O futuro da indústria da hospitalidade requer habilidade para entender o momento e tomar as medidas necessárias para mudar
Paulo Mélega é vice-presidente de Operações da Atrio Hotel Management
Em 27 de setembro de 2023 viveremos o primeiro Dia Mundial do Turismo livres da emergência global. Livres, mas não ilesos já que mudanças resultantes da pandemia convivem conosco há algum tempo e outras deverão nos acompanhar pelos próximos anos.
O fato é que o risco sanitário diminuiu, mas a gestão dos negócios ainda demanda atenção, já que as mudanças no comportamento do viajante trazem impactos mais óbvios e outros menos visíveis para a indústria, de modo geral, e para operação hoteleira, em particular.
O bleisure, movimento que já era citado antes da pandemia, consolidou as viagens com multipropósitos e reforçou as exigências aos meios de hospedagem. Não dá mais para acreditar que oferecer a internet básica seja suficiente, uma vez que o próprio consumidor investiu na melhora de sua conexão doméstica e passou a exigir padrões superiores dos hotéis – seja para o consumo de streaming em família, seja para a realização de videochamadas de negócios.
Uma convivência mais plural nos hotéis também traz exigências na composição de cardápios – com a oferta de opções veganas, vegetarianas e kids, por exemplo – e de espaços voltados à saúde – com mais área e equipamentos nas academias, além de parcerias para empréstimo de bicicletas, entre outras opções. Isso sem falar nas demandas de quem viaja a lazer e prioriza o gasto com experiências únicas em detrimento da aquisição de bens pessoais – outro assunto mapeado antes da pandemia e que ganhou força quando a COVID-19 escancarou o conceito de finitude.
O futuro da indústria da hospitalidade requer habilidade para entender o momento e tomar as medidas necessárias para mudar. E isso está relacionado à resolução de questões mais complexas que envolvem sociedade e mercado de trabalho. Um desses conflitos é o descompasso entre aumento na demanda e carência de mão de obra, já que há cada vez mais pessoas com planos de viajar e cada vez menos profissionais em busca de carreiras na hotelaria.
Além das demissões ocorridas durante a crise, há uma preferência crescente por modelos de trabalho com jornadas mais flexíveis que se desenvolveram no período pandêmico e, salvo exceções, não têm lugar na indústria da hospitalidade. É um segmento que requer trabalho presencial, mas que já mapeia alternativas mais atrativas com a automatização de cargos operacionais focados em trabalhos repetitivos e a abertura de mais postos de trabalho voltados ao acolhimento, à melhora da experiência do hóspede. Assim, a hotelaria poderia resolver a escassez de talentos por meio de um modelo no qual a tecnologia cuida de tarefas repetitivas e há um quadro enxuto que ocupa funções de maior valor agregado, recebendo salários melhores por isso.
Entretanto, para tornar as carreiras realmente atrativas, é necessário considerar características geracionais. Não adianta brigar com a realidade, mas se adaptar ao fato de que ter colaboradores integrando o quadro por 20 anos não é mais a regra. Os profissionais de hoje são mais imediatistas em termos de ganhos e menos fiéis às empresas na construção de suas carreiras, o que não é melhor nem pior. É somente diferente e requer formas mais modernas em relação a treinamentos, por exemplo.
Por tudo isso, mais do que nunca, é preciso descartar modelos ultrapassados, reinventando a forma de trazer – e manter – novos colaboradores para a cultura da empresa.
Mas, acima de tudo, é urgente seguir com a mente aberta à adaptação. Nem toda mudança precisa fazer comparações com o passado. Pelo contrário: mudar requer aprendizado, demanda dançar conforme a música e com foco em antecipar o que vem à frente.