Marcelo Furtado, CEO da Convenia
A inclusão de transexuais no mercado de trabalho tem sido um assunto discutido com frequência no ambiente empresarial. Embora a postura de muitas organizações esteja mudando em relação à diversidade de gênero do time interno, ainda existem obstáculos para que exista uma política sustentável de inclusão.
Neste artigo, falarei sobre conceito de gênero, desafios, erros cometidos em processos seletivos e como a diversidade pode contribuir para o sucesso da empresa.
O que é identidade de gênero?
Identidade de gênero é como um indivíduo olha para si mesmo e se apresenta para a sociedade. Sendo assim, não é uma ideologia e nem mesmo um tipo de orientação sexual.
É sempre válido perguntar para a pessoa qual é o termo que ela se sente mais confortável em ser tratada.
- Cisgênero: pessoas que permanecem com o seu sexo biológico durante toda a vida;
- Transgêneros: pessoas que a identidade de gênero diverge do sexo biológico;
- Não-binários: pessoas que não se identificam com um determinado sexo biológico, mas com ambos.
A identidade de gênero não deve ser confundida com expressão de gênero. Diferente da primeira, a segunda se refere a alguém que modifica a aparência, mas continua se identificando com o sexo biológico original.
Qual é a importância da inclusão de transexuais no mercado de trabalho?
O aspecto social é um dos principais motivos que mostram a importância da inclusão de transexuais no mercado de trabalho. No Brasil, segundo a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) , a cada 16 horas é registrada uma morte causada por transfobia. Os dados também mostram que mesmo vivendo no meio de uma pandemia, os assassinatos contra pessoas trans estão acontecendo mais precocemente, com vítimas cada vez mais jovens e com maior violência.
Muitos dos óbitos acontecem por que os transexuais se submetem à prostituição por falta de oportunidades de trabalho. Nesse ambiente, ficam vulneráveis a todo o tipo de violência não só física, mas também psicológica.
E mesmo que essas pessoas tenham qualificações e experiências profissionais ou educação superior, isso não garante a sua aprovação em processos seletivos, pois esbarram no preconceito e na falta de políticas de inclusão das empresas .
Por que investir em uma empresa mais inclusiva?
A diversidade de gênero e uma política voltada para a inclusão oferecem muitos benefícios para os negócios, como:
- Diminuição do turnover: em vista do atual cenário empresarial hostil, a empresa que tem uma cultura inclusiva e psicologicamente segura consegue reter seus talentos profissionais. Uma vez que as pessoas se sentem ouvidas e respeitadas;
- Engajamento: a ética e o respeito da organização pela diversidade elevam o engajamento do time. A consequência seguinte é o aumento da motivação e da produtividade nos serviços;
- Inovação: equipes plurais têm a capacidade de pensar em soluções inovadoras. Afinal, vários perfis da sociedade estão representados dentro da empresa. Sendo assim, é mais fácil desenvolver produtos e serviços que atendam às necessidades do público-alvo.
Quais são os desafios enfrentados por pessoas trans no mercado de trabalho?
Um dos maiores desafios das pessoas transexuais é ingressar no mercado de trabalho. Normalmente, as “portas estão fechadas” para esse grupo de pessoas por causa do preconceito que reflete também nos recrutadores das empresas.
Devido a isso, muitas pessoas trans ficaram apartadas do mundo corporativo nas últimas décadas, dificultando ainda mais o aumento da inclusão. Por exemplo, existem profissionais de RH que acreditam que os transexuais são carentes de soft e hard skills. Outros têm ressalvas quanto a contratá-los por causa de clientes e colaboradores.
Por essas e outras razões, existe um alto índice de desemprego e informalidade. Segundo pesquisa recente apresentada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), em um grupo de 528 transexuais, apenas 16,7% estavam no mercado formal .
Quais são os principais erros cometidos no processo de Recrutamento e Seleção?
Para que o processo seletivo seja mais inclusivo e promova o respeito pela diversidade de gênero, é preciso que os profissionais de RH evitem alguns erros:
- Descumprimento da lei ao não usar o nome social: De acordo com o Decreto Nacional Nº 8.727, a lei ordena sobre o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis e transexuais no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional. A lei pode variar de acordo com o Tribunal Regional do Trabalho de cada estado.
- Perguntar o sexo biológico: evite o questionamento sobre o sexo biológico. Na verdade, é algo desnecessário e constrangedor, sem necessidade alguma;
- Indagar sobre a cirurgia: a pessoa transexual não deve ser pressionada a revelar se fez ou não a cirurgia de transição de gênero.
Como o RH pode impulsionar contratação e retenção de transexuais no mercado de trabalho?
É importante que os RHs desenvolvam e estimulem ações que facilitem a entrada de pessoas transexuais no mercado. Dessa forma, contribuirá para que elas tenham boas oportunidades profissionais e de crescimento de carreira.
As estratégias que podem ser adotadas são:
- Apoio da liderança na promoção dos direitos das pessoas transexuais na empresa;
- Criação de um ambiente de igualdade de tratamento e oportunidades;
- Educação dos colaboradores em relação aos direitos de pessoas trans;
- Divulgação de seus direitos em campanhas de marketing da empresa;
- Programas de treinamento e desenvolvimento voltado para as pessoas transexuais;
- Benefícios flexíveis e passíveis de adaptação;
- Apoio psicológico;
- Criação de ações internas com temas voltados para a inclusão e a diversidade.
Outra atitude é deixar claro para os colaboradores, e também nas campanhas publicitárias da empresa, que a transfobia, de acordo com a Lei 7.716/2018, é crime. Vergonhosamente, o Brasil lidera o ranking de país que mais mata transexuais no mundo há doze anos.
Sendo assim, discriminar a identidade de gênero de alguém pode acabar em pena de até três anos de prisão e o pagamento de multa. Já os que divulgam atos discriminatórios em meios de comunicação podem ser presos por até cinco anos, além do pagamento de multa.