Nenhuma empresa está livre de enfrentar os temidos ruídos e falhas, que podem evoluir para boatos e desencadear crises de imagem e até mesmo de reputação
Comunicação informal ganhou muito espaço nas empresas, especialmente com equipes afastadas do formalismo e hierarquias rígidas, em tempos de mídias sociais. Mesmo assim, as perspectivas mudaram e a visão da comunicação com as pessoas também: não basta informar, é preciso engajar. Há quem ainda ache que existem empresas livres do fenômeno das redes paralelas ou não oficiais de comunicação.
Nenhuma empresa está livre de enfrentar os temidos ruídos e falhas, que podem evoluir para boatos e desencadear crises de imagem e até mesmo de reputação. Mas, a questão é que poucas empresas possuem sistemas, técnicas e até mecanismos para gerenciamento dessas situações. Vamos, então, entender os conceitos de ruídos na comunicação.
O que são ruídos na comunicação?
Conteúdo que se relaciona a eventos do cotidiano, o boato pode ser aumentado e transmitido pelas pessoas a partir da famosa técnica do “ouvi dizer”, sem que existam dados concretos que testemunhem sua exatidão. Não à toa, autores que vão de Robert Knapp (1944) a David Kahneman (2021) se debruçaram, nos últimos 70 anos, sobre esse tema tão intrigante.
Quando um gestor descobre que há um ruído pairando no ar, em geral, a primeira ação é tentar colocar o tema para baixo do tapete. Será essa a melhor forma de gerenciamento? Claro que não! Enquanto os rumores e ruídos são os estágios iniciais de um boato, o boato é uma informação ainda não checada, que nasce em contexto de medo e dúvida. Não necessariamente falsos, os boatos são uma tentativa de criar explicações para fatos ainda não esclarecidos ou elucidados no contexto da empresa. Na falta de informação e de canais de escuta e feedback, nascem ruídos e fofocas.
Agora, vamos falar da fofoca: ela tem como objetivo a manutenção dos laços sociais e o reforço dos vínculos e muitas vezes, é utilizada para conseguir ‘assunto’ ou ‘fazer parte de um grupo’. Por isso, a gente pensa que é tudo igual, mas rumor, fofoca, ruído, mexerico, boato e fake news são bem diferentes, conforme meus estudos de mais de 20 autores da área de comunicação, gestão e psicologia social.
Por isso, antes de condenar o colaborador, é preciso mergulhar no contexto em que a fofoca foi gerada, o setor em que circulou e as motivações que a levaram a viralizar na empresa.
Que caminho um boato percorre?
O sociólogo Edgar Morin considera que os boatos percorrem um caminho rápido, do emissor até sua cadeia de transmissão, tendo três fases em seu ciclo: incubação (quando, diante uma dúvida ignorada, ele nasce), propagação (se espalha rápido pela empresa) e metástase (morre, sendo combatido com a informação e resposta às dúvidas).
Dentre os fatores que contribuem para sua rápida transmissão, estão o medo de demissão, a falta de informações assertivas diante de dúvidas e conflitos e o desinteresse da liderança em ouvir reivindicações dos times, o que também é potencializado pela perda de confiança, surgimento de um clima de insegurança e fortalecimento das chamadas redes de comunicação informais.
Como gerenciar uma fofoca na empresa?
Apesar de a maioria dos estudiosos apontar que não é possível haver empresas totalmente livres dos boatos, Sam Chapmam recomenda que, a fim de reduzir o solo fértil para eles, é preciso:
1) identificar sua fonte de origem;
2) administrá-los e convidar os envolvidos para um diálogo aberto;
3) criar um programa de comunicação com colaboradores;
4) trabalhar a transparência e confiança nas lideranças, estimulando trocas e feedbacks, em vez de separar ainda mais líderes e liderados.
Comunicação é um processo de diálogo que vai além de informar e enviar mensagens. Por isso, se a empresa quer ter uma comunicação saudável e desenvolver anticorpos contra boatos ou atenuar suas perigosas consequências, é fundamental estimular a cultura do feedback, promover conteúdos e campanhas que envolvam o colaborador em primeira mão e fazer parcerias com embaixadores e influenciadores internos.
Impactos dos boatos e fofocas nas empresas
Existem muitos fatores organizacionais que podem contribuir para o aparecimento e difusão dos boatos. O primeiro grande risco que um boato corporativo pode trazer para a organização é perda da confiança que suas partes interessadas têm nela, ou seja, seus públicos de interesse ou stakeholders. Essa perda, em médio e longo prazo, pode comprometer o valor das ações, culminar na perda de patrocínios, investidores e afastar acionistas.
Se pensarmos no colaborador, que é o maior embaixador potencial de uma marca, a existência de um boato nos times pode gerar um clima organizacional negativo e impulsionar uma onda de demissões.
Além dos pontos acima mencionados, de perda de confiança, a reputação corporativa também costuma ser afetada, por mais que a empresa tenha uma imagem sólida, se ela não sabe agir ou se defender diante de uma onda de boatos, será abalada.
Outra ameaça que os boatos potencializam, além de perda de credibilidade e impactos na imagem e reputação da empresa é a sensação de insegurança e o temor diante de mudanças não anunciadas, como fusões e aquisições.
Se um grupo de colaboradores acredita no boato de que haverá demissões em massa, a sensação de medo e conflito irá se espalhar na organização.
Quando pensamos em mídias sociais, um boato organizacional, ao encontrar influenciadores e perfis atuantes na empresa, pode ter sua velocidade de propagação potencializada, gerando o fenômeno das cadeias de contágio, ou seja, quando um perfil passa a adotar um comportamento por influência de outros, sem ao menos questionar ou checar os fatos. Sendo uma cascata negativa, poderá arruinar a reputação da empresa em pouco tempo. Então, os 5 principais impactos dos boatos organizacionais para as empresas são:
1) Perda de credibilidade;
2) Crises de imagem e reputação;
3) Redução do número de parceiros, patrocinadores e etc;
4) Clima organizacional negativo;
5) Cascatas de informação negativas nas mídias sociais.
Nesse sentido, para que possamos ter uma comunicação, de fato, efetiva, precisamos romper o primeiro desafio, que é a tendência natural de as organizações optarem pelo silenciamento dos chamados temas sensíveis, pensando que esse é o melhor caminho.
Uma comunicação efetiva e assertiva nada tem a ver com excesso de conteúdo, quantidade de canais, campanhas ou formato de conteúdo. É muito mais sobre o poder de conexão do que volume. Por isso, é muito importante ouvir antes de condenar para a busca de uma comunicação efetiva.
Por trás de todo ‘ouvi dizer’ há um ‘preciso saber’. Ainda que seja pouco provável extinguir os boatos nesses ambientes, dada sua natureza tão humana, podemos e devemos entender as motivações que os originam e seu fluxo de circulação, assim como mapear os graus de ruído e possíveis riscos envolvidos. E agir antes que eles se disseminem, provocando insegurança emocional e prejuízos aos funcionários e às companhias.
Os boatos tendem a crescer quando os conteúdos das notícias e postagens falsas envolvem temas sensíveis e que geram comoção e apelo dos leitores, como questões de saúde (produtos que causam mal, por exemplo), política, atitude controversas de figuras públicas, escândalos sobre bens não declarados), erros e falhas em produtos, dentre outros.
Outro fator que amplia a difusão dos boatos é quando um influenciador digital compartilha essa informação não verídica e pelo seu grau de influência, muitas pessoas acreditam que tudo que ele compartilha é correto.
Diante do crescimento de boatos e do compartilhamento de informações falsas na internet, têm surgido diversos movimentos e iniciativas para diminuir tais índices.
Vamos checar antes de partilhar e interromper as cadeias de difusão de fofocas e boatos?
Por Isabela Pimentel – Jornalista, historiadora e autora do livro ‘“OUVI DIZER” – Comunicação Integrada como antídoto para boatos organizacionais’