificados pela legislação e pela jurisprudência. Entre eles, estão o fornecimento de equipamentos como computadores, telefones, acesso à internet e softwares específicos para o desempenho da atividade profissional. Já com relação ao pagamento de horas extras, ele só é obrigatório quando há controle formal de jornada, como o ponto digital. Do contrário, se o controle estiver fora do alcance da empresa, não há obrigação legal de pagamento.
Outro ponto de atenção é a proteção de dados e informações confidenciais. No regime de trabalho remoto, os riscos de violação à confidencialidade aumentam, exigindo ainda mais responsabilidade do colaborador e medidas preventivas da empresa.
O advogado Jossan Batistute, sócio-fundador do Escritório Batistute Advogados e especialista em questões societárias, empresariais e patrimoniais, afirma que nem todos os direitos e deveres do trabalho remoto estão claramente previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Além disso, ressalta que cada função apresenta particularidades. “Diante disso, a empresa precisa redobrar os cuidados com sua documentação, práticas e rotinas laborais”, orienta.
Jossan destaca que é essencial formalizar as relações de trabalho remoto. “É preciso instituir documentos específicos, como contrato de trabalho adaptado, código de conduta e regimento interno que contemplem as características do home office. Práticas internas devem ser revisadas para mitigar vulnerabilidades e evitar futuros conflitos trabalhistas”, reforça.
Com uma estrutura bem definida e processos claros, as empresas podem minimizar riscos jurídicos e garantir uma convivência mais harmoniosa e segura entre empregadores e colaboradores — mesmo à distância.