Raissa Florence – cofundadora e Chief Growth Officer da Universidade Corporativa Koru
Na última década no Brasil, o número de afastamentos por burnout cresceu quase 1.000%, segundo dados do INSS em publicação divulgada na última semana. Isso não é surpreendente, considerando a pressão cada vez maior por resultados rápidos e a ansiedade para se alcançar a realização profissional. Dados da International Stress Management Association (Isma) de 2021 já apontavam que o país ocupava o segundo lugar no mundo em casos de síndrome de burnout, uma condição de esgotamento físico, emocional e mental.
O mercado global está atento. A empresa americana de saúde, Sonde Health, lançou neste mês uma tecnologia que detecta sinais de burnout por meio da voz. Ponto para a tecnologia a nosso favor, mas ela sozinha não basta. Para construir uma trajetória profissional saudável, é preciso ir além e investir no desenvolvimento de habilidades e na educação continuada.
Uma pesquisa realizada pela Universidade Corporativa Koru, em parceria com a Flash, no primeiro semestre de 2024, revelou que a saúde mental, a integração tecnológica e a capacitação contínua são pilares fundamentais para o sucesso nas empresas. Profissionais de Recursos Humanos destacaram a importância de uma abordagem holística, que vá além das métricas de performance e priorize o bem-estar dos colaboradores.
Esse cenário levanta uma questão crucial: como equilibrar o desejo por uma carreira com ganhos acelerados com a necessidade de preservar (ou até recuperar) a saúde mental? Apesar de todas as otimizações tecnológicas que facilitam nosso dia a dia, a construção de uma carreira sólida exige tempo e dedicação. Não há como escapar. Mesmo que a velocidade do mundo moderno muitas vezes assombre a paciência necessária para um desenvolvimento profissional sustentável.
Lembro-me de quando, na minha infância, eu aguardava ansiosamente até às 19h para assistir a um episódio do Castelo Rá-Tim-Bum na TV Cultura. Não havia outra opção: se eu me atrasasse no banho ou me distraísse com outra atividade, perderia a transmissão da série naquela noite e não haveria uma segunda chance. Hoje, com a abundância de conteúdos sob demanda, esperar parece um conceito ultrapassado.
É inegável que a tecnologia trouxe uma agilidade extraordinária para nossas vidas, o que é sim positivo de muitas maneiras. No entanto, quando se trata de construir uma carreira sólida, pular de um conteúdo para outro ou buscar atalhos, não será suficiente.
Há alguns anos, bastava ler dois ou três livros para se ter uma base consistente de conhecimento. Lembro-me de, durante o processo seletivo de trainee da Ambev, ser questionada sobre o último livro que havia lido, e eu tinha a resposta na ponta da língua. Mas a realidade mudou. Apesar de continuar sendo uma ávida leitora, reconheço que a formação de um profissional vai muito além.
Hoje, além da educação corporativa continuada para o aprimoramento de conhecimentos técnicos, destaco a importância das habilidades comportamentais como um diferencial indispensável. Um exemplo prático disso está em um dos melhores vendedores que contratei para o meu time comercial há alguns anos. Antes de trabalhar comigo, ele vendia barras de chocolate nos semáforos de São Paulo. Convencer um potencial comprador em questão de segundos, em meio ao trânsito caótico da maior metrópole do país, exige não apenas prática, mas também um olhar atento, inteligência emocional e resiliência.
A ansiedade por uma carreira de ascensão rápida pode comprometer a saúde mental e resultar em frustração, dificultando o alcance daquela tão desejada promoção. Resolver essa equação é desafiador, mas é possível. Precisamos discutir as expectativas do mercado e dos novos profissionais. Como eu já adiante, não há como escapar: o desenvolvimento de um repertório profissional sólido exige tempo, dedicação e equilíbrio.