Como transformar a responsabilidade social corporativa em uma estratégia de cultura organizacional viva, engajando colaboradores, fortalecendo a marca e alinhando propósito à prática.
Colunista Mundo RH, Fabiana Galetol, Diretora Executiva de Pessoas e Responsabilidade Social Corporativa da Pluxee
Em tempos em que a confiança se tornou um ativo escasso, a forma como uma empresa se posiciona diante das questões sociais diz mais do que qualquer campanha publicitária. A responsabilidade social deixou de ser uma extensão da comunicação institucional e passou a ocupar um lugar central — o da coerência entre discurso e prática. E esse movimento começa de dentro: são os colaboradores, que vivem a cultura organizacional no dia a dia, os primeiros a perceber se há ou não consistência entre o que se diz e o que se faz. Porque, no fim das contas, conduzir uma organização hoje significa mais do que gerir operações ou entregar resultados — é construir uma empresa com propósito, que entende seu papel na sociedade e age de forma responsável em todas as suas dimensões.
Nos últimos anos, o discurso sobre propósito ganhou destaque no mundo corporativo. Mas, para que esse discurso tenha legitimidade, ele precisa ser vivido — e não apenas comunicado. Cada vez mais, colaboradores avaliam a coerência entre o que a empresa afirma defender e o que ela pratica. E isso não diz respeito apenas a grandes causas ou compromissos públicos, mas também às pequenas escolhas cotidianas: quem a empresa promove, o que valoriza, como escuta e inclui. Nesse contexto, a responsabilidade social corporativa (RSC) se consolida não como um apêndice da estratégia, mas como parte da própria arquitetura organizacional.
O impacto interno de uma agenda que parecia externa
Tradicionalmente associada à relação das empresas com a sociedade, a responsabilidade social é também um elemento estruturante da cultura organizacional. Ela orienta comportamentos, inspira pertencimento e fortalece vínculos. Quando bem estruturada, a RSC cria oportunidades reais de conexão entre colaboradores e valores organizacionais. Programas de voluntariado, apoio a causas sociais, práticas inclusivas e diálogo com a comunidade são exemplos de como transformar intenção em ação — e ação em engajamento.
Essas experiências têm um efeito poderoso sobre o clima organizacional. Quando os funcionários percebem que sua empresa tem compromissos concretos com a transformação social, é comum que desenvolvam maior senso de propósito no trabalho e maior orgulho de pertencer àquela organização. Segundo pesquisa da McKinsey, colaboradores que veem alinhamento entre seu propósito pessoal e o da empresa têm mais que o dobro de engajamento em comparação com os demais. Ou seja, fazer o certo é estratégico.
Engajamento, reputação e valor de marca: uma equação conectada
Marcas que assumem uma atuação social consistente ganham força também fora da empresa. Isso porque reputação e cultura organizacional andam juntas. Uma marca empregadora forte se constrói com segurança psicológica, propósito claro, benefícios, oportunidades de carreira e, acima de tudo, com coerência — aquilo que sustenta a confiança de colaboradores, clientes e parceiros.
De acordo com a pesquisa “Responsabilidade Social Corporativa na América Latina em 2024”, realizada pela Sherlock Communications, 90% dos brasileiros afirmam que práticas de responsabilidade social e ambiental influenciam diretamente sua opinião sobre as empresas. Além disso, 77% dos entrevistados declaram consumir produtos ou serviços apenas de empresas socialmente responsáveis.
A lacuna entre intenção e prática é percebida com rapidez — e gera desgaste. Por isso, o compromisso com a responsabilidade social precisa ser contínuo, transparente e transversal, estando presente tanto no planejamento estratégico quanto nos indicadores de gestão de pessoas, nas metas de diversidade e nos processos de liderança.
Entre intenção e prática, há desafios que não podem ser ignorados
Implementar uma agenda sólida de responsabilidade social exige mais do que boas intenções. Na prática, muitas empresas enfrentam obstáculos como a dificuldade de alinhar as iniciativas à estratégia do negócio, a escassez de recursos dedicados e a resistência de lideranças que ainda veem a RSC como um custo ou uma pauta secundária.
Soma-se a isso o desafio de medir impacto de forma objetiva e o risco de cair em discursos vazios, pouco coerentes com a prática. Além disso, quando surgem crises envolvendo questões sociais ou ambientais, é a consistência dessa agenda que será colocada à prova.
Mas vale ressaltar que esses pontos não invalidam a importância da RSC — pelo contrário: reforçam a necessidade de tratar o tema com profundidade, governança e autenticidade.
RSC como alicerce do ESG — e não um anexo
Nos debates sobre ESG, costuma-se dar muito peso aos pilares ambiental e de governança — com foco em riscos, métricas e compliance. Mas é no pilar social que se revelam as escolhas mais humanas, aquelas que impactam diretamente as pessoas e os territórios onde as empresas atuam.
O “S” do ESG não se resume à filantropia. Ele inclui condições de trabalho dignas, diversidade em todos os níveis, inclusão produtiva, educação, apoio à saúde mental, respeito à equidade. São temas que não podem ser apenas respondidos — precisam ser antecipados com intenção e responsabilidade.
E não se trata apenas de atender a uma demanda externa. Trata-se de entender que empresas existem dentro de um ecossistema mais amplo, no qual a sustentabilidade do negócio depende da sustentabilidade das relações que constroem.
A construção de ambientes de trabalho mais justos, diversos e conectados com a realidade social é, hoje, uma exigência ética — mas também uma escolha estratégica. A responsabilidade social corporativa, bem aplicada, não resolve tudo, mas transforma muito: muda a forma como as pessoas se relacionam com a empresa, como ela se posiciona no mercado e como é lembrada — em momentos de crise ou conquista.
Em um tempo em que as pessoas buscam mais do que estabilidade — buscam conexão e propósito —, a responsabilidade social deixa de ser uma escolha opcional e se torna parte do próprio significado de existir como empresa. Mais do que entregar resultados, espera-se que as organizações deixem uma marca positiva nas pessoas e nos territórios onde atuam. Ser relevante, hoje, é ser responsável — não só com o negócio, mas com o mundo ao redor.