A maioria dos planos possui um termo de opção ou vencimento da opção (expiration date), que se traduz no prazo máximo para o empregado exercer sua opção de compra
Andreza Ribeiro, Daniela Yuassa e Paola Carrara de Sambuy Gomes
Como estratégia, as companhias implementam planos de incentivo de longo prazo baseados em ações com o intuito de alinhar os interesses entre seus colaboradores e seus acionistas, de forma a maximizar o seu desempenho, assim como atrair e reter profissionais-chaves para o negócio. Atualmente, é parte da grande maioria dos pacotes de remuneração de executivos, a inclusão desse tipo de incentivo.
A princípio, a decisão parece simples. Mas, ao se debruçar sobre o tema, a companhia se depara com diversas modalidades de planos baseados em ações, tais como os Planos de Opção de Compra de Ações ou Stock Option Plans, os Phantom Shares Plan, os Planos de Ações Restritas ou Restricted Shares Plans, que levam em conta estratégias distintas de remuneração e possuem diferentes impactos societários, fiscais e trabalhistas.
Em linhas gerais, os Stock Option Plans são estruturados por meio de um plano a ser aprovado em assembleia geral de acionistas, programas a serem aprovados pelo conselho de administração e um contrato escrito a ser firmado entre a companhia e os beneficiários – empregados, diretores, administradores ou prestadores de serviço (pessoas naturais). Esses documentos estabelecem as condições e critérios de exercício das opções, tais como as condições de aquisição, número de ações que o beneficiário terá direito, preço de exercício (strike price), prazo de carência (vesting), vencimento, dentre outras. Uma vez observado o prazo de carência e cumpridas as condições previstas, o beneficiário poderá exercer a opção de compra, adquirindo as ações segundo a quantidade estabelecida, mediante o pagamento do preço de exercício.
No momento subsequente ou após a observância de um prazo de restrição de negociação das ações (lock up period), o beneficiário poderá negociar suas ações ou permanecer com o investimento (ações) efetuado.
A maioria dos planos possui um termo de opção ou vencimento da opção (expiration date), que se traduz no prazo máximo para o empregado exercer sua opção de compra. Após o término desse prazo, o beneficiário perde o direito de exercer a compra das ações.
É comum que uma companhia, ao implementar um Stock Option Plan, pretenda obter o tratamento de uma operação mercantil, de forma que, no momento do exercício das opções, não haja repercussões fiscais ou trabalhistas para a companhia ou para os beneficiários.
Nos planos de caráter mercantil, os beneficiários só são tributados na venda das ações, se a venda for efetuada por valor superior ao preço de exercício pago. O ganho de capital auferido pelos participantes pessoas físicas na venda de ações fora de bolsa é tributado de acordo com as alíquotas progressivas, que variam de 15% a 22,5%[1]. Já o ganho líquido auferido na venda de ações em bolsa é isento de tributação, se o total das alienações realizadas no mês não exceder a R$ 20.000,00, ou tributado à alíquota fixa de 15%.
Mas a atribuição da natureza mercantil aos planos de opção depende da observância de diversas características, dentre as quais destacam-se: (i) objetividade: o plano de opção de compra de ações não deve se pautar na performance individual do participante, mas em critérios objetivos relacionados ao desempenho da empresa, de modo a evitar o caráter de contraprestação por serviços prestados pelo participante do plano; (ii) voluntariedade: o participante deve possuir a prerrogativa de aceitar, ou não, a outorga da opção, bem como de exercer, ou não, a opção outorgada, tal como uma oportunidade comercial; (iii) onerosidade: o participante do plano, por ocasião do exercício da opção, deve pagar pelas ações adquiridas com recursos próprios e esse preço de exercício deve guardar relação com o preço de mercado da ação, não sendo irrisório ou simbólico. Em alguns casos, recomenda-se a fixação de um prêmio para a aquisição das opções; e (iv) risco: o ganho do participante do plano deve decorrer da apreciação do valor da ação no tempo e não da estipulação de condições de compra e venda que lhe assegurem um ganho certo ou praticamente certo.
Se, por um lado, a observância dessas características tende a assegurar um tratamento fiscal e trabalhista mais benéfico da perspectiva da companhia, por outro lado, reduz a atratividade dos planos para os beneficiários, pois exige um desembolso financeiro, muitas vezes não compatível com a remuneração dos executivos. Para as companhias fechadas, a avaliação do preço de mercado da ação não é simples e a aplicação de métodos de mercado, como a fórmula Black-Scholes ou múltiplos de EBITDA, tende a inviabilizar o pagamento por parte dos beneficiários. Já para as companhias abertas, o preço de mercado é evidente, mas a concessão de descontos, ainda que não substanciais, tem sido objeto de questionamentos, o que também dificulta a implementação do plano.
E ainda que todos os requisitos acima sejam atendidos, o risco de autuação permanece. As autoridades fiscais têm sustentado que a natureza remuneratória seria inerente aos planos de ações celebrados entre empresas e empregados, porque por meio deles são oferecidas vantagens que não se verificam em operações de mercado, como a outorga de opções de compra de ações sem pagamento de prêmio ou a concessão de um desconto. E esse entendimento tem sido validado em decisões da Câmera Superior de Recursos Fiscais e do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, órgãos responsáveis pelo julgamento dos autos de infração.
Na hipótese em que os rendimentos auferidos pelos participantes de um plano de opções sejam tributados como ganho de capital e posteriormente caracterizados como remuneração por serviços prestados, o procedimento normalmente adotado pela Receita Federal é considerar tributável a diferença positiva entre o valor de mercado da ação, na data do exercício, e o respectivo preço de exercício, e exigir as contribuições previdenciárias e o imposto de renda retido na fonte. Eventual cobrança será acompanhada de multa de ofício de 75% e juros SELIC.
Especificamente sobre o imposto de renda retido na fonte, na maior parte dos casos, o auto de infração é lavrado contra os beneficiários pessoas físicas e não contra a companhia[2], o que costuma causar um grande desconforto para os executivos e, em casos limites, o bloqueio de bens particulares.
A outorga dos Stock Option Plans também deve levar em conta o fato de que, nessa modalidade de plano, os beneficiários se tornam acionistas das companhias. Essa característica é bastante atrativa à luz dos objetivos de alinhar os interesses dos beneficiários e da companhia, sendo o plano um instrumento hábil para trazer um “sentimento de dono” aos participantes do plano. No entanto, desse fato, decorrem diversas questões que merecem ser analisadas.
A outorga e o exercício de opções outorgadas no âmbito de Stock Option Plans caracterizam exceção à regra geral relativa ao direito de preferência previsto na Lei das S.A., atribuído aos atuais acionistas da companhia. Desta forma, referidos acionistas não terão direito de preferência para aquisição das opções e/ou subscrição das novas ações, de modo que serão automaticamente diluídos. Por essa razão, ao aprovar o Plano, no âmbito de uma assembleia geral, deverá ser estabelecido o limite máximo de diluição.
Uma vez que as opções sejam exercidas e as ações adquiridas, no caso de companhias fechadas, também se torna necessário discutir a celebração de um acordo de acionistas, para tratar a relação dos beneficiários como acionistas da companhia, incluindo regras relativas à recompra de ações, tag along, drag along, lock-up, hipóteses de sucessão, dentre outras. Para companhias que buscam investidores externos, é essencial analisar se a existência de um quadro de acionistas pulverizado, com diversos acionistas minoritários, pode causar algum ruído na negociação com esses potenciais investidores ou prever mecanismos para manter a gestão no nível dos controladores.
Há que se prever ainda as regras de desligamento. Alguns planos preveem a antecipação do período de carência e a possibilidade de recompra das ações adquiridas se o beneficiário se desligar da empresa. No caso de companhias fechadas, não é interessante manter antigos colaboradores no quadro de acionistas, com acesso a informações estratégicas sobre a sociedade.
Já outros planos estabelecem que o beneficiário só teria direito a exercer as opções e adquirir as ações se permanecer na empresa. Especificamente quanto à questão do cancelamento das opções em situações de desligamento, a perda do direito pelo participante pode dar margem a discussões judiciais. Há decisões proferidas na esfera trabalhista no sentido de que a demissão sem justa causa de um empregado beneficiário de plano de opções, durante o curso do período de carência, obstaria a regular fruição do direito pelo colaborador, gerando, assim, direito à indenização substitutiva, especialmente nos casos em que o empregado beneficiário tenha sido desligado às vésperas de cumprir a carência em questão (vesting).
Para as sociedades que adotam a forma de limitada, há desafios adicionais na concessão de Stock Option Plans. Atualmente, apenas a Lei das S.A. regula como se dá a instituição dos planos. Embora seja possível defender a aplicação supletiva da Lei das S.A. a essas sociedades, a estrutura imposta pelo Código Civil dificulta a implementação. As quotas das sociedades limitadas possuem valor definido, o qual deverá ser o preço de exercício, sendo que, em regra, não tem relação com o valor de mercado. Adicionalmente, dentre outras questões, exige-se a alteração do contrato social a cada admissão ou exclusão dos participantes por conta do plano.
Por todas as questões e riscos envolvendo os Stock Options Plans, muitas companhias têm optado pelos chamados Phantom Shares Plan.
Os Phantom Shares Plans também são estruturados por meio de um contrato escrito, firmado entre a entidade e os beneficiários. Nessa modalidade, a companhia não outorga opções de compra de ações, mas o direito ao recebimento de determinado montante atrelado ao valor das ações. Nesse caso, o beneficiário não se torna acionista da companhia, mas participa, por meio do plano, dos resultados positivos correspondentes à valorização das ações.
Da perspectiva fiscal e trabalhista, pelo fato de o beneficiário receber um montante atrelado ao valor de mercado ou valorização das ações da empresa em certo período, sem efetuar qualquer investimento para adquirir o direito a esse recebimento ou incorrer em riscos, o valor pago no âmbito de um Phantom Shares Plan é tratado como remuneração, sujeito à incidência do imposto de renda retido na fonte, das contribuições previdenciárias e dos encargos trabalhistas. O elevado desembolso de caixa é um fator negativo a ser avaliado na concessão dessa modalidade de incentivo.
Alguns pontos chamam a atenção na adoção dos Phantom Shares Plan. Esse plano não envolve o efetivo pagamento de preço de exercício, o que o torna bastante atrativo para os participantes do plano e mais adequado para companhias mais maduras, cujo preço de exercício fixado com base em métricas de mercado poderia inviabilizar a aquisição pelos beneficiários ou reduzir a adesão do plano.
Além de permitir estruturas mais flexíveis, por não haver a aquisição efetiva das ações, os Phantom Shares Plan não resultam na diluição dos antigos acionistas e os empregados e executivos não passam a integrar o quadro de acionistas. A gestão e a tomada de decisões não são impactadas, sendo um fator a ser considerado, principalmente, quando há intenção de ingresso de potenciais investidores externos na companhia.
Por outro lado, nessa modalidade, a companhia não outorga opções de compra de ações, mas efetua o pagamento de determinado montante, cujo cálculo é atrelado ao valor das ações, podendo, assim, ser pouco eficaz para promover um “sentimento de dono” aos beneficiários. Não obstante, tais planos têm se mostrado adequados quando o objetivo é atrair e reter talentos pela perspectiva de receber uma remuneração variável atrelada ao valor da empresa.
Outra modalidade comum no mercado brasileiro refere-se ao Restricted Shares Plan, habitualmente implementado por meio da concessão, a colaboradores e executivos, de ações de emissão da companhia com negociação restrita por um determinado período.
Em regra, as ações objeto dos Restricted Shares Plans não são adquiridas pelos beneficiários, mas concedidas de forma gratuita. Trata-se, portanto, de uma remuneração variável paga em ações, devendo ser recolhidos o imposto de renda retido na fonte, as contribuições previdenciárias e os encargos trabalhistas na transferência das ações aos participantes do plano. Adicionalmente, há que se analisar os impactos societários relativos a cada companhia, anteriormente à estruturação de um plano de incentivo de longo prazo nesse formato.
O Restricted Shares Plan é bastante eficiente para promover a atração e retenção de talentos, ao mesmo tempo em que confere o almejado “sentimento de dono” aos seus participantes. Contudo, pelo fato de os beneficiários passarem a integrar o quadro de acionistas, todas as questões já mencionadas relativas aos Stock Option Plans estão presentes nessa modalidade, incluindo a avaliação acerca da necessidade de celebração de acordos de acionistas.
Existem outras modalidades de planos além dos analisados acima, como os Matching Shares, nos quais há outorga de ações bonificadas pela companhia, após a aquisição pelos beneficiários; ou os planos de Partnership, que se caracterizam pela outorga do direito de compra de ações a valor de mercado, direito usualmente exercido de maneira imediata. Cada plano possui características e repercussões próprias.
Dessa forma, não há que se falar em plano superior ou melhor em comparação a qualquer outro, mas no plano que mais se enquadra frente às estratégias de cada sociedade. Essa análise deve ser feita à luz dos impactos societários, fiscais e trabalhistas de cada plano, bem como levar em consideração a fase de maturação, objetivos e necessidades da companhia.
[1] As alíquotas progressivas são aplicadas da seguinte forma: (i) 15% sobre a parcela dos ganhos que não ultrapassar R$ 5.000.000,00; (ii) 17,5% sobre a parcela dos ganhos que exceder R$ 5.000.000,00 e não ultrapassar R$ 10.000.000,00; (iii) 20% sobre a parcela dos ganhos que exceder R$ 10.000.000,00 e não ultrapassar R$ 30.000.000,00; e (iii) 22,5% sobre a parcela dos ganhos que ultrapassar R$ 30.000.000,00.
[2] O auto de infração é lavrado contra o beneficiário em razão da aplicação da legislação fiscal.