Tatiana Vidal é fundadora e gestora da GoAhead Consultoria
O bom vendedor já nasce com o dom, basta ter traquejo e ser extrovertido! Não, não é bem assim. Já não era no passado e isso se tornou evidente com a mudança no comportamento das pessoas, que agora compram de forma diferente.
Antes, se comprava itens básicos no varejo físico, como alimentos e produtos de higiene. Agora, a compra ocorre também no e-commerce e por diversos outros canais. Desta forma, a maneira de vender também se transformou, afinal, se não houver facilidade, não há conversão.
O que é óbvio no comportamento B2C, talvez, não esteja tão claro para quem lida com o B2B. Agora, a prospecção via redes sociais é uma realidade, ao passo em que transitar pelas empresas está ainda mais desafiador. No passado, o vendedor fazia parte de 90% do processo decisório do cliente. Desde as facilidades criadas pela internet e os meios de divulgação online, o indicador de tomada de decisão a partir da posição do vendedor foi caindo e o vendedor passou a ser procurado quando o cliente já tem mais de 60% da decisão tomada. A tendência é esse número continuar caindo a cada ano.
Então, acabou a profissão de vendedor no pós-pandemia? Pelo contrário, comprar é um processo mais complexo, sobretudo no B2B, que exige soluções para as novas necessidades das empresas, como melhorias em sistemas financeiros, tecnologia, serviços, passando por produtos agrícolas e embalagens. No momento atual, vender exige o domínio de ferramentas analíticas para priorizar clientes, avaliar o potencial de compra, compreender a estrutura da decisão, identificar o que é relevante para o prospect e construir relacionamento. São necessários recursos e habilidades que vão além da boa e velha simpatia.
A mudança é estrutural, pois hoje as empresas não buscam, por exemplo, mais por uma embalagem de papelão, mas desejam uma proteção adequada ao produto, a redução do custo ou a composição em matéria-prima sustentável, dependendo dos objetivos de cada empresa. Agora, qualquer suprimento deve gerar ganhos reais ao negócio, seja em rentabilidade ou atendimento aos valores que norteiam a ESG.
Para acompanhar essa necessidade, os vendedores deixam de ser apenas relacionais, mas analíticos e ainda mais orientados ao negócio. A formação de vendedor exige técnicas, a compreensão profunda do produto, o domínio das ferramentas de vendas e inteligência de mercado, além da gestão da carteira de clientes.
Do ponto de vista de desenvolvimento profissional, há pouco espaço para ser reativo, é hora de ser transformador. Para mim, o oposto de reativo agora não é mais ser proativo, mas criativo. E junto desse movimento, a pandemia fortaleceu a conexão entre a empresa e os colaboradores, criando uma conexão e o engajamento que os bons líderes podem aproveitar.
Nesse contexto, a pandemia revelou talentos em que a principal capacidade é a busca pelo aprendizado contínuo. Investir na capacidade do time é essencial, mas se o líder não se adaptar ao novo momento, toda a estratégia de crescimento baseada na força de vendas vai diluindo até se apagar ao longo do tempo. O novo líder de vendas deve formar o novo vendedor. Mais do que dizer qual a meta da empresa, é necessário orientar como fazer, analisar as métricas e indicadores para entender se a equipe está desempenhando a missão como deve e o principal: liderar pelo exemplo.
Ao longo da minha carreira, vi muitas transformações. São mais de dez anos formando equipes de alto desempenho na área comercial, com mais de 11 mil profissionais capacitados de 140 empresas diferentes. Por isso, posso garantir que o desafio atual é uma mudança real de mentalidade, indo muito além de novos conceitos e técnicas, pois o bom vendedor precisa fazer uma transformação estrutural na forma de vender e entender o seu papel dentro da equipe e da própria empresa.
E agora, o grande desafio das lideranças comerciais e das áreas de Recursos Humanos das empresas é acolher estes profissionais de maneira humanizada, ao mesmo tempo em que promovem a mudança de comportamento necessária para a nova dinâmica de mercado.
E quem é o bom vendedor no pós-pandemia? Hoje, é um profissional atento à necessidade de reciclagem constante da forma de vender, deixando no passado terrenos conhecidos. É um autotransformador, que entendeu que a experiência é rica, mas a adaptação é fundamental para a permanência no mercado e a geração de valor às companhias. E este formato pode mudar amanhã, pois os novos tempos exigem do vendedor um profissional maleável. Não cabe mais ser apenas resiliente, mas antifrágil, apreciando a volatilidade para se transformar e evoluir a partir dela.