Virgilio Marques dos Santos, CEO da FM2S Educação e Consultoria
Seja sincero(a): quem manda na sua carreira? Seu chefe? Família? Cônjuge? Pais? Filhos? Ou você mesmo? Aposto que é você quem manda em sua carreira. Agora, a segunda pergunta: qual você? É sua versão mais acomodada? Ou a que sonha alto? Àquela que tem traumas a resolver, ou a que sabe realmente o que quer? É a que tem orgulho de conseguir as coisas jogando duro, ou que prefere seguir as regras e conseguir o que é seu por direito? Nesse artigo, gostaria de tratar dos diversos “eus” que habitam nossa mente e constantemente interferem em nossa carreira e em nossas vidas.
Se você é como eu, a discussão com as personalidades internas às vezes é maior do que com as pessoas que o influenciam. Dependendo da “lua”, podemos tomar decisões diferentes, como falavam os antigos. E, quando analisamos as decisões tomadas ao longo da nossa carreira, temos várias surpresas de como isso nos influenciou.
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Escolhendo a graduação
Aqui começa nosso dilema. Quando estava decidindo o que prestar no vestibular, muitas coisas passavam pela minha cabeça. Meu lado sonhador pedia para me tornar piloto da força aérea ou, no mínimo, piloto comercial. Ao pensar nisso, meu lado racional mostrava-me os riscos e os desafios da profissão. Era um investimento muito alto para pouco retorno, assegurava-me o cara do planejamento. Por que não dá ouvidos ao seu amor pela física e faz engenharia?
Claro, mas qual engenharia? Por que não aeronáutica? Porque não, falava-me o vaidoso. Eu poderia prestar o ITA e assegurar meu nome nos registros da escola como um dos poucos que lá passaram. Porém, para isso, teria de abrir mão de muita coisa que o adolescente gostava. Esse me dizia que sexta-feira era para o futebol e que, aos sábados, para os churrascos e encontros da turma. Afinal, só temos 15 uma vez.
O fim dessa discussão culminou na minha escolha pela engenharia aeronáutica, mas colocando como segunda opção a mecânica. Deu que não passei na primeira e meu lado acomodado gritou para que tirasse da cabeça a ideia de cursinho. Me convenceu (a gente é ótimo nisso) que, no fundo, engenharia era tudo igual e que era melhor não trocar o certo pelo duvidoso. Lá fui eu fazer uma engenharia que, em tese, tinha possibilidade de construir aviões no futuro.
Estágio: o segundo ponto de discussão
Essa fase na carreira é muito interessante. Há pessoas que não têm opção, por isso escolhem a empresa que os acolheu e pessoas que têm conflitos. Para esses últimos, sempre o estágio do vizinho é melhor que o seu. Para ter uma ideia da aleatoriedade do meu estágio, fui para um banco de atacado. Por que? Talvez pelo prestígio que meu lado vaidoso vislumbrava naquele ambiente. Todos de terno fino, grandes salários e bônus vultosos, além de várias outras características que meu imaginário jurou para mim.
O vaidoso também mostrava que só 40 seriam escolhidos entre os mais de 9 mil candidatos. 225 candidatos por vaga, um insumo imprescindível para essa voz gritar ao meu ouvido, tentando esquecer o outro processo que havia sido preterido. E dar guarida ao ansioso que estava participando de mais 10 processos, morrendo de medo de não passar em nada e não conseguir formar-se em “fase”.
Quanto conflito entre minhas personalidades e vozes internas em apenas um mísero estágio. Hoje, o maduro profissional de 38 anos sonha todo dia em voltar no tempo, para avisar o vaidoso, ansioso e inseguro, que as coisas iriam dar certo. Era só trabalhar duro e controlar esses perfis complicados que moravam nele à época.
Nesse período, o maduro que hoje me ajuda a tomar as decisões da minha carreira e vida simplesmente não existia. É por isso que, hoje, mentoramos nossos estagiários.
Na ausência da maturidade interna, o auxílio de fora ajuda demais. Principalmente se estiver autoridade frente ao ego que os habita no período. Uma dica de um vice-presidente, sócio ou dono para um estagiário, conversa direto com o vaidoso, o ansioso e o inseguro que o controlam. Esses três respeitam demais o sucesso pregresso.
E os conflitos continuam…
Passado o estágio, as coisas continuam mais ou menos como antes. As mudanças são sutis e causadas por eventos importantes, como demissões, rompimentos de relacionamentos, brigas familiares, falências, acidentes e por aí vai. Amadurecer pela dor é complicado, mas recorrente.
No meu caso, a crise de 2008 foi a primeira aula de que a personalidade de sucessor dos negócios da família, cheio de exemplos no Brasil, não seria a realidade para mim. Quando as vendas da empresa despencaram, com um endividamento de 2 meses, o lado pragmático me demitiu do negócio. Naquele período, era mais importante a sobrevivência da fábrica do que meu sucesso como administrador.
Em seguida, ao abrir o meu negócio próprio, o vaidoso quase morreu. Há relatos que ele passou a viver escondido em algum lugar, sempre tentando levar a discussão do meu faturamento para algum lugar que fizesse sentido. Entretanto, longos anos foram necessários para que o orgulho pudesse aparecer no horizonte. Nesse período, aparecia em minha mente diariamente o responsável por mostrar que meus colegas de faculdade estavam melhores que eu. Todo dia, tinha mais certeza de que não teria sucesso como empreendedor e essa decisão havia me desconectado do futuro que tinham meus colegas.
Depois de relativo sucesso, entrou em cena o inseguro. Mesmo conseguindo um salário razoável, o inseguro me questionava todo dia se tinha real capacidade ou se era apenas sorte. Será que, perguntava ele, se estivesse numa grande empresa, eu seria bem avaliado? Ou será que a percepção que eu possuía de mim mesmo era apenas gabolices proferidas pelo quase morto vaidoso, que havia ressurgido nesse período?
Em 2014, dei ouvidos ao inseguro e mergulhei numa grande empresa, como gerente. Rapidamente eu pirei. O conflito era enorme, entre todos os que em mim coexistiam. O aluno, que estava aprendendo como a grande empresa funcionava, era a todo momento questionado pelo inseguro. O cdf, que seguia as regras da companhia, era posto na parede pelo negociador, que sabia que, para ser promovido lá, era preciso colocar a galera contra a parede.
Além desses, o engenheiro discutia todo dia com o negociador e o marketeiro. Apresentar um gráfico no Minitab era o máximo para o engenheiro, mas o perfil do marketing me falava para seguir o esquema de gráficos no Power Office. O gráfico de tendência correto, na visão do técnico, dava lugar ao gráfico de barras que o puxa saco colocava para agradar. Não era fácil.
A tensão só era atenuada quando algum errante líder passava por mim e me ajudava a acalmar as tensões internas, reforçando a importância de agir como o nerd técnico. O puxa saco, de tanta proximidade com o técnico, acabou fundindo-se num negociador melhor. E o marqueteiro dos gráficos errados tornou-se alguém que me ajuda até hoje a resumir pensamentos.
Foi fundamental, para o sucesso na carreira, ter controle sobre todo esse pessoal. Com o tempo, o maduro foi tomando conta dessa galera e começou a liderá-los. Hoje, correr 15 km já é possível, pois o ansioso é distraído por um bom podcast. O cara de poucas palavras se aproximou mais dos colaboradores e se tornou muito mais produtivo. Por isso, termino com a pergunta: quem manda na sua carreira? Você, ou as vozes que ouvimos em nossa mente? É tempo de reflexão e, por isso, nos ajude comentando umas das suas personalidades aqui.
Quem me conhece e olha, tenho certeza, não imagina a galera toda conversando aqui dentro. É preciso aproveitá-la, mas sempre os tendo sob controle rígido. Seja com a corrida, com a leitura, com um papo interessante ou correndo atrás das crianças. Não há personalidade afoita que resista ao sorriso e à energia de uma criança.