Do discurso à prática: o desafio das empresas em promover um bem-estar real no ambiente de trabalho.
Ariel Almazán – Líder de consultoria em saúde da Mercer Marsh Benefícios na América Latina e Caribe
A saúde mental e o bem-estar emocional tornaram-se fatores críticos para a sustentabilidade dos negócios. Em um mundo do trabalho cada vez mais exigente, o tema representa, hoje, um indicador-chave do sucesso organizacional. No entanto, ainda há uma lacuna significativa entre o que as empresas dizem e o que de fato fazem. Trata-se, afinal, de um compromisso genuíno ou apenas de uma estratégia de relações públicas?
O fato é que a saúde mental está em risco, e as empresas não podem ignorar isso.
As edições mais recentes dos relatórios Health Trends e People Risk, ambos da consultoria Mercer, bem como um estudo regional sobre a gestão da saúde mental nas organizações, elaborado pela Mercer Marsh Benefícios, revelam tendências preocupantes. Os dados indicam uma falta real de atenção à saúde mental no ambiente corporativo.
Se, por um lado, 66% das organizações na América Latina relatam ter um programa de bem-estar emocional e cuidados com a saúde mental, e 77% afirmam ter uma pessoa responsável por gerenciá-lo, por outro, apenas 52% oferecem algum treinamento em saúde mental ou gerenciamento de bem-estar emocional.
Os dados também apontam que 56% das seguradoras não cobrem saúde mental especificamente para crianças, adolescentes e famílias, deixando de fora muitos trabalhadores que necessitam desse apoio.
Além disso, 42% das seguradoras não ajustaram franquias e coparticipação para compensar a inflação, o que aumenta os custos e dificulta o acesso ao tratamento de saúde mental.
A deterioração da saúde mental é uma das principais preocupações dos líderes de Recursos Humanos e Gestão de Riscos, pois impacta diretamente a produtividade, o absenteísmo e a rotatividade de talentos, segundo o relatório People Risk 2024.
Outro dado relevante é que 36% dos funcionários acreditam que a falta de liderança eficaz afeta seu bem-estar, criando ambientes de trabalho que promovem estresse e desmotivação.
Apesar desses números alarmantes, muitas organizações ainda encaram a saúde mental como uma questão secundária, implementando medidas simbólicas em vez de soluções estruturais.
O que não é um compromisso real com a saúde mental?
Workshops ocasionais de mindfulness ou palestras motivacionais: Sessões esporádicas não são suficientes se a cultura organizacional continua a promover sobrecarga de trabalho. Essas iniciativas podem ser úteis, mas devem fazer parte de uma abordagem mais ampla e sustentada.
Aplicativos de bem-estar sem um plano abrangente: Ter um aplicativo de meditação não compensa uma liderança tóxica ou um ambiente de trabalho insalubre. Ferramentas digitais devem ser complementadas por um ambiente que realmente promova o bem-estar.
Benefícios limitados e inacessíveis: Oferecer terapia com restrições de sessões ou longos tempos de espera apenas reforça o estigma e a falta de acesso real. É essencial que os funcionários sintam que podem obter o suporte necessário sem obstáculos.
Eventos de bem-estar isolados e sem mudanças estruturais: Um café da manhã saudável não resolve jornadas exaustivas ou a falta de suporte emocional no dia a dia. As iniciativas devem ser contínuas e integradas à cultura organizacional.
O que caracteriza um compromisso real com a saúde mental?
Políticas de bem-estar no ambiente de trabalho: Implementar direitos como desconexão digital, horários flexíveis e cargas de trabalho sustentáveis é essencial para criar um ambiente de trabalho saudável.
Liderança com responsabilidade emocional: Treinamento em inteligência emocional e gestão de equipes sem promover burnout. Os líderes devem ser exemplos na promoção da saúde mental.
Acesso a apoio psicológico sem barreiras: Cobertura adequada, terapia irrestrita e recursos acessíveis para todos os funcionários, incluindo a possibilidade de atendimento no local de trabalho.
Cultura organizacional que prioriza a segurança psicológica: Ambientes onde os funcionários possam expressar seu estresse ou preocupações sem medo de retaliação. Promover um espaço de confiança é fundamental para o bem-estar emocional.
A saúde mental não pode ser tratada como um benefício opcional ou uma estratégia de imagem. Empresas verdadeiramente comprometidas com o bem-estar de seus funcionários constroem confiança, retêm talentos e aumentam sua competitividade.
A verdadeira questão não é se as organizações devem falar sobre saúde mental, mas se estão dispostas a transformar sua cultura para tornar esse bem-estar uma realidade. A saúde mental é um ativo valioso que, quando bem cuidado, pode gerar um aumento significativo na produtividade e na satisfação dos funcionários.
Em um mundo onde o bem-estar emocional se tornou prioridade, as empresas têm a responsabilidade de agir e criar ambientes de trabalho que não apenas reconheçam, mas também promovam a saúde mental como um componente essencial do sucesso organizacional.