O sucesso de uma organização usualmente traz como consequência seu crescimento
Vivemos em um mundo complexo, em que as interações – dentro e fora das organizações – fazem emergir cadeias de ações que geram resultados que não podem ser previstos. Estas mudanças rápidas de alto impacto podem destruir uma organização que tem como modelo mental ser grande e forte.
O sucesso de uma organização usualmente traz como consequência seu crescimento: há que se lidar com novas linhas de produtos, ampliação de participação de mercados, a logística fica mais complexa, funções tem que ser criadas, processos redesenhados. O crescimento traz força e tamanho, e uma leve sensação de que “não somos de fato ameaçados”. E realmente no curto prazo, sob a luz confortável dos “cenários prováveis” desenhados para as reuniões estratégicas do comitê executivo e do conselho, não se percebe ameaça. Nestas reuniões concorda-se em teoria que vivemos em uma época de grandes mudanças… mas elas não trazem senso de urgência para a discussão.
Até que um dia uma mudança inesperada ocorre: uma ruptura na rede de relacionamentos com o cliente, uma ruptura tecnológica que implica em um novo modelo de negócios, uma ruptura social que demanda diferentes formas de integridade e inclusão, uma ruptura climática que exige completa revisão da gestão de riscos, etc. E neste momento a organização grande e forte tem mais chance de cair.
Quatro sinais sutis indicam a prevalência do modelo mental do `grande e forte` em, uma organização.
A estrutura subjuga a estratégia
As estratégias e planos são cuidadosamente construídos, normalmente por uma área chamada `planejamento estratégico`. Não será por falta de swots, avaliações de mercado, planilhas com estimativas de 5 anos e apresentações com mais de 50 páginas no powerpoint que a empresa deixará de ter sucesso. Porém as ações ali descritas precisam ser executadas na realidade, e a cultura de sobrevivência em uma empresa com modelo mental grande e forte está enraizada na estrutura das áreas: o poder e a política transitam por meio de acordos implícitos entre os caciques de cada área. Neste ambiente a busca de uma solução para um problema de um cliente (uma informação nova e vital que vem da realidade do mercado!) que envolva mais de uma área terá que ser escalada desde o analista até o diretor, que então possivelmente enviará um e-mail para o outro diretor, e, depois de algum vai e vem, o analista da outra área será instruído a poder conversar com o primeiro analista… que aliás senta a três metros do primeiro.
Em uma empresa com modelo mental ‘forte e grande’ a estrutura reduz muito a agilidade de resposta.
A escala é vantagem competitiva
Nas discussões de longo prazo a escala – que afinal sempre foi desejada pois buscava-se o ‘ganho de escala’ – é apregoada como vantagem competitiva da organização. No curto prazo, em um ambiente de poucas mudanças, isto é verdade. Porém quando mudanças exigem rearranjos rápidos a rigidez trazida pela escala significa um enorme custo em termos de tempo.
Mudanças também podem exigir rapidez na leitura de sinais e reações descentralizadas, e neste caso a dinâmica das relações é crítica. A dinâmica de um pequeno grupo de pessoas – como uma comunidade – tem aspectos de responsabilização e autonomia conjugados que criam nexo e significado para quem participa. Quando se altera a escala, isto é, quando a quantidade de pessoas envolvidas aumenta muito, esta dinâmica muda de natureza. Já não se pode tratar dos vínculos da mesma maneira, e, mais importante, o senso de responsabilização diminui.
Em uma empresa com modelo mental ‘forte e grande’ não se computa o risco da escala.
O orçamento dita o tempo
Ciclos anuais de orçamento e acompanhamento de resultados parecem fazer parte da paisagem natural das organizações. À parte das necessidades de informações ao mercado para empresas de capital aberto, não há outra demanda para este modelo `calendário` para a gestão. Um orçamento é construído ao longo de setembro, outubro, em geral com base no último orçamento (que por sua vez foi feito com base no anterior, ad infinitum). Apura-se com grande precisão (normalmente os gráficos mostram duas casas decimais) as variações dos resultados em relação ao orçamento. Festeja-se um crescimento de ‘10% acima do orçado’. Mais de um ano inteiro se passa, e continua a comparação com o orçamento. Inclusive a maior parte das métricas de incentivos é vinculada ao orçamento. Enquanto isso os mercados e a realidade mudam, em sua própria, real, e, cada vez mais alta, velocidade. Porém a visão umbilical turva a perspectiva externa.
Em uma empresa com modelo mental ‘forte e grande’ o tempo que vale é o interno, do orçamento, e não o externo, do mercado.
A hierarquia vale mais
O processo decisório é pautado pelo crachá: ‘manda quem pode, obedece quem tem juízo’. Iniciativas de oxigenação cultural e tentativas de ampliar a participação de diferentes níveis acabam por não ter êxito por um motivo simples: no momento de decisões mais relevantes prevalece um processo decisório de caráter personalístico em que a opinião do chefe vale mais.
Neste ambiente o investimento em informações e dados para uma boa análise do problema é baixo ou o processo de apresentação das informações já é enviesado para o caminho pré-definido (normalmente por meio de apresentações de powerpoint com mais de 50 páginas). Também é comum que o ‘chefe’ inicie a ‘discussão’ explicitando sua posição, o que reduz a quase zero o grau de divergência necessário para uma decisão saudável.
Em uma empresa com modelo mental ‘forte e grande’ não se potencializa a inteligência coletiva.
Por Marcos Thiele, sócio da Adigo Desenvolvimento