Por Fred Alecrim, Diretor de Recursos Humanos e co-fundador da Credere
A equação do tempo é delicada. Eu não diria insolucionável, mas bem difícil de ser resolvida. A pressão por superar etapas, evoluir, atingir o coração dos investidores é imensa. Os integrantes do ecossistema das startups sabem e até brincam com isso. Quem nunca ouviu a frase “dormir é para os fracos”?
Claro que essa questão cultural não está presente apenas no mundo das startups. No mundo corporativo, poucas são as empresas que já encontraram o equilíbrio no seu jeito de funcionar dentro do novo normal. O que é home, o que é office?
Tanto se fala sobre customer experience, mas tão pouco sobre employee experience. Mas será que, sem uma boa experiência do funcionário, dá para gerar uma boa experiência para os clientes? Sinceramente, acho que é quase impossível, e aí está o desafio — formar um time eficiente, com foco e vontade de trabalhar duro, que também tenha tempo para se realizar e curtir a vida pessoal. Um não é possível sem o outro.
Tenho ouvido muitas pessoas comentarem que trabalham muito e dormem pouco. Alguns períodos exigem esticar o expediente ou mesmo aquela virada de noite com fast food. E como é compensador ver o resultado desses dias e noites dedicados ao trabalho. Faz parte, mas não pode ser regra.
Essa preocupação me levou a ressignificar a palavra RH. Ao meu ver, Recursos Humanos passou a ser (R)evolução Humana. Abrir espaço para ações de Diversidade, Inclusão e Equidade e não ficar apenas na teoria e planejamento; utilizar ferramentas para identificar e entender as angústias de líderes e funcionários; abrir um canal de diálogo para receber denúncias de comportamentos ruins; estimular debates com temas fundamentais na sociedade, como antirracismo e antimachismo, e outras formas de abrir o diálogo, trocar experiências.
Essa arquitetura tem a ver com a filosofia que acredito — o trabalho não é nossa vida, é parte dela. Aí, sim, o termo já meio desgastado, ‘gestão do tempo’, ganha um sentido verdadeiro. Valorizo o tempo, pois acredito que tempo é vida. E o gestor precisa desse tempo para olhar as pessoas e entender o que elas pensam, precisam e sentem.
O burnout não nasceu com a pandemia. Mas se agravou a partir dela e não podemos ignorar isso. A experiência me mostrou que, no nosso dia a dia, temos que investir em trabalho assíncrono, reuniões objetivas e respeito ao tempo das pessoas, diminuindo interrupções e distrações, para que elas possam ser mais produtivas, efetivas, mas que curtam e se dediquem à vida pessoal.
Ainda que a cultura do nosso ecossistema diga outra coisa, prefiro pensar que se criou um modismo em torno das startups — e que, como todo modismo, é possível mudar.
Um bom começo é se perguntar: “Por quê tenho que fazer desse jeito?”. Você já se questionou? A solução é entender o problema e buscar a resposta na própria pergunta. Se o ambiente de trabalho é tóxico, não há férias que curem o esgotamento mental. Poder sair do mode on por alguns dias é sempre bom. Mas, se nada mudar na volta, acaba sendo mais um paliativo.
Quem tem pressa de crescer, acaba passando por cima de muita coisa. Se fizer tudo na base do ctrl+c e ctrl+v, com a pressão de apresentar resultados, só vai conseguir repetir modelos. Sem questionar se aquilo faz sentido, se é a melhor ferramenta. E, se todos estão fazendo igual, a tendência é que saia tudo igual.
Não tenho respostas prontas, mas os caminhos que trilhei no nosso ecossistema vêm dando certo — tanto em crescimento quanto em realização pessoal.
Não vamos confundir mundo ágil com pressa. Dá para crescer e bater metas sem abater pessoas. E não, dormir não é para os fracos.